Untitled - Sociedade Astronômica Brasileira

88 Pages·2010·7.81 MB·English

Boletim da Sociedade Astronômica Brasileira
C E
OMISSÃO DITORIAL
HELIO J. ROCHA-PINTO, Editor
Universidade Federal do Rio de Janeiro
EDUARDO S. CYPRIANO MARCELO EMÍLIO JAÍLSON S. ALCANIZ
Universidade de São Paulo Universidade Estadual de Ponta Grossa Observatório Nacional
S A B O
OCIEDADE STRONÔMICA RASILEIRA BJETIVOS
D A Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) é uma entidade científica sem
IRETORIA
fins lucrativos, fundada em 1974, cujas finalidades são:
 Congregar os astrônomos do Brasil;
Eduardo Janot Pacheco
 Zelar pela liberdade de ensino e pesquisa;
Presidente
 Zelar pelos interesses e direitos dos astrônomos;
João Braga
 Zelar pelo prestígio da ciência do País;
Vice-Presidente
 Estimular as pesquisas e o ensino de Astronomia no País;
Roberto Dell'Aglio Dias da Costa
Secretário-Geral  Manter contato com institutos e sociedades correlatas no País e no
Helio J. Rocha-Pinto exterior;
Secretário  Promover reuniões científicas, congressos especializados, cursos e
Vera Aparecida Fernandes Martin conferências;
Tesoureira  Editar um boletim informativo sobre as atividades da SAB e
assuntos gerais relacionados com a Astronomia.
C B A
OMISSÃO RASILEIRA DE STRONOMIA
P E
OLÍTICA DITORIAL
Daniela Lazzaro
Presidente O Boletim da Sociedade Astronômica Brasileira (ISSN 0101-3440) é o
periódico oficial da SAB e visa registrar a memória de atuação profissional
José Renan de Medeiros da Sociedade Astronômica Brasileira e da pesquisa em Astronomia no país,
Eduardo Janot Pacheco publicando o seguinte conteúdo:
Thyrso Villela Neto
Horácio Dottori • Artigos científicos em Astronomia, seja em português ou inglês.
• Artigos de revisão, em português
COMISSÃO DE ENSINO E DIVULGAÇÃO • Revisão de conferências, colóquios e eventos científicos
• Resenhas de livros sobre Astronomia
• Artigos de opinião sobre política científica em Astronomia
Roberto Dell'Aglio Dias da Costa
Coordenador • Artigos sobre História da Astronomia no Brasil
• Artigos técnicos, em português, sobre instrumentos de uso da comunidade
Carlos Alexandre Wuensche • Relatórios institucionais
Gabriel A.P. Franco • Resumos de teses e dissertações
Luiz Carlos Jafelice • Notas de pesquisa ou comentários sobre outros artigos em Astronomia.
Marcio A.G. Maia • Resumos da Reunião Anual da SAB
Maria Auxiliadora Delgado Machado
Maria de Fatima Saraiva Os artigos de revisão poderão ser submetidos por membros ou solicitados a
Paulo Bretones membros pela Comissão Editorial.
COMISSÃO DA OLIMPÍADA BRASILEIRA Relatórios institucionais podem ser opcionalmente enviados à Comissão
A A Editorial, para publicação no Boletim pelo chefe de departamento ou
DE STRONOMIA E STRONÁUTICA
responsável pela instituição.
João Batista Garcia Canalle
Todos os artigos deverão ser aprovados por relatores ad hoc indicados pela
Coordenador
Comissão Editorial.
Jaime F. Villas da Rocha
Thaís Mothé-Diniz
Helio J. Rocha-Pinto
Editorial
A última década foi particularmente importante para a história da Astronomia brasileira. A
comunidade viu-se madura e numerosa o suficiente para lançar-se a novos desafios no cenário
internacional. Esse crescimento foi fruto de um longo processo de adequação e profissionalização
da comunidade, cujos marcos mais evidentes são a construção do OAB (atual OPD/LNA), a
participação nos consórcios Gemini e SOAR, e a criação e consolidação de diversos cursos de pós-
graduação em Astronomia em unidades de pesquisa do CNPq e em universidades, de públicas a
privadas. A realização da XXVII Assembleia Geral da União Astronômica Internacional, em 2009 –
durante Ano Internacional da Astronomia, no Rio de Janeiro, coroou os esforços destas várias
gerações de astrônomos brasileiros, bem como o apoio decisivo e determinante de diversas agências
de fomento à pesquisa e do MCT.
Longe de ter chegado a cabo, o crescimento da SAB e da Astronomia brasileira traz-nos novas
responsabilidades. Entre 2009 e 2010, a comunidade assistiu e participou de longas discussões com
vistas a elaborar, pela primeira vez na história brasileira, um plano de ação para nortear o
crescimento da Astronomia na próxima década. Grandes colaborações internacionais estão em voga,
com a participação ativa de membros da comunidade em várias. Novos cursos de graduação ou
habilitação em Astronomia deverão atrair jovens e talentosos estudantes para a pós-graduação.
Mesmo a Instrumentação Astronômica e a Astronáutica, áreas em que historicamente o Brasil não
vinha tendo muito desenvolvimento, apresentam recentes e promissores avanços.
Faz-se, portanto, necessário contar com um veículo oficial para a produção e distribuição de
conhecimento e para registro da memória da atuação profissional da sociedade. Esta edição do
Boletim da Sociedade Astronômica Brasileira inaugura um novo formato e uma nova política
editorial. Doravante, o Boletim da Sociedade Astronômica Brasileira será um publicação online e
publicará diversos conteúdos que incluirão artigos científicos, artigos de revisão, resenhas, artigos
de opinião sobre política científica em Astronomia, relatórios institucionais, entre outros.
Esperamos que essas mudanças possam contribuir ainda mais para o amadurecimento da
comunidade astronômica profissional em nosso país.
Helio J. Rocha-Pinto
Editor
Outubro de 2010

Boletim
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da
Boletim da Sociedade Astronˆomica Brasileira, 29, no.1, 3-13 S A B
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(cid:13)c SAB 2010
⋆
Evolu¸c˜ao estelar p´os-AGB
Roberto Ortiz
Escola de Artes, Ciˆencias e Humanidades,USP, Av. Arlindo Bettio, 1000, 03828-000,S˜ao Paulo, SP, Brazil
e-mail: [email protected]
Recebido em 05 de maio de 2009; aceito em 21 de junho de 2009
Resumo.ApartirdoAGB(Asymptotic Giant Branch),aevolu¸ca˜oestelar´emarcadapordiversoseventosqueafetam
radicalmente muitas caracter´ısticas da estrela, tais como: composi¸ca˜o qu´ımica, luminosidade, temperatura, perda de
massa,etc.Nesteartigosa˜odescritosdiversosaspectosdaevolu¸ca˜oestelarduranteafasedospulsost´ermicosdoAGB
enasetapassubsequentes,quefinalmentelevam`aforma¸ca˜odanebulosaplaneta´ria.Aspectosteo´ricoseobservacionais
da evolu¸ca˜o sa˜o apresentados e discutidos, incluindo observac¸o˜es em diversos comprimentos de onda, assim como a
forma¸ca˜o e observac¸a˜o do envolt´orio circunstelar durante a fase TP-AGB (thermal-pulsing) e sua evolu¸ca˜o posterior.
Tamb´emsa˜oapresentadascaracter´ısticast´ıpicasdosobjetosqueseencontramnumafaseevolutivaintermedi´ariaentre
a fase AGB e a forma¸ca˜o da nebulosa planeta´ria. Essas caracter´ısticas sa˜o geralmente utilizadas como crit´erio para a
busca de novos candidatos a essa fase da evolu¸ca˜o estelar.
Abstract. The evolution in the AGB (Asymptotic Giant Branch) is marked with several events that radically change
several characteristics of the star, such as: its chemical composition, luminosity, temperature, mass-loss, etc. In this
paper, the various aspects of the thermal-pulse AGB and its subsequent phases that lead to the formation of a
planetary nebula are described. Theoretical and observational aspects of stellar evolution are described and discussed,
including data obtained at several wavelengths, as well as the formation and observation of the circumstellar envelope
developed during the TP-AGB (thermal-pulsing) phase and its subsequent evolution. The paper also includes typical
characteristics of the objects that are found in a intermediate phase between the AGB and planetary nebula phases,
which are generally used as criteria to search for new candidates for this evolutionary phase.
Palavras-chave. estrelas AGB – evolu¸ca˜o p´os-AGB – nebulosas planeta´rias
1. Introduc¸˜ao tornaram-se dispon´ıveis observac¸˜oes dos sat´elites ISO (de
Graauw et al. 1996) e SPITZER (Fazio et al. 2004), dire-
Aforma¸c˜aodeumanebulosaplaneta´riageralmenten˜aotem
cionadasaalvosespec´ıficos,edemelhorresolu¸c˜aoespaciale
omesmodestaque(naliteraturaenam´ıdiaemgeral)quea
espectral. Grac¸as a esses surveys infravermelhos, o nu´mero
explos˜aode uma supernova,talvez porquea eje¸c˜aoda neb-
de objetos conhecidos nas fases AGB, p´os-AGB e nebulosa
ulosa seja um evento bem menos espetacular. No entanto,
planeta´ria no disco gal´actico tem aumentado substancial-
emtermosquantitativos,acontribuic¸˜aodasnebulosasplan-
mente.
et´arias para a quantidade de massa lan¸cada ao meio inter-
Nesteartigo,atransi¸c˜aoevolutivaentreasfasesAGBe
estelar ´e muito maior, haja vista a grande proporc¸˜ao en-
nebulosa planeta´ria ´e discutida sob va´rios aspectos, te´ori-
tre estrelasde massa intermedi´ariae alta. Shklovski(1956)
cos e observac¸ionais. Na sec¸˜ao 2 sa˜o apresentadas as prin-
talvez tenha sido o primeiro a notar a semelhanc¸a entre a
cipaiscaracter´ısticasdafaseAGB,`aluzdosmodeloste´ori-
tˆenue atmosfera das estrelas gigantes vermelhas e as nebu-
cos; na sec¸˜ao 3, os diversos aspectos observacionais da fase
losas planeta´rias, e foram as caracter´ısticas comuns a esses
TP-AGB (thermal-pulsing) sa˜o apresentados, incluindo o
doisobjetosquesugeriramqueelesformariamumasequˆen-
envolt´orio circunstelar `a luz dos dados obtidos no infraver-
cia evolutiva. No entanto, a compreensa˜o dos aspectos f´ısi-
melho e em radiofrequˆencias; na sec¸˜ao 4, sa˜o apresentadas
cos dessa transic¸˜ao somente seria poss´ıvel com o advento
as previs˜oes dos modelos te´oricos para a eje¸c˜ao do en-
dos trabalhos te´oricos acerca da estrutura e evolu¸c˜ao este-
volt´oriodaestrela;asec¸˜ao5apresentaosprincipaiscrit´erios
lar (Iben 1967, 1983).
encontrados na literatura para a busca de objetos que se
Apartirdosanos1980,aAstronomiainfravermelhadeu
encontram na fase de transi¸c˜ao, entre o AGB e a nebulosa
um grande salto qualitativo e tornou-se realmente com-
planeta´ria; na sec¸˜ao 6 especial ˆenfase ´e dada `a eje¸ca˜o da
petitiva. O sat´elite infravermelho IRAS (Beichman et al.
nebulosa, incluindo dados observacionais de alguns objetos
1988) vasculhou 96% do c´eu em comprimentos de onda in-
e uma compara¸c˜ao com as previs˜oes dos modelos te´oricos;
acess´ıveis do solo, detectando milhares de estrelas gigantes
a sec¸˜ao 7 ´e destinada a discutir alguns problemas que per-
com envolt´orios circunstelares de poeira. Muitas dessas es-
manecem em aberto, bem como sa˜o sugeridas algumas ob-
trelas n˜ao possuem contrapartida vis´ıvel, sendo detectadas
servac¸˜oesquepoderiamlevar`aelucidac¸˜aodealgunspontos
somentenoinfravermelho,ondeaemiss˜aot´ermicadegra˜os
ainda controversos da teoria dessa fase da evolu¸c˜ao estelar.
de poeira circunstelares ´e m´axima. Os espectros infraver-
melhos de baixa resolu¸c˜ao (IRAS-LRS, Olnon et al. 1986)
revelaram a ampla variedade de esp´ecies qu´ımicas pre-
2. A fase TP-AGB
sentesnos gra˜os depoeiracircunstelar.Maisrecentemente,
OAGB(AsymptoticGiantBranch)´eumramododiagrama
Para c´opias, contate: R. Ortiz HR,localizadonoprolongamentodoramohorizontaleque
4 Roberto Ortiz: Evolu¸ca˜o estelar p´os-AGB
confunde-se parcialmente com o ramo das gigantes vermel- ceiro epis´odio de dragageme´e o responsa´velpeloenriquec-
has (RGB ou Red Giant Branch). Resultado natural da imento da atmosfera das estrelas TP-AGB com C, fazendo
evolu¸c˜ao de estrelas com massa entre 0.5 <M/M⊙ < 5 ∼ 8, com que [C/O]> 1. As estrelas que j´a passaram por esse
(Bressan et al. 1993) mais de 95% das estrelas do universo processo sa˜o frequentemente chamadas de estrelas de car-
passara˜o pela fase AGB ap´os o esgotamento do processo bono (ou simplesmente carbonadas), em contraposi¸c˜ao `as
triplo-α em seu nu´cleo. Nessa fase, a estrutura da estrela estrelas de classe espectral M. Al´em do C, outros elemen-
compreende:(i)umnu´cleoinerte,compostoporCeO(com tos produzidos por captura lenta de nˆeutrons (processo-s)
[C/O]≃0.1−1,dependendodamassadaestrela),quecon- tamb´emsa˜o“dragados”paraaatmosferadaestreladurante
t´em uma parte substancial da massa da estrela (0.5 ∼ 1.0 a 3a. dragagem, tais como o Zr, Nb, Mo, Ru, etc (Iben &
M⊙)eondeosel´etronsesta˜onoestadodegenerado;(ii)uma Renzini 1983). Neste caso, a fonte de neutrons sa˜o reac¸˜oes
fina camada de He, que por vezes ´e responsa´vel pela lumi- semelhantes a 22Ne(α,n)25Mg, principalmente 13C(α,n)16O
nosidadedaestrela;(iii)umenvolt´orioconvectivodeH,que (Gallino et al. 1998) operando na regia˜o entre as camadas
compreende a maior parte do volume da estrela e em cuja que“queimam”H e He. Esses nˆeutrons, se capturados por
base opera o ciclo p-p durante a maior parte do tempo da outros nu´cleos, formam elementos mais pesados que even-
fase TP-AGB (a ser discutida adiante); (iv) um envolt´orio tualmente podem ser “dragados” para a atmosfera da es-
circunstelar de ga´s e poeira, presente em praticamente to- trela, modificando suas abundˆancias qu´ımicas.
das as estrelas AGB (sec¸˜ao 3).
Em termos evolutivos, o ramo AGB pode ser dividido
3. Caracter´ısticas observacionais da fase TP-AGB
emduasfases:naprimeiradelas,tamb´emchamadadeearly-
AGB,aluminosidadedaestrela´egeradapelaqueimadeHe Talvez a caracter´ıstica mais impressionante das estrelas na
numa camada em torno do nu´cleo inerte da estrela, com- faseTP-AGBsejaotamanhodeseuenvolt´oriocircunstelar
posto basicamente por C e O. Na segunda fase, chamada e a alta taxa de perda de massa, superior a qualquer outra
de thermal pulsing-AGB (TP-AGB), o ciclo p-p opera na fasedesuaevolu¸c˜ao.OobjetoIRC+10216´eumafortefonte
base do envolt´orio convectivo, e durante 90% do tempo ´e de infravermelho detectada durante o Two Micron Star
a fonte prima´ria de energia da estrela. No entanto, toda Survey (Neugebauer & Leighton 1969). No artigo original,
vez que a massa da camada adjacente interna de He atinge Becklin et al. (1969) mostraram que a distribui¸c˜ao espec-
10−2M⊙, a reac¸˜ao 34He→12C´e reiniciada e torna-se tempo- traldeenergiadesseobjetocorrespondeaumatemperatura
rariamenteafontedominantedeenergiadaestrela,inibindo efetiva de apenas 650K, muito baixa para uma fotosfera,
o ciclo p-p na camada acima. Como os el´etrons dessa ca- mas compat´ıvel com a emiss˜ao t´ermica de um envolt´orio
madaencontram-senoestadodegenerado,aenergiagerada circunstelar de poeira. Outro objeto com caracter´ısticas
peloprocessotriplo-α´einicialmenteutilizadapararemover semelhantes´e IRC+10011, cuja oculta¸c˜ao pela Lua revelou
a degenerescˆencia eletroˆnica do ga´s. O su´bito aumento da que a emiss˜ao infravermelha origina-se de um objeto cu-
taxa de produc¸˜ao de energia gerada pela queima de He jas dimens˜oes sa˜o va´rias ordens de grandeza superiores ao
(flash do He) aumenta a temperatura da regia˜o, contudo tamanhodeumagigante(Zappalaetal.1974).Essasobser-
sem acarretar em aumento de press˜ao e por conseguinte a vac¸˜oes confirmaram a existˆencia de uma classe de estrelas
expans˜ao local do ga´s, porque a press˜ao de degenerescˆen- gigantes vermelhas com extensos envolt´orios circunstelares
cia n˜ao depende da temperatura, mas da densidade. O re- de poeira, formados a partir de mol´eculas tais como o CO
sultado ´e que a queima de He nessa camada produz alta e diversos tipos de silicatos, que sobrevivem normalmente
luminosidade (localmente), que ir´a diminuir somente ap´os pr´oximo a estrelas frias. A opacidade dos gra˜os de poeira
a remo¸c˜ao da degenerescˆencia eletroˆnica. Posteriormente, `a radiac¸˜ao estelar contribui para a acelera¸c˜ao da mat´eria
com a queima da maior parte do He nessa camada, o pro- circunstelar como um todo, facilitando a perda de massa
cessotriplo-αcessaeociclop-pretomaopapeldesuprira (Netzer&Elitzur1993).Modeloste´oricoseobservac¸˜oesin-
luminosidade da estrela na base do envolt´orio convectivo. dicamqueataxadeperdademassanafaseTP-AGBvaria
A dura¸c˜ao da fase early-AGB depende da massa do nu´- entre 10−7 e 10−4M⊙/ano (Bedijn 1987, Groenewegen et al.
cleo, mas ´e de cerca de 107 anos para M< 3M⊙ (Iben & 2007). Se lembrarmos que essas estrelas sa˜o muitas ordens
Renzini 1983, Vassiliadis & Wood 1993). Por outro lado, de grandeza mais abundantes do que as precursoras de su-
a dura¸c˜ao da fase TP-AGB ´e de apenas um d´ecimo desse pernovas tipo II (Salpeter 1955), podemos concluir que a
valor, para o mesmo intervalo de massa. Os pulsos t´ermi- mat´eria interestelar ´e predominantemente constituida pelo
cos durante a fase TP-AGB ocorrem dezenas de vezes, em material expelido por estrelas AGB e de sua fase subse-
intervalos de ∼105 anos (Fig. 1), sendo que imediatamente quente, as nebulosas planeta´rias.
ap´os um flash do He a estrela sofre um su´bito acr´escimo As dimens˜oes relativas da estrela e do envolt´orio cir-
de brilho durante um breve per´ıodo (∼ 500 anos), seguido cunstelar podem ser estimadas atrav´es de observac¸˜oes em
de um per´ıodo mais longo (15−20% do ciclo) durante o diversos comprimentos de onda. O raio t´ıpico de uma es-
qual a luminosidade diminui a 50%. Posteriormente, a es- trela AGB com Tef = 2500K e luminosidade L= 6000L⊙ ´e
trelarecuperagradualmentesualuminosidadepr´e-cicloat´e de 3×1013cm ou 2 U.A. Se considerarmos que os gra˜os se
opr´oximoflash(Fig.1).Emboraaluminosidadedaestrela condensam `a temperatura de 900K e que esta˜o em equi-
varie ao longo do ciclo, seu valor m´edio cresce ao longo do l´ıbrio t´ermico, enta˜o eles se formara˜o a uma distˆancia a
AGB, podendo atingir 5.6×104L⊙ (Wood et al. 1983). partir de ∼ 8 R⋆ da estrela. Por outro lado, observac¸˜oes
Quando uma estrela chega ao AGB, a abundˆancia de emra´dio-frequˆenciasmostramqueoenvolt´oriocircunstelar
O ´e geralmente maior que a de C, como ocorre na maior comumente estende-se at´e ∼1000R da estrela central.
⋆
parte das estrelas do Universo. Durante um pulso t´ermico, Muitas estrelas AGB apresentam emiss˜ao maser ou es-
a base do envolt´orio convectivo de H pode penetrar na timulada, indicando que a popula¸c˜ao dos n´ıveis molec-
regia˜o de interface entre as camadas onde “queimam” H ulares apresenta grandes desvios do equil´ıbrio termod-
e He (rica em 12C), levando o material rec´em-processado inˆamico. Elitzur (1992) discute em detalhe modelos te´ori-
at´e a superf´ıcieda estrela.Esse processo´e chamado de ter- cos de masers e constitui-se em bibliografia b´asica sobre o
Roberto Ortiz: Evolu¸ca˜o estelar p´os-AGB 5
Figura1.Aluminosidade(relativaaoSol)emfunc¸a˜odotempot,deumaestrelaTP-AGBcom0.6M⊙,emunidadesde105 anos,
contado a partir do primeiro pulso t´ermico. As setas indicam a durac¸a˜o de cada ciclo (em anos), que se inicia a cada flash do He.
(Iben 1982, reproduzidosob a permissa˜o da American Astronomical Society, AAS).
assunto. A descoberta de emiss˜ao maser circunstelar ´e de- perda de massa (Vassiliadis & Wood 1993) e com o modo
vida a Wilson & Barrett (1968), que detectaram intensa de pulsac¸˜ao (Wood 1974). Os modelos te´oricos buscam ex-
emiss˜ao de OH em λ = 18 cm, na dire¸c˜ao da“estrela in- plicar por que as estrelas OH/IR, geralmente tˆem per´ıodos
fravermelha” NML Cygni. Na realidade, a emiss˜ao maser maiores (at´e 3000 dias) do que vari´aveis do tipo mira, por
´e observada em 3 distintas transic¸˜oes dessa mol´ecula, nas exemplo (Harvey et al. 1974, Herman et al. 1984).
frequˆenciasde1612,1665e1667MHz.Emestrelasquepos- A luminosidade m´axima de uma estrela no RGB ´e de
suem um espesso envolt´orio de poeira, geralmente devido ∼2.5×103L⊙. Por outro lado, observac¸˜oes de estrelas AGB
`a intensa perda de massa, a emiss˜ao maser predominante nas Nuvens de Magalh˜aes (Wood et al. 1983, Groenewegen
ocorre na frequˆencia de 1612 MHz. Neste caso, o objeto ´e et al. 2007) revelaram a existˆencia de estrelas com at´e
geralmente denominado“OH/IR”e a emiss˜ao maser ´e de 5.6×104L⊙, com um valor m´edio de ∼ 5×103L⊙. No bojo
tipo II (ou“sat´elite”). Os objetos OH/IR geralmente n˜ao gal´actico foram observadas estrelas OH/IR com luminosi-
possuem contrapartida vis´ıvel porque a estrela´e completa- dade de at´e 4.4×104L⊙, embora o valor m´edio esteja mais
mente obscurecida pelo seu envolt´orio, de onde prov´em a pr´oximo de ∼ 7×103L⊙ (Ortiz et al. 2002). A alta lumi-
emiss˜ao infravermelha observada. Por outro lado, estrelas nosidade, aliada `a relac¸˜ao bem definida entre o per´ıodo de
cujoenvolt´oriodepoeirapossuimenorprofundidade´optica pulsac¸˜ao e a luminosidade (Feast et al. 1989, Glass et al.
equeapresentamcontrapartidavis´ıvelapresentamemissa˜o 1995), fazem das vari´aveis tipo mira um ´otimo padr˜ao de
maser predominantemente em 1665 e 1667 MHz, e o maser distˆancia,quetemsidofrequentementeutilizadocomostan-
´eclassificadocomotipoI(ou“principal”).Agrandemaioria dard candle em gal´axias pr´oximas (Whitelock et al. 2009).
dosmasersdeOH´ededuplopicodevidoaoefeitoDoppler,
indicando que o envolt´orio de OH afasta-se da estrela com
velocidade de ∼ 15 km/s. Ha´ tamb´em um nu´mero signi- 4. O final da fase AGB e a ejec¸˜ao da nebulosa
ficativo de masers de pico u´nico e com perfis de linha mais
NofinaldafaseAGB,aluminosidadeaumentalentamente,
complexos,indicandoqueoenvolt´oriocircunstelarpodeap-
at´e atingir um valor cr´ıtico, al´em do qual o envolt´orio es-
resentar grandes desvios da simetria esf´erica. Al´em do OH,
telar de hidrogˆenio sofre uma instabilidade dinaˆmica, que
outrastransic¸˜oesmasermolecularestˆemsidoobservadasna
por sua vez gera intensa perda de massa (Tuchman et al.
dire¸c˜ao de estrelas AGB, principalmente SiO, H O e HCN.
2 1978).Juntamentecomessefenˆomeno,omododepulsac¸˜ao
EstrelasTP-AGBtamb´empodemapresentarpulsac¸o˜es, da estrela muda do primeiro (ou segundo) harmˆonico para
sem relac¸˜ao direta com os pulsos t´ermicos discutidos na o modo fundamental (Wood 1974). De fato, a pulsac¸˜ao no
sec¸˜ao2,queocorremaintervalosdetempobemmaiores.As modo fundamental, cujo per´ıodo´e mais longo,´e frequente-
vari´aveis de longo per´ıodo (long-period variables, LPV, ou mente observada em estrelas OH/IR, e resulta na intensa
simplesmentemiras)sa˜oestrelasAGBquetˆemper´ıodobem perda de massa comumente observada nessas estrelas, de
definido,300diasemm´edia,ecurvadeluzdegrandeampli- at´e 10−4M⊙/ano.
tude,podendofacilmenteatingir5magnitudesnabandaV E´ somente durante os u´ltimos pulsos t´ermicos que
(de pico a pico). As vari´aveis semi-regulares (Semi-regular ocorre a fase de perda de massa mais intensa, o super-
variables,ouSR)tˆemper´ıododaordemde150diasemenor vento (Renzini 1981). Ap´os cada pulso, a luminosidade da
amplitudedevariabilidadedoqueasmiras.Ha´aindaestre- estrela diminui `a metade durante um tempo equivalente a
lasAGBquesa˜ovari´aveisirregulares(designadaspelaletra cerca de 15% do ciclo (Fig. 1). Posteriormente, a luminosi-
L) e n˜ao-vari´aveis. O per´ıodo de pulsac¸˜ao esta´ diretamente daderecupera-segradativamente,atingindonovamenteseu
relacionado com a massa da estrela (Feast 1963, Feast & valor original durante a segunda metade do ciclo, per´ıodo
Whitelock 1987, Jura & Kleinmann 1992), com a taxa de em que ocorre o supervento. Bastam 2 ou 3 ciclos para
6 Roberto Ortiz: Evolu¸ca˜o estelar p´os-AGB
que a estrela expulse todo o seu envolt´orio de hidrogˆenio,
restando somente seu nu´cleo de C e O, sob uma fina ca-
mada de H e He. Diante do exposto acima, podemos con-
cluirqueamaioriadasestrelasdeixara˜ooAGBqueimando
H, enquanto nas estrelas restantes o He consistira´ na fonte
prima´ria de energia ap´os a fase AGB. Ha´ ainda a possibil-
idade da estrela deixar o AGB na iminˆencia de iniciar um
novociclo.Nestecaso,o pulsot´ermicopoder´aocorrerapo´s
a estrela deixar o AGB, e ela passara´ a queimar He na fase
p´os-AGB. Parte da camada convectiva de He penetrar´a na
camada superior de H e a estrela retornar´a ao ramo das
gigantes,ondepermanecera´duranteapenasalgumascente-
nas de anos, antes de deixar definitivamente o AGB (Iben
1984, Bloecker 1995). Estrelas vari´aveis do tipo R Coronae
Borealis talvez estejam neste esta´gio evolutivo (sec¸˜ao 5.1).
Ap´os a eje¸c˜ao do envolt´orio de H, a luminosidade da
estrela permanece constante, enquanto seu nu´cleo parece
cada vez mais quente, fazendo com que a estrela percorra
uma trajeto´ria horizontal no diagrama HR. Modelos te´ori-
cos (Schoenberner 1981, 1983; Vassiliadis & Wood 1994;
Bloecker1995) mostram que o tempo decorridoentre o fim
do AGB e a ionizac¸˜ao da nebulosa depende da massa da
estrela e da metalicidade, mas ´e tipicamente 2×103 anos,
paraMnucleo =0.63M⊙ (correspondente`amassanasequˆen-
ciaprincipalMSP =2.0M⊙emetalicidadeZ=0.02).Durante
esse per´ıodo, a luminosidade da estrela permanece aproxi-
madamente constante, L= 8.0×103L⊙. Apenas para com-
parac¸˜ao, uma estrela com Mnucleo =0.90 M⊙ (MSP =5.0M⊙)
ionizara´ a nebulosa em menos de 102 anos, enquanto uma
outra com Mnucleo = 0.57 M⊙ (correspondente a MSP =
1.0M⊙), precisar´a de aproximadamente 2×104 anos.
5. A busca por objetos de transi¸c˜ao
Figura2. Distribui¸ca˜o espectral de energia (SED) de dois ob-
Na literatura, os objetos que deixaram o AGB sa˜o desig-
jetos de transi¸ca˜o: IRAS 07134+1005 e IRAS 12175−5338. O
nados por diversos nomes, de acordo com suas caracter´ısti- ma´ximodadistribuic¸a˜opr´oximoaλ=0.7µm´edevido`aemiss˜ao
cas observacionais: p´os-AGB, proto nebulosas planeta´rias, fotosf´erica da estrela, avermelhada pelo envolt´orio circunstelar
OH/PN, etc. Diante da variedade de denomina¸c˜oes e a di- de poeira,enquantoo ma´ximoem λ≃20µm´e devido`a emiss˜ao
ficuldade de se estabelecer o exato status evolutivo desses t´ermicadepoeiradoenvolt´orio(Hrivnaketal.1989,reproduzido
objetos, talvez seja mais prudente chama-los de objetos de sob a permissa˜o da American Astronomical Society, AAS).
transic¸a˜o como fazem alguns autores.
Na sec¸˜ao 4 vimos que o tempo decorrido entre a eje¸c˜ao
do envolt´orio de H e a ionizac¸˜ao da nebulosa ´e extrema- todas as estrelas supergigantes (ou hipergigantes) com
mente curto, o que significa que, em termos compara- alta latitude gal´actica devem ser objetos de transi¸c˜ao,
tivos,n˜aodevemexistirmuitosobjetosnessafaseevolutiva. devido `a escassez de estrelas jovens distantes do plano
Por outro lado, estes devem exibir algumas caracter´ısticas gal´actico. Muitos objetos de transi¸c˜ao tˆem sido encontra-
muitopeculiares,quenospermitemdiferencia-losinequivo- dos selecionando-se estrelas luminosas em altas latitudes
camentedasdemaisestrelas.Nestasec¸˜ao,sa˜oapresentados (Parthasarathy et al. 1993, 1995), principalmente supergi-
os principais crit´erios utilizados para selecionar candidatos gantesdeclasseespectralentreFeG.DepoisqueBidelman
a objetos de transic¸˜ao, por´em como alguns incluem carac- (1951) confirmou a existˆencia de supergigantes em altas
ter´ısticastamb´emencontradasemobjetosjovens,taiscomo latitudes gal´acticas, Parthasarathy & Pottasch (1986) e
estrelas T Tauri e proto-estrelas, sua natureza pode ser Lamers et al. (1986) foram os primeiros a sugerir que
bem estabelecida somente determinando-se suas abundˆan- algumas delas n˜ao seriam estrelas massivas ejetadas do
cias qu´ımicas, que devem refletir as mudan¸cas de com- plano, mas objetos em esta´gios avan¸cados de evolu¸c˜ao.
posi¸c˜ao ocorridas durante a fase AGB. Um cat´alogo de ob- Essa hipo´tese foi proposta para tentar explicar o excesso
jetos de transic¸˜ao foi compilado por Szczerba et al. (2007) de emiss˜ao no infravermelho observado em dire¸c˜ao a algu-
e constitui-se na mais extensa base de dados atualmente masdessasestrelas(Treffersetal.1976,Tapia1982),assim
dispon´ıvel. comoapresenc¸adelinhasdeemiss˜aomolecularesdeorigem
circunstelar(Lambertetal.1981).Observac¸˜oesposteriores,
efetuadaspelosat´eliteIRAS,levariam`adetec¸c˜aodemuitas
5.1. Estrelas super e hiper-gigantes com excesso de
outras estrelas candidatas a objetos de transi¸c˜ao (Hrivnak
infravermelho
et al. 1989, Trams et al. 1991, Oudmaijer et al. 1992).
Com a expuls˜ao do envolt´orio da estrela, aumenta o raio EstrelasdotipoUU Herculisporexemplo,sa˜ovari´aveis
de sua atmosfera, diminuindo a gravidade. Praticamente pulsantes situadas em altas latitudes gal´acticas que apre-
Roberto Ortiz: Evolu¸ca˜o estelar p´os-AGB 7
sentam curva de luz de pequena amplitude (cerca de 0.1 5.2. Distribui¸c˜ao espectral de energia bimodal
magnitude) e dois per´ıodos simultaˆneos, `as vezes intercala-
dos por fases de brilho constante. A raridade de objetos Os objetos de transic¸˜ao cuja distribui¸c˜ao espectral de en-
massivos em altas latitudes gal´acticas e a existˆencia de ergia (Spectral Energy Distribution, SED) ´e de duplo pico
excesso de infravermelho em algumas delas indicam que (ou bimodal) sa˜o descobertos em surveys, principalmente
muitas estrelas desta classe sa˜o, na realidade, objetos de no infravermelho m´edio (IRAS, MSX, etc.). O m´aximo no
transic¸˜ao. infravermelho m´edio (Fig. 2) ´e consequˆencia da emiss˜ao
t´ermica de gra˜os de poeira do envolt´orio circunstelar, que
Estrelas RV Tauri sa˜o supergigantes pulsantes, com ocorregeralmenteemλ≃20µm.Om´aximomais“azul”cor-
per´ıodoentre30∼150dias,emboraacurvadeluznemsem- responde `a emiss˜ao fotosf´erica avermelhada pelo envolt´orio
presejaregular,alternandom´ınimosprofundosediscretos. circunstelar, geralmente em λ = 0.4 ∼ 2µm, dependendo
Geralmente sa˜o de tipo espectral F, G ou K e frequente- da temperatura da estrela e da profundidade ´optica de seu
menteapresentamexcessodeemiss˜aonoinfravermelho,que envolt´oriocircunstelar.Entreosdoism´aximosh´aumacon-
indica a presenc¸a de mat´eria circunstelar, provavelmente sidera´veldiminui¸c˜aodeintensidadedaSED,especialmente
ejetada durante a fase AGB. O proto´tipo da classe tem pr´oximo a λ = 5µm. Combinando dados fotom´etricos no
per´ıodo de 78.7 dias, ao longo dos quais sua magnitude infravermelho pr´oximo e m´edio ´e poss´ıvel encontrar can-
varia entre 9.8 e 13.3, e seu tipo espectral entre G2 e M2. didatosa objetosdetransi¸c˜ao,inclusivenaregia˜odo plano
gal´actico. No entanto, sua natureza deve ser confirmada
Estrelas vari´aveis do tipo R Coronae Borealis (R CrB)
por meio de observac¸˜oes adicionais, sobretudo a an´alise de
sa˜o supergigantes deficientes em H e ricas em C que ir-
abundˆancias,oquerequerqueoobjetotenhacontrapartida
regularmentesofremabruptasquedasdeluminosidade,po-
vis´ıvel, nem sempre existente.
dendo atingir 9 magnitudes. Esses episo´dios parecem es-
Os objetos dessa categoria geralmente sa˜o descober-
tar relacionados com a presenc¸a de um envolt´orio espesso
tos selecionando-se fontes no infravermelho m´edio cujos
de poeira, formado gra¸cas ao su´bito e intenso episo´dio de
´ındicesdecorencontram-sedentrodecertosintervalosbem
perdademassadaestrela.Umadashipo´tesesparaexplicar
definidos. van der Veen & Habing (1988) utilizaram o dia-
ofenˆomenoRCrBconsisteemepiso´diosdeperdademassa
gramadecor[12-25]×[25-60]paraestudaraevolu¸c˜aoestelar
mais intensa, que produziriam um envolt´orio circunstelar
al´em da fase AGB (Fig. 3). Eles observaram que, `a me-
temporariamenteopaco`aradiac¸˜ao.Poroutrolado,abaixa
didaqueumaestreladesenvolveumenvolt´oriocircunstelar
gravidade superficial seria resultante da expuls˜ao do en-
de poeira, ela desloca-se para regio˜es bem caracter´ısticas
volt´orio da estrela, o que confirmaria a natureza de um
no diagrama de cor [12-25]×[25-60], dependendo da com-
objeto de transic¸˜ao. O cat´alogo de Szczerba et al. (2007)
posi¸c˜ao qu´ımica do envolt´orio (basicamente a raza˜o [C/O])
inclui 36 estrelas do tipo R CrB com alta probabilidade de
e da profundidade ´optica (relacionada `a taxa de perda de
serem objetos de transic¸˜ao. Esta categoria inclui o“objeto
massa).AsequˆenciadeestrelasAGB,ordenadasdeacordo
de Sakurai”(Duerbeck & Benetti 1996) e FG Sge (Sparks
com a produndidade ´optica do envolt´orio, distribui-se ao
& Kutter 1973) que, al´em de apresentarem variabilidade,
longodasregio˜esI,IIeIIIdodiagrama,enquantoasnebu-
tˆem exibido aumento na abundˆancia de Y, Zr, Ce e out-
losas planeta´rias encontram-se majoritariamente na regia˜o
ros elementos gerados durante a fase AGB por processos-s
V. Portanto, os autores concluiram que os objetos de tran-
(Langer et al. 1974) em escalas de tempo que variam de 1
si¸c˜aodeveriamocuparprincipalmentearegia˜odenominada
a 103 anos (Christy-Sackmann & Despain 1974).
‘IV’, intermedi´aria entre as estrelas AGB e as nebulosas
Um dos objetos de transic¸˜ao mais espetaculares j´a de- planeta´rias.Diversoscandidatosaobjetosdetransi¸c˜aotˆem
scobertos ´e HR 4049 (HD89353 = IRAS 10158-2844). sido identificados segundo crit´erios de´ındice de cor IRAS
Trata-sedeumsistemabina´riocerradocomper´ıodode429 (Kwoketal.1987,vanderVeenetal.1989,Huetal.1993,
dias, composto por uma hiper ou supergigante de tipo es- Sua´rez et al. 2006) e modelos te´oricos propondo explicar a
pectralB9.5Ib-IIeumacompanheiradebaixamassa(ainda evolu¸c˜ao estelar em diagramas cor-cor tˆem sido propostos
n˜ao detectada), presumivelmente uma an˜a tipo M ou uma (Volk & Kwok 1989, van Hoof et al. 1997).
an˜a-branca(Waelkensetal.1991;vanWinckeletal.1995). Com o advento de novos surveys no infravermelho m´e-
O sistema apresenta excesso de emiss˜ao nas bandas IRAS, dio, outros crit´erios de ´ındices de cor, em outras ban-
provavelmente devido `a presenc¸a de um envolt´orio circun- das fotom´etricas, tˆem sido propostos. Ortiz et al. (2005)
stelardepoeiraremanescentedafaseAGB.AlinhaHαtem utilizaram fotometria do survey MSX (Midcourse Space
perfil P Cygni enquanto outras linhas da s´erie de Balmer Experiment, Egan 1998) para estudar a distribui¸c˜ao de es-
aparecem parcialmente preenchidas (Bakker 1995), sug- trelasAGBdecarbono,OH/IR,objetosdetransi¸c˜aoeneb-
erindo intensa perda de massa. Seu espectro ´e compat´ıvel ulosas planeta´rias em diagramas de cor. Eles observaram
com o de uma estrela de T ≃ 7500K e logg ≃ 1.0. A que os objetos OH/IR esta˜o distribuidos em duas regio˜es
ef
composi¸c˜ao qu´ımica por´em,´e inusitada: baix´ıssima metali- bem definidas do diagrama, separados por um gap (Fig.
cidade ([Fe/H]=−4.8, Waelkens et al. 1991) e abundˆancias 4). Um desses grupos de estrelas OH/IR esta´ localizado na
de C, N, O e S semelhantes ao valor solar (Lambert et al. mesma regia˜o do diagrama ocupada pelas nebulosas plan-
1988). Al´em do Fe, outros elementos, tais como o Mg, Ca, et´ariaseobjetosdetransi¸c˜ao,eportantodevemserestrelas
Si e Cr, tˆem abundˆancia quase duas ordens de grandeza prestes a se tornarem objetos de transi¸c˜ao, embora o per-
abaixo do valor solar (Waelkens et al. 1991, Bakker et al. fil maser de OH pare¸ca normal na maioria dos casos. Uma
1996). Segundo Mathis & Lamers (1992), inicialmente a compara¸c˜ao entre esses resultados com os modelos te´oricos
abundˆanciafotosf´ericadesseselementosseriapr´oxima`aso- deVolk(1998,comunicac¸˜aoparticular),mostrouqueogap
lar, contudo durante a forma¸c˜ao do envolt´orio circunstelar que separa os dois grupos ´e resultado da ra´pida evolu¸c˜ao
depoeira,esses´atomosteriamsedepositadosobreosgra˜os, estelarnafasequeprecedeosuperventoeosobjetosquese
causandoumaaparentesub-abundˆancianafotosferadaes- encontramnessaregia˜opodemserconsideradoscandidatos
trela. a objetos de transic¸˜ao.
8 Roberto Ortiz: Evolu¸ca˜o estelar p´os-AGB
Figura3.Diagramacor-corIRAS,mostrandoasequˆenciaevolutivaaolongodoAGB(linhatracejada).Oenvolt´oriocircunstelar
de poeira desenvolve-se `a medida que a estrela desloca-se pelas regio˜es I, II, IIIa e IIIb. A regia˜o IV cont´em objetos de transi¸ca˜o
e a regia˜o V as nebulosas planeta´rias (van der Veen & Habing 1988, reproduzidosob permiss˜ao).
5.3. Nebulosas de reflex˜ao compactas por cerca de 7 segundos de arco (Westbrook et al. 1975).
O espectro da nebulosa ´e de absor¸c˜ao (Schmidt & Cohen
Os primeiros objetos de transic¸˜ao a serem identificados 1981),oqueconfirmatratar-sedeumanebulosadereflex˜ao
foram AFGL 618 (Westbrook et al. 1975) e AFGL 2688 iluminadaporumaestreladetipoespectralB0,semcontra-
(Nebulosa do “Ovo”, Fig. 5, Ney et al. 1975). As nebu- partidanovis´ıvel.Observac¸˜oesem15GHz(Wynn-Williams
losas de reflex˜ao associadas a objetos de transic¸˜ao geral- 1977)revelaramqueaemiss˜aora´dio´edenaturezat´ermica,
mente apresentam distribui¸c˜ao espectral de energia bi- indicando que a fotoioniza¸c˜ao deste objeto j´a deve ter se
modal, com temperaturade cor da ordem de poucas cente- iniciado nas porc¸˜oes mais internas da nebulosa. Em sua
nasdeKelvin.Portanto,essesobjetospodemserencontra- parte mais externa existe um enorme envolt´orio molecular
doscombinando-sedadosdefluxonoinfravermelho(IRAS, em expans˜ao,`a velocidadede 20 km/s (Lo & Bechis1976),
MSX, AFGL, etc.) com dados de imageamento, por exem- valor bastante similar ao comumente encontrado em estre-
plo. las OH/IR, por exemplo. Ao mesmo tempo, medidas da
Devido `a grande variedade de mol´eculas presentes, o linhadeCOmostraramquetamb´emexisteumventomuito
espectro nebular geralmente tem muitas linhas e ban- maisra´pido,comvelocidadesuperiora190km/s(Gammie
das de emiss˜ao moleculares em radiofrequˆencias e no in- etal.1989,Cernicharoetal.1989),similaraoquetemsido
fravermelho.Observac¸˜oesdosat´eliteISO(InfraredSatellite observadoemnebulosasplaneta´rias(Perinotto1993).Entre
Observatory, de Graauw et al. 1996) mostram que o espec- asesp´eciesmolecularesj´aencontradasnanebulosaesta˜odi-
tro infravermelho de objetos de transic¸˜ao´e frequentemente versas mol´eculas carbonadas, tais como CO (Zuckerman et
rico em esp´ecies carbonadas so´lidas, i.e. devido `a presenc¸a al. 1977), HC N (Jewell & Snyder 1984), HCN (Deguchi et
3
desses compostos depositados sobre gra˜os (Beintema et al. al. 1986), CS, SiO, HNC, HCO+, CH CN e HC N, entre
3 5
1996).Entre3e20µm,existemnumerosaslinhasebandas outras (Bujarrabal et al. (1988). O espectro infravermelho
moleculares n˜ao identificadas (Unidentified InfraRed, UIR, tamb´em cont´em bandas caracter´ısticas de mol´eculas car-
Fig. 6), geralmente atribu´ıdas a hidrocarbonetos aroma´ti- bonadas, tais como as bandas em 3.4 µm (devido `a liga¸c˜ao
cos polic´ıclicos (Polycyclic Aromatic Hydrocarbons, PAH, C−H) e em 12 µm (devido ao SiC), ambas em absor¸c˜ao
Waters et al. 1999). A sobrevivˆencia dessas mol´eculas ´e (Lequeux & Jourdain de Muizon 1990). Conforme discu-
garantida gra¸cas aos gra˜os circunstelares, que agem como tido na sec¸˜ao 2, a raza˜o de abundˆancia [C/O]> 1 ´e uma
umabarreira´optica,impedindoqueosf´otonsmaisenerg´eti- evidˆencia do terceiro epis´odio de dragagem, ocorrido du-
cosdissociemasesp´eciesmolecularesmaissuscet´ıveis`adis- rante a fase TP-AGB.
sociac¸˜ao por fontes ionizantes. No cat´alogo de objetos de transi¸c˜ao de Szczerba et al.
AFGL 618 foi descoberta durante o survey infraver- (2007) h´a apenas 4 objetos catalogados como nebulosas
melho conduzido pelo Air Force Geophysical Laboratory de reflex˜ao entre os 326 indicados como “alta probabili-
(Price & Walker 1976). Sua temperatura de cor ´e de ape- dade de serem Po´s-AGB”. A“pegada de Minkowski”(M1-
nas 200 K, e imagens obtidas no infravermelho e no vis´ıvel 92, Minkowski 1946) ´e de morfologia bipolar, assim como
mostramumanebulosabipolar,cujoslobosesta˜oseparados AFGL 618 e a “nebulosa do Bumerangue” (ESO 172-7,