Table Of ContentVAMPIRO: A MÆscara
Um Roleplaying Game
de Horror Pessoal
Escrito por: Mark Rein.Hagen
Aten(cid:231)ªo: Aconselhamos cautela ao leitor. Os temas e situa(cid:231)ıes descritos neste jogo podem ser
inquietantes para alguns e repulsivos para outros. Embora o prop(cid:243)sito nªo tenha sido ofender, o uso
que fizemos do mito do vampiro (como metÆfora e canal para a narrativa) pode ser mal interpreta-
do. Para ser claro, vampiros nªo sªo reais. Existem apenas como arquØtipos que nos ensinam sobre
a condi(cid:231)ªo humana e a fragilidade e o esplendor daquilo a que chamamos vida.
b 1
Agradecimentos:
,odnatigid-er ,latigid oãsrev atsen maraduja euq so sodot A
.odniubirtsid omsem uo odnamargaid-er ,"odnainacse"
sesse sodot raetarip e raekarc a maraduja son euq sodot A
ranoicroporp arap somazilitu són euq rodatupmoc ed samargorp
.sahlivaram sasse
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e saiédi ed adnev à ,larotua otierid oa soirártnoc SOMOS sóN
.laidnum oiránec od GPR ed saserpme salep adacitarp oãçarolpxe à
erucorp orvil od uotsog eS .oãçartsnomed amu é oãn aipóc atsE
.es-atrivid e resal arosserpmi amu à osseca ahnet euq méugla
.redup euq sodot a aipóc asse aubirtsiD
.rennacs o e aipócotof a aviV
ten.bjc.otiutargpr.www
saipócotof etnemlaicepse ,ocinâcem uo ocinôrtele ,oiem reuqlauq rop oditimsnart res edop odartnocne iuqa lairetam O .sodavreser sotierid meS
oãçaloiv a avitaler oãçamalcer reuqlauQ .etnemairaid sogima sues ed mugla uo êcov arolpxe euq oãçaroproc amugla ed sosrucer so moc satief
,omixórp siam rodaerev uo odatuped oa etnematerid odaçeredne res eved adartsiger acram ed odivedni osu uo ,oãçamafid ,siarotua sotierid sod
.sesseretni sues sod etnatneserper omitígel o omoc sacitárcomed saiv rop otiele iof etse euq áj
SumÆrio
. PrefÆcio: Os Amaldi(cid:231)oados
. Livro Um: Antecedentes
. Cap(cid:237)tulo Um: Introdu(cid:231)ªo
. Cap(cid:237)tulo Dois: CenÆrio
. Cap(cid:237)tulo TrŒs: Narrativa
. Livro Dois: GŒnese
. Cap(cid:237)tulo Quatro: Regras
. Cap(cid:237)tulo Cinco: Personagens
. Cap(cid:237)tulo Seis: Cr(cid:244)nica
. Livro TrŒs: Permuta(cid:231)ıes
. Cap(cid:237)tulo Sete: Caracter(cid:237)sticas
. Cap(cid:237)tulo Oito: Sistemas
. Cap(cid:237)tulo Nove: Drama
. ApŒndice
Prelœdio b 3
Monstros... Monstros por toda parte...
les povoam a nossa imagina(cid:231)ªo. Ocultam-
se sob nossas camas. Rastejam nos obscuros
recessos de nosso inconsciente primitivo.
Nªo hÆ fuga, nªo hÆ refœgio a — coisa vai
pegar vocŒ. A Besta, o aniquilador, o Lusus Natura. O
que Ø? Por que o tememos?
Qual Ø o seu nome?
Sempre tivemos nossos dem(cid:244)nios. HÆ muito infla-
mam a imagina(cid:231)ªo rom(cid:226)ntica de sacerdotes e poetas.
Houve um tempo em que os denominamos Trolls;
depois foram chamados de Diabos, e entªo vieram as
Bruxas misturando po(cid:231)ıes malØficas em seus caldei-
rıes. Ainda mais tarde, dizia-se que o Monstro era o
Lobo Mau, o Bicho Papªo, o Godzilla do terror da
Guerra Fria. Por fim, alguns chamaram-no de intole-
r(cid:226)ncia e bo(cid:231)alidade. Durante algum tempo tentaram
convencer-nos de que monstros nªo existem, que tudo
no universo tinha, ou logo viria a ter, uma explica(cid:231)ªo
racional.
Mas agora sabemos a verdade. Reatamos nossas re-
la(cid:231)ıes com a Besta. Aprendemos o seu verdadeiro
nome.
Agora compreendemos a dimensªo da eternidade,
sua infinitude inimaginÆvel, sua estrutura ca(cid:243)tica e a
insignific(cid:226)ncia de nossa pr(cid:243)pria existŒncia. Agora ad-
mitimos a magnitude dos problemas que enfrentamos
e a nossa aparente incapacidade de gerar mudan(cid:231)as
na escala necessÆria para salvar-nos
Tivemos um lampejo da realidade e enxergamos a
verdade por trÆs do vØu. Fechamos o c(cid:237)rculo e
redescobrimos o Dem(cid:244)nio. Recuperamos nossa heran-
(cid:231)a ancestral. Achamos aquilo a que concedemos tan-
tos nomes — a fonte de nosso terror mortal.
Descobrimos o inimigo... e somos n(cid:243)s.
4 b VAMPIRO: A MÆscara
Somos ca(cid:231)adores, perseguindo eternamente a ver-
dade inquietante de nossa condi(cid:231)ªo humana, buscan-
do em nosso (cid:237)ntimo por aquilo que Ø sujo, incerto,
impuro — pelo que nªo tem nome. Ao olharmos os
monstros que criamos, adquirimos um discernimento
um pouco mais amplo de nossa (cid:147)metade negra(cid:148). Esses
dem(cid:244)nios expressam o que somos nos n(cid:237)veis mais pro-
fundos e inacess(cid:237)veis do inconsciente. Desde tempos
remotos, eles nos tŒm proporcionado uma conexªo
com nosso eu animal, a satisfa(cid:231)ªo de uma necessidade
emocional primitiva, e a promessa de uma justi(cid:231)a im-
placÆvel.
O vampiro Ø o dem(cid:244)nio quintessencial, nada mais
sendo que um reflexo de n(cid:243)s mesmos. Os vampiros
alimentam-se como nos alimentamos, matando, e cau-
sando morte podem sentir o mesmo terror, a mesma
culpa, o mesmo anseio por fuga. Estªo aprisionados
no mesmo ciclo de necessidade, fartura e al(cid:237)vio. Como
n(cid:243)s, buscam reden(cid:231)ªo, pureza e paz. O vampiro Ø a
expressªo poØtica de nossos temores mais rec(cid:244)nditos,
sombra de nossas necessidades primordiais.
Tal o her(cid:243)i da lenda, que desce ao po(cid:231)o do Purga-
t(cid:243)rio para enfrentar o algoz, derrotar as fraquezas pes-
soais e finalmente ser purificado, retornando para casa
com a dÆdiva do fogo, tambØm n(cid:243)s precisamos descer
(cid:224)s profundezas de nossas almas e renascer com os se-
gredos conquistados. Essa Ø a verdadeira jornada de
Prometeu, o significado do mito. Apenas embarcando
nessa jornada podemos descobrir nossos eus verdadei-
ros e ver nossos reflexos no espelho.
O fasc(cid:237)nio desta promessa de conexªo espiritual Ø
praticamente irresist(cid:237)vel. Mas trata-se de uma aven-
tura por demais perturbadora. (cid:201) preciso manter-se vi-
gilante e caminhar com cautela — toda jornada reser-
va seus perigos. Nªo olhe a pr(cid:243)pria alma, a menos que
esteja preparado para enfrentar o que descobrir.
E, neste momento, lembre-se:
Monstros nªo existem...
Prelœdio b 5
6 b VAMPIRO: A MÆscara
PPPPPaaaaarrrrraaaaa WWWWW..... HHHHH.....
De teu servo mais devotado:
J
a se vao muitos anos. Na esperanca de haver o tempo en-
torpecido tuas memorias mais dolorosas, ouso enviar-te esta numa
intencao de suplica, embora reconheca que implorar-te perdao e
pedir muito. Ao menos rogo tua compreensao. Devo-te algum
tipo de explicacao para os eventos que despedacaram tua vida
Einocente.
mbora tenha eu exibido algumas caracteristicas surpreendentes
diante de ti e de teus pares, a chama de Humanitas, ainda que
erratica, continua a arder em meu peito. O tempo e a nature-
za lutam para extingui-la, concluindo dessa forma minha descida
ao Inferno da loucura e da bestialidade. Preciso, como qualquer
sacerdote, guardar bem minh(cid:146)alma, posto que o mais sutil lapso
na vigilancia deixa escapar a Besta, cujos atos viste com teus
Aproprios olhos.
dmito ser impraticavel qualquer tentativa de reconciliacao: toda
uma eternidade a demandar perdao seria muito pouco tempo. Con-
tudo, em sinal de penitencia, ofereco-te o documento anexo, ato
que faz de mim um traidor de minha especie. Rezo para que
encontres nessas paginas alguma coisa que te ajude a compreender
o tormento que te foi infligido, e com isso, talvez dispersar um
pouco da tua dor. O tom, receio, e um tanto seco; pouca
necessidade nutre um soldado pelos agradaveis floreios de poesia
que seduzem um leitor. Pus-me meramente a redigir, da melhor
Tforma que pude, tanto quanto sei.
enho para contigo um debito que jamais podera ser pago. Se
em algum momento puder servir-te ou a tua familia, estarei as
ordens.
Semper Servus
V. T.
Prelœdio b 7
Os Amaldi(cid:231)oados
or onde come(cid:231)ar? Do assunto que falaremos, Para v(cid:243)s, mortais, somos monstros, mas tambØm her(cid:243)is
os sØculos jÆ viram muita tinta ser derrama- (cid:151) a encarna(cid:231)ªo de metÆforas sombrias e de desejos reprimi-
da. Surpreende-me a regularidade com a qual dos, a aristocracia dos contos de fadas tªo amados pelas cri-
os mortais esbarram em verdades e meias- an(cid:231)as. Somos uma supersti(cid:231)ªo infundada, um gŒnero art(cid:237)sti-
verdades (cid:151) algumas delas bastante profun- co, uma condi(cid:231)ªo psicol(cid:243)gica, um anseio feito carne, uma
das (cid:151) pela mais casual e ardilosa das filoso- exterioriza(cid:231)ªo do complexo culpa-desejo-violŒncia, e muitas
fias; e entªo, alheios ao que descobriram, prosseguem discu- outras coisas.
tindo generalidades de natureza absolutamente equivocada.
Nossa Verdadeira Natureza
Æ aproximadamente dois sØculos e meio, um presenciar algumas raras ocasiıes nas quais tais objetos foram
padre francŒs de nome Calmet procurou co- capazes de causar um desconforto considerÆvel. Nesses casos,
letar toda a informa(cid:231)ªo existente sobre a seus portadores quase refulgiam de fØ na Divindade, o que me
natureza dos vampiros. Nªo Ø de admirar que leva a concluir que os objetos religiosos serviram de algum
seu tratado contenha muitas contradi(cid:231)ıes e modo para canalizar o poder dessa fØ. Ignores, todavia, os
Æreas de incerteza. Citando os relat(cid:243)rios das ardis do cinema, com seus candelabros cruzados e sombras de
Comissıes Papais enviadas para lidar com (cid:147)pragas(cid:148) de vampi- pÆs de moinhos.
ros na `ustria, Hungria, MorÆvia e SilØsia, Calmet relata que As pretensas propriedades do alho, assim como do ac(cid:244)nito
um vampiro pode ser destru(cid:237)do se trespassado por uma estaca e de outras ervas sªo, da mesma forma, mera supersti(cid:231)ªo.
de madeira, sendo que a esse ato deve seguir-se a decapita(cid:231)ªo Esses vegetais repelem os vampiros tanto quanto o fazem com
e a incinera(cid:231)ªo dos restos. Isto realmente irÆ destruir um vam- a maioria dos mortais, a despeito da cantilena das mulheres
piro, da mesma forma como decerto destruiria um mortal. que os vendiam. Como a Igreja, as curandeiras de aldeia eram
Homem brilhante, esse Calmet. muito requisitadas para usar sua (cid:147)magia(cid:148) contra vampiros,
Os filmes abreviaram um pouco esse tratamento, criando obtendo os mesmos resultados p(cid:237)fios.
a falÆcia de que a estaca Ø suficiente. Nªo creias nessas fÆbu- Os cineastas familiarizaram o grande pœblico com outras
las. Transfixar seu cora(cid:231)ªo com uma estaca imobilizarÆ o vam- fraudes. Por exemplo, podemos ver nossos pr(cid:243)prios reflexos
piro, mas ainda existem outros procedimentos que sªo terminus no espelho, embora alguns de n(cid:243)s finjam o contrÆrio em hon-
sit indispensÆveis. Sejam eles incinera(cid:231)ªo ou luz solar, ist egal; ra a essa grande tradi(cid:231)ªo cinematogrÆfica. Da mesma forma,
jamais confies apenas na estaca. Nem ponhas tua fØ unica- podemos aparecer em pel(cid:237)cula. Na verdade, alguns da minha
mente em armas de metal, como fez teu amigo americano. espØcie jÆ protagonizaram filmes, e um deles foi atØ mesmo
Essas coisas machucam, mas os ferimentos saram depressa (cid:151) um diretor bastante conhecido.
do contrÆrio nªo estaria a escrever-te agora. (cid:201) igualmente absurdo presumir que um vampiro nªo pos-
A luz do sol, conforme Ø dito, representa a agonia final sa transitar da maneira que desejar. N(cid:243)s Cainitas (um dos
para os de minha espØcie. Nos filmes, vemos vampiros termos de nossa ra(cid:231)a para designar a n(cid:243)s mesmos, cuja ori-
caricatos, com seus mantos e maquilagem pesada, sendo re- gem discutirei mais adiante) podemos entrar em qualquer casa
duzidos a poeira pelo afago do sol, ou explodindo em chamas, e lar que quisermos a qualquer momento. Da mesma forma, Ø
como os desafortunados que foram tragados pelo Fogo Gre- despropositado acreditar que um vampiro nªo seja capaz de
go. Infelizmente isso Ø verdade, ainda que tratada com certo cruzar Ægua corrente. A Ægua nªo exerce qualquer efeito so-
exagero. A luz do sol, assim como a chama, queima-nos a bre n(cid:243)s. Como nªo mais respiramos, nªo podemos ser afoga-
pele, e apenas os mais velhos e fortes entre n(cid:243)s conseguem dos. Embora a submersªo possa vir a ser uma experiŒncia de-
suportÆ-la por longos per(cid:237)odos. sagradÆvel e resultar em algum grau de deteriora(cid:231)ªo f(cid:237)sica
Portanto precisamos dormir de dia e agir apenas (cid:224) noite. caso seja prolongada, nenhum vampiro morreu unicamente
Durante o dia somos letÆrgicos, sendo-nos dif(cid:237)cil fazer qual- devido a isso; entretanto, hÆ rumores de que algumas linha-
quer coisa alØm de dormir. Apenas aqueles entre n(cid:243)s que gens sªo sens(cid:237)veis a um contato vis-a-vis com a Ægua. AliÆs, foi
ainda nªo deixaram a natureza humana muito para trÆs sªo provavelmente assim que muitas das cren(cid:231)as sobre n(cid:243)s se ori-
capazes de agir enquanto o sol estÆ alto no cØu. Eu mesmo ginaram, uma vez que vÆrias linhagens sofrem de fraquezas
nªo vejo a luz do dia hÆ muitos sØculos, tendo praticamente que foram passadas sucessivamente pelo senhor (cid:224) sua Prole.
esquecido o brilho de seus raios dourados. Mas nªo sinto a Caso a forma humana nªo seja apropriada aos seus des(cid:237)g-
menor falta. nios, o vampiro cinematogrÆfico Ø capaz de assumir diversas
Crucifixos, Ægua benta e outros s(cid:237)mbolos religiosos devem formas: lobo, morcego, nØvoa (cid:151) e, em algumas hist(cid:243)rias, tam-
ser ignorados (cid:151) a Igreja sempre foi o primeiro refœgio dos bØm o gato e alguns pÆssaros noturnos, como o mocho. Os
mortais confrontados com coisas que lhes ultrapassam a com- Anciıes desfrutam de poderes extraordinÆrios, como teste-
preensªo (cid:151) especialmente no passado. Contudo, cheguei a munhei durante meu breve e indesejado envolvimento com
8 b VAMPIRO: A MÆscara
seu jogo de Jyhad, e nªo mais desdenho das hist(cid:243)rias de mu- tal consideraria sobrenaturais. Como predadores, nossos sen-
dan(cid:231)a de forma. PorØm, os indiv(cid:237)duos das gera(cid:231)ıes mais no- tidos sªo agu(cid:231)ados, e alguns desenvolveram outros talentos
vas raramente os possuem. Assim, asseguro-te: um vampiro para ajudar na ca(cid:231)ada. Um exemplo: a habilidade de inspirar
que possua forma plural pertencerÆ a uma ra(cid:231)a rara, o clª medo, paralisia, obediŒncia e outras rea(cid:231)ıes emocionais Ø
Gangrel, ou serÆ muito velho, sÆbio e poderoso. Rogo para bastante œtil, embora os escritores populares as tenham enfei-
que teu caminho jamais cruze com o de um deles. tado em benef(cid:237)cio de suas hist(cid:243)rias.
Contudo, muitos de n(cid:243)s possuem habilidades que um mor-
Os Carni(cid:231)ais
corre-me que parte da confusªo quanto aos Embora os Carni(cid:231)ais demonstrem alguns dos poderes dos
poderes sobrenaturais e as fraquezas do vam- vampiros, retŒm a maior parte das fraquezas dos mortais. Uma
piro deva-se a um caso de confusªo de iden- empala(cid:231)ªo matarÆ um carni(cid:231)al com a mesma eficiŒncia com
tidades. Existe uma classe de criatura entre que mataria um mortal, e uma bala de chumbo serÆ tªo mor-
o mortal e o vampiro, que a Fam(cid:237)lia (outra t(cid:237)fera quanto uma de prata. Eles atØ mesmo desenvolvem um
de nossas alcunhas auto-referentes, e a mais temor por s(cid:237)mbolos religiosos, ou alho, entre outras bobagens.
popular) denominou carni(cid:231)al. Nªo se trata do lendÆrio carni(cid:231)al Trata-se, obviamente, de um fen(cid:244)meno puramente neur(cid:243)ti-
indiano comedor de cadÆveres, o ghßl, embora alguns indiv(cid:237)- co, devido a acreditarem que essas coisas possam feri-los. A
duos possam demonstrar comportamento semelhante. existŒncia de carni(cid:231)ais em forma animal explica parcialmente
Os mortais que bebem o sangue da Fam(cid:237)lia sem que antes a cren(cid:231)a generalizada em vampiros metamorfos.
tenham sido sugados tornam-se carni(cid:231)ais. Essas criaturas po- Alguns carni(cid:231)ais podem crer que sejam vampiros de ver-
dem andar (cid:224) luz do dia, como os outros mortais, mas nªo dade, tendo sido enganados a esse respeito por seus criadores.
sofrem a Fome, nem envelhecem enquanto beberem regular- Podem atØ mesmo agir de acordo com essa idØia equivocada
mente de sangue vamp(cid:237)rico. Podem atØ mesmo possuir for(cid:231)a (cid:151) ao ponto de beberem sangue (cid:151) afinal, raramente compre-
e reflexos sobre-humanos. (cid:192)s vezes Ø vantajoso criar esses endem a natureza dos vampiros mais que os mortais. Em sua
servos e comandar a sua lealdade atravØs da promessa de vida maioria eles sªo traumatizados por experiŒncias que sofreram
eterna. Eles nªo precisam ser humanos (cid:151) um cªo que tenha (cid:151) veja, por exemplo, o ex-patrªo de teu marido (cid:151) e muitos
bebido do sangue de um vampiro torna-se o guardiªo mais foram deliberadamente instru(cid:237)dos de forma errada por seus
perfeito e fiel que se pode desejar. E assim surgem as lendas mestres, para melhor servi-los.
de cªes infernais.
O Abra(cid:231)o
s mortais supersticiosos ponderam muito so- HÆ um grªo de verdade na lenda do de gustando. Para
bre os meios segundo os quais um vampiro tornar-se um vampiro, uma pessoa precisa perder todo seu
passa a existir. Tais considera(cid:231)ıes variam do sangue mortal (cid:151) mas isso Ø apenas parte do horror. Se nada
religioso ao bizarro, podendo constituir, a mais for feito, mortui exsanguinati mortui veri; as presas mata-
quem agrade o gŒnero, uma leitura noturna rªo de modo tªo definitivo quanto a l(cid:226)mina ou a bala.
apraz(cid:237)vel. Fora o entretenimento, porØm, (cid:192) medida que a vida se aproxima da extin(cid:231)ªo, a carne
servem para quase nada. morrendo lentamente, o vampiro agressor pode escolher pou-
O primeiro e mais comum desses mitos Ø a lenda de que par a v(cid:237)tima da morte ou negar-lhe a dÆdiva do Para(cid:237)so, afinal
qualquer pessoa mordida por um vampiro tornar-se-Æ tam- Ø ele quem dÆ as cartas. Substituindo o sangue mortal rouba-
bØm um vampiro. Dessa forma, cada vez que um vampiro se do por um pouco do seu pr(cid:243)prio sangue, cria-se um progŒnito.
alimentar, criarÆ outro de sua espØcie. (cid:201) de admirar, portan- Apenas uma simples gota de sangue sobre os lÆbios do mori-
to, que ainda haja mortais no mundo. Outra lenda reza que bundo anima-o o bastante para que beba do sangue de seu
um cadÆver pode tornar-se vampiro se houver cometido sui- senhor.
c(cid:237)dio, tiver quebrado votos, integrado uma linhagem maldita, Como posso expressar o horror do Abra(cid:231)o? O medo e a
ou sido uma pessoa maligna de tout. Mais uma vez, o mundo confusªo? A repulsa e o terror? A dor? Mesmo a passagem
estaria povoado apenas por vampiros (cid:151) e posso garantir-te dos sØculos nªo obscureceu minhas dolorosas lembran(cid:231)as.
uma coisa: nªo vi esse exØrcito de nosferatus. Compreende que nªo sou covarde. Como soldado, supor-
Ademais, atØ onde sei, nªo existem muitos de n(cid:243)s neste tei as priva(cid:231)ıes da vida militar, os perigos da batalha e a sel-
mundo. Segundo minha experiŒncia, existe apenas uma for- vageria da vit(cid:243)ria, na qual admito minha parcela de culpa.
ma pela qual um mortal pode tornar-se um vampiro. A vergo- Mas mesmo a barbÆrie que presenciei como prisioneiro dos
nha mais uma vez invade minh(cid:146)alma quando recordo que pla- turcos nªo poderia ter-me preparado para a experiŒncia de
nejei esta sina para ti, e exulto pela ProvidŒncia haver-me ser tragado para esta maldita meia-vida.
impedido. Arrependo-me verdadeiramente de quase ter-te Quando meu sangue foi roubado, encontrava-me, de gratia
condenado a uma eternidade de sofrimento. potestates descriptis, num estado de esp(cid:237)rito muito pac(cid:237)fico.
Prelœdio b 9
Quanto mais tipos de mortes conhe(cid:231)o (cid:151) e tenho presencia- Sabia apenas que precisava beber, e ao fazŒ-lo pude abater
do vÆrios (cid:151) mais conven(cid:231)o-me que a minha foi a menos um pouco minha dor. Minha visªo clareou e entªo vi o que
angustiante. Foi como se minha experiŒncia fosse um sonho havia bebido.
estranho, com um toque surreal. Nas pronfudezas sombrias e Minha primeira rea(cid:231)ªo foi de descren(cid:231)a. Isto nªo podia
cÆlidas de minha mente moribunda, tornei-me c(cid:244)nscio de uma estar acontecendo. Mesmo no sØculo quinze, homens de edu-
luz; sabia que ela marcava para onde eu deveria ir, e estava ca(cid:231)ªo e ber(cid:231)o escarneciam das superti(cid:231)ıes dos camp(cid:244)nios.
certo de que, uma vez lÆ, tudo estaria bem comigo. Comecei a Quando crian(cid:231)a, minhas amas assustavam-me para dormir
flutuar em sua dire(cid:231)ªo. com hist(cid:243)rias do terr(cid:237)vel vrolok, mas havia reconhecido que
Abruptamente a luz foi apagada. Meu rosto sentiu o im- tais hist(cid:243)rias nªo passavam de fÆbulas. S(cid:243) podia ser um pesa-
pacto, forte como o de uma bala de mosquete, e tentei gritar, delo, algum tipo de alucina(cid:231)ªo. Tentei concentrar meus pen-
a boca cheia de fogo l(cid:237)quido. Uma causticidade cauterizou- samentos em carne, frutas, vinho (cid:151) mas em vªo. O sangue
me a garganta e o est(cid:244)mago; a consciŒncia retornou com tal era vida. O sangue era realidade. Tudo empalidecia diante
violŒncia que parecia arrancar-me os membros, um a um. Mil dele.
anz(cid:243)is rasgaram minha carne, puxando-a em todas as dire- Posso apenas ser grato por naquela Øpoca encontrar-me
(cid:231)ıes. em um lugar remoto. Tivesse sido abra(cid:231)ado numa cidade, com
Rezei pela morte (cid:151) qualquer coisa para deter a dor (cid:151) gente ao meu redor, imagino que devasta(cid:231)ªo teria causado. A
mas nem mesmo pude cair na inconsciŒncia. Nec turcos, nec Fome embota completamente nossa razªo. Caso meu pr(cid:243)prio
Inquaesitores sempre comandaram esse tipo de tormento. filho houvesse aparecido diante de mim, teria morrido para
Multipliques por mil a ardŒncia do vinagre num dedo corta- saciar-me a Fome. Estava completamente escravizado por ela.
do, e deixes essa sensa(cid:231)ªo transbordar atravØs de cada mem- Nenhum viciado em (cid:243)pio enfurnado num barraco de Shangai
bro e de cada veia. Acrescentes a isto a dor cont(cid:237)nua e tortu- jamais foi um dependente tªo indefeso e desventurado.
rante de uma marcha de cinco dias sem comida ou Ægua. Gritei por miseric(cid:243)rdia. A mem(cid:243)ria (cid:151) e a recorda(cid:231)ªo do
Negues sono, desfalecimento ou qualquer outra trØgua (cid:224) dor. que se seguiu (cid:151) abala-me a ponto de impedir-me prosseguir
E... nªo adianta! A minha habilidade em tecer palavras estÆ a narrativa. Em seu lugar abordarei outro t(cid:243)pico, a ela relaci-
aquØm das exigŒncias descritivas de tal sofrimento. onado.
Anatomia Vamp(cid:237)rica
mbora nossa aparŒncia externa permane(cid:231)a grÆfico, Ø invariavelmente pÆlida. Isso se deve,em parte, (cid:224) nossa
muito semelhante (cid:224) dos vivos, hÆ aqueles aversªo (cid:224) luz do sol, mas tambØm a termos sido despertados
dentre n(cid:243)s que insistem que a Mudan(cid:231)a em meio (cid:224) nossa morte. Dar(cid:252)ber noch sp(cid:228)ter.
transforma o indiv(cid:237)duo em outra espØcie (cid:151) Nossa Fome Ø ve(cid:237)culo para a nutri(cid:231)ªo. Nªo hÆ dœvida.
Homo Sapiens Sanguineus, Homo Sapientissimus Considerando isso, e as experiŒncias amargas pelas quais pas-
e Homo Vampiricus foram nomes propostos sei ao tentar ingerir meus alimentos prediletos dos dias em
para a ra(cid:231)a, de acordo com a classifica(cid:231)ªo sueca. que ainda usava pulmıes, conclu(cid:237) que as entranhas do vam-
Em todo o caso, nªo hÆ controvØrsia de que a psiquŒ sofre piro perdem sua capacidade de digestªo. Raramente se vŒ um
uma mudan(cid:231)a tªo radical quanto a do corpo. PerceberÆs com vampiro robusto, e quase todos adquirem um corpo esguio
facilidade que a maior parte do que se segue nªo passa de ap(cid:243)s a Mudan(cid:231)a. Presume-se que, nªo sendo mais necessÆri-
conjecturas (cid:151) e nªo poderia ser de outra forma, visto que os, os (cid:243)rgªos atrofiam.
jamais foi poss(cid:237)vel dissecar um indiv(cid:237)duo de minha espØcie. O corpo do vampiro permanece como era no momento
As mudan(cid:231)as f(cid:237)sicas mais evidentes estªo de tal forma da morte. O cabelo e as unhas continuam a crescer, como
enraizadas na cultura popular que nªo tivemos escolha senªo acontece a um cadÆver fresco mas isso Ø tudo. Se eu quiser
permitir que os ficcionistas as explorassem. Os dentes cani- encurtar meus cabelos ou unhas, preciso cortÆ-los a cada noi-
nos sªo realmente longos e pontiagudos, para melhor suga- te ao me levantar. Creio que o corpo do vampiro estÆ real-
rem sangue. Contudo, eles apenas alcan(cid:231)am sua extensªo mente morto, sendo preservado da decomposi(cid:231)ªo unicamen-
mÆxima no momento do ataque, permanecendo o resto do te pela Mudan(cid:231)a. A pele estica um pouco sobre os ossos, como
tempo retra(cid:237)dos em seus alvØolos pela contra(cid:231)ªo de um teci- acontece com os recØm-falecidos.
do flex(cid:237)vel na base. De outro modo, tanto a fala quanto a Os pulmıes de um vampiro nªo respiram mais, embora
discri(cid:231)ªo seriam muito dificultadas. Alguns carecem dos mei- muitos tenham aprendido a simular a respira(cid:231)ªo enquanto
os para retrair seus dentes, mas esses sªo descobertos com estªo junto a mortais. O sangue fresco da v(cid:237)tima fornece a
facilidade, constituindo um clª em extin(cid:231)ªo. pequena quantidade de oxigŒnio necessÆria para sustentar os
Para nos alimentarmos, precisamos apenas morder, reti- tecidos mortos entorpecidos. Apenas um vampiro jovem ou
rar os dentes da ferida e come(cid:231)ar a sugar. Se ap(cid:243)s bebermos o tolo alimenta-se da veia jugular (cid:151) ali o sangue estÆ no fim da
sangue, lambermos o local, nªo restarÆ qualquer sinal da nos- jornada e cheio de impurezas; o sangue da artØria car(cid:243)tida Ø
sa alimenta(cid:231)ªo. AliÆs, por esse meio somos capazes de curar limpo e puro, sendo muito mais recomendÆvel.
completamente quaisquer ferimentos causados com nossas Assim como os pulmıes nªo mais respiram, o cora(cid:231)ªo
garras ou presas. Nossa pele, como a do vampiro cinemato- tambØm pÆra de bater. O sangue da presa espalha-se atravØs
10 b VAMPIRO: A MÆscara
Description:to antigo chamado Livro de Nod. Nem eu, nem qualquer de mentos em grego, turco, aramaico, latim e Hebraica. Quabalistica, assim como