Table Of ContentPONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
RAIMUNDA DIVA DE VASCONCELOS RIBEIRO
A TÉCNICA NA VISÃO DE HANS JONAS:
UMA RELEITURA A PARTIR DE
ALASDAIR MACINTYRE
DOUTORADO EM FILOSOFIA
SÃO PAULO
2013
RAIMUNDA DIVA DE VASCONCELOS RIBEIRO
A TÉCNICA NA VISÃO DE HANS JONAS:
UMA RELEITURA A PARTIR DE
ALASDAIR MACINTYRE
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título de
Doutora em Filosofia sob a orientação do Prof. Dr.
Marcelo Perine
SÃO PAULO
2013
RAIMUNDA DIVA DE VASCONCELOS RIBEIRO
A TÉCNICA NA VISÃO DE HANS JONAS:
UMA RELEITURA A PARTIR DE
ALASDAIR MACINTYRE
BANCA EXAMINADORA
Orientador: Prof. Dr. Marcelo Perine
Profa. Dra. Marijane Vieira Lisboa
Profa. Dra. Sonia Campaner
Prof. Dr. Jelson Roberto de Oliveira
Prof. Dr. Helder Buenos Aires de Carvalho
SÃO PAULO
2013
Pai,
Estou terminando mais uma etapa da viagem infindável em busca
daquilo a que tu davas mais valor, o conhecimento. Desta vez não
pude contar com tuas palavras, conhecimento e sabedoria. É
incomensurável a saudade dos teus olhos, da tua voz, das tuas
palavras, dos teus conselhos, do teu gargalhar, de te ouvir cantar,
de te ver trabalhar, de te ver abrir o portão para eu entrar, de te ver
feliz por poder ajudar o outro, principalmente do teu jeito simples de
viver. Sempre pensarei em ti, mas fica a vontade de tê-lo, ainda, por
aqui. Homem forte nos embates com a vida, sem demonstrações de
fraqueza ou desânimo, disciplinado em tudo o que fazia. Amor ao
conhecimento, à lei moral, ao cuidado com o corpo para ter saúde e
sempre poder trabalhar. Para todos que te conheciam, eras exemplo
maior de pai, irmão, avô, amigo e servidor público. Aposentado,
passou a ser jardineiro, motorista, cuidador dos netos e, acima de
tudo, sempre foste “meu amigo de fé meu irmão camarada”. Desde
que paraste de conversar, sinto uma saudade eterna de tuas
palavras. O que acontece em momentos de despedida como este é
mais uma amostra do que tu sempre me ensinaste: “As leis da
natureza são implacáveis, minha filha”. Por isso mesmo, ensinaste-
me a ser guerreira, a ver sempre o lado bom do outro e da vida; a
aprender em todas as situações por mais adversas que fossem. Não
será possível tomar contigo uma cerveja bem gelada para
comemorar o término do meu doutorado, conquista esta que dedico
a ti. Não é possível! Partiste, mas lembrarei eternamente que foi
contigo que aprendi a amar o conhecimento e a não reclamar de
nada que não é possível mudar, como a morte física, por exemplo.
Desculpe-me, pai! A tua ausência é insuportável, estou lutando com
todas as forças para compreender que tu és imortal só para quem te
ama. Para a natureza, eras só mais um que, inexoravelmente, por
ser contingente criado e dependente, não estarias
sempre no mesmo estado.
Amare te usqüe in sempiternum!
Além do meu pai, dedico também esta tese ao
Adriano, ao Anchieta, à Paula e à Roberta.
Vocês foram muito respeitosos quanto
ao limite dos meus estudos.
Compreenderam o meu afastamento físico,
torceram e fizeram o impossível para apoiar
minha ausência. Por me conhecerem bem, sabem
que este é meu mundo, meu prazer, minha
realização depois de vocês.
Quanto a você Marco, tudo o que eu disser
sobre sua dedicação será insignificante
diante do que você fez, faz e fará
para que eu consiga alcançar os meus
objetivos de vida.
Por último, mas em igual importância, agradeço
ao Tatá, ego auxiliar que se tornou companheiro
em todas as horas nesses
últimos três anos, incluindo
madrugadas indagativas e reflexivas acerca do
comportamento, valores e invenções
do ser homem.
AGRADECIMENTOS
Ao amigo que dedica o tempo, de que não dispõe, a fazer pacientemente com que eu entenda
o que li, que diz a verdade que dói, mas que me salva do erro, que me acompanha
incondicionalmente desde que adentrei ao stricto sensu e que, certamente, continuará ao meu
lado nas novas jornadas que virão.
Ao professor Marcelo Perine, pela orientação que me conferiu tempo para reflexão e
amadurecimento durante esses anos de elaboração desta pesquisa.
Agradeço aos professores com quem convivi na fase dos créditos, além do meu orientador, os
professores Jeanne Marie Gagnebin de Bons e Peter Pál Pelbart, por nos fazer entender que o
conhecimento é um caminhar ziguezagueante em direção à certeza de que não chegaremos ao
fim.
À Pontifícia Universidade Católica de São Paulo pela acolhida, em especial, ao Departamento
de Filosofia pelo apoio durante minha estadia como aluna nessa instituição.
À banca de qualificação e à banca de defesa, pelo exemplo de dedicação ao magistério
quando aceitaram participar desse processo de doutoramento.
À minha mãe, Yolanda, por compreender minha ausência nos momentos mais difíceis que
passou cuidando do meu pai diuturnamente.
À minha irmã Mara, por ter sido sempre uma irmã completa em todos os sentidos.
Ao amigo Luiz Cláudio, por entender e corrigir tão bem as falhas da máquina de alta
complexidade que nos possibilita a racionalidade.
À Marina, sobrinha e amiga predileta de todo o sempre, por ser meu pequeno grande exemplo
de amor ao conhecimento.
Aos meus alunos, que demonstram vontade e determinação em seguir a senda do saber, e
creem que, por meio do conhecimento, é possível tirar o Brasil do considerável atraso
educacional em que ainda se encontra diante do cenário internacional.
Uma menção especial aos colegas Fred, João, Luiz Henrique, Ruy, Pedro de Santi, Cleber,
Geraldo Adriano, Berti, Joca, Silvana, Mota, Saito, Poli, Arnaldo, Ângela, Sandra, Rose,
Ágatha, Sérgio, Orestes, Cláudia, Clarissa, Wolney, Alberto, Adilson, Demétrius, Rodrigo,
Muneratti, Cristina Helena, Denise e Martha, que propiciam momentos de descontração antes
das aulas, nos intervalos e almoços na ESPM-SP.
Certeza
Se antes do tempo de Copérnico tivésseis perguntado à
terra inteira: “O Sol nasceu? Pôs-se hoje?,
todos os homens vos teriam respondido:
Temos certeza absoluta disso”.
Tinham a certeza e laboravam em um erro.
Os sortilégios, as adivinhações, as obsessões foram durante tempos
sem conta a coisa mais certa deste mundo aos olhos do povo.
Que multidão inumerável de pessoas não viram tanta coisa bela, e
estavam certíssimas de as ter visto!
Hoje em dia, já esta certeza é menos firme.
Voltaire, 1764.
RESUMO
Esta tese faz uma releitura do conceito de técnica em Hans Jonas buscando expandir sua
avaliação como o telos predominante da sociedade contemporânea, isto é, que a técnica
deixou de ser instrumento e passou a ser entendida como finalidade humana em um mundo
cada vez mais tecnológico. O objetivo é pensá-la como uma prática, à luz dos aportes
conceituais de Alasdair MacIntyre, na qual a dimensão ética é uma característica fundamental,
já que toda prática – como atividade socialmente desenvolvida e organizada – possui
uma estrutura teleológica e, por conseguinte, conceitos de virtude e de um bem humano como
excelência maior. Assim, pode-se atingir um plano de reflexão distinto de Jonas e, deste
modo, com a contribuição de MacIntyre, superar as dificuldades parciais do pensamento
jonasiano no tocante à compreensão da tecnociência, ainda vinculada a uma visão
instrumentalista. Para tanto, acreditamos ser necessário identificar, aclarar, compreender e
refletir sobre a tecnociência como ela se faz em toda sua complexidade, os benefícios que
suprem as necessidades humanas, sem deixar de lembrar a necessidade de vê-la não mais
como um instrumento neutro, mas como prática no sentido dado por MacIntyre, portadora de
uma dimensão ética que lhe é iniludível. Procurou-se apresentar elementos teóricos para a
compreensão da evolução e das transformações conceituais nos domínios da técnica até
transformar-se em tecnociência, visando fornecer elementos conceituais para defender uma
interpretação crítica dos principais problemas e desafios de ordem ética, colocados pela
emergência da sociedade tecnocientífica do século XXI. Além dos filósofos citados, discute-
se também algumas contribuições de autores contemporâneos que estudam questões
pertinentes à nossa reflexão sobre o uso da tecnociência no tocante ao poder da salvar e
destruir que esta possui.
Palavras-chave: Hans Jonas. Alasdair MacIntyre. Tecnociência. Ética.
ABSTRACT
This thesis revisits the concept of technical in Hans Jonas by looking to expand its evaluation
as the dominant telos of contemporary society, that is, that technique is no longer a mere
instrument and has increasingly become a human end in a technological world. The aim is to
think of technique as a practice, in light of the conceptual contributions of Alasdair
MacIntyre, in which the ethical dimension is a key feature, since every practice – as a socially
developed and organized activity – has a teleological structure, and consequently mobilizes
concepts of virtue and also of a greater human good as excellence. Thus, it is possible to
achieve a distinct perspective from Jonas’s, with the contribution of MacIntyre, to overcome
partial difficulties of the Jonasian thought regarding his understanding of technoscience,
which it seems to be still connected to the instrumentalist vision. Therefore, it is necessary to
identify, clarify, understand, and reflect on technoscience in all its complexity, the benefits
that supply many human needs, while remembering the need of seeing it not as a neutral
instrument, but as a practice in the MacIntyrian sense, which it means that carries on an
inescapable ethical dimension. Theoretical elements were sought to provide evidence for
understanding the evolution and conceptual transformations in the fields of technical until
becoming technoscience, in order to provide conceptual elements to make a case for a critical
interpretation of the main ethical problems and challenges posed by the emergence of
technoscientific society in the XXI century. Besides the philosophers mentioned above, some
other contributions are discussed from authors who study contemporary issues relevant
concerning the use of technoscience and its power of saving and destroying.
Keywords: Hans Jonas. Alasdair MacIntyre. Technoscience. Ethics.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................................11
CAPÍTULO – I DA TECNHÉ À TECNOLOGIA: DO CONHECER PARA O
DOMINAR............................................................................................................................30
1.1 A COMPREENSÃO CLÁSSICA DA TÉCNICA........................................................................30
1.2 O ESCLARECIMENTO/ILUMINISMO E A RACIONALIDADE TÉCNICA..........................44
1.3 A TECNOCIÊNCIA NO SÉCULO XXI......................................................................................51
1.4 DIÁLOGO TECNOCIÊNCIA E SOCIEDADE...........................................................................56
1.5 SEGURANÇA E RISCO FRENTE ÀS POSSIBILIDADES OFERECIDAS PELA
TECNOCIÊNCIA CONTEMPORÂNEA.....................................................................................59
1.6 ACELERAÇÃO DA CONTINGÊNCIA: RISCO E AVANÇOS.................................................67
1.7 DA ESFERA DO CONHECER À ESFERA DO DOMINAR: TENTANDO RESGATAR A
DIMENSÃO ÉTICA NO SÉCULO XXI......................................................................................69
CAPÍTULO II – A PROBLEMÁTICA DA TÉCNICA CONTEMPORÂNEA E A CRÍTICA
ÀTRADIÇÃO ÉTICA EM HANS JONAS......................................................................................78
2.1 A TECNOCIÊNCIA E A TRANSFORMAÇÃO DO AGIR HUMANO......................................78
2.2 DA METAFÍSICA AO NIILISMO: O CONFRONTO NA VISÃO DE JONAS .........................90
2.3 O NOVUM NA ÉTICA JONASIANA...........................................................................................99
2.4 A HEURÍSTICA DO TEMOR VERSUS UTOPIAS TECNOLÓGICAS.....................................117
2.5 JONAS E A “UTOPIA DO PROGRESSO”.................................................................................127
CAPÍTULO III – ALASDAIR MACINTYRE E O CONCEITO DE PRÁTICA.......................134
3.1 O EU EMOTIVISTA E A CRISE MORAL DA MODERNIDADE............................................134
3.2 O FRACASSO DO PROJETO ILUMINISTA..............................................................................145
3.3 O EMOTIVISMO E AS CIÊNCIAS SOCIAIS.............................................................................157
3.4 QUAL DIREÇÃO A SEGUIR: ARISTÓTELES OU NIETZSCHE?...........................................160
3.5 O CONCEITO DE PRÁTICA EM MACINTYRE........................................................................176
3.6 VIRTUDES, TRADIÇÃO E A UNIDADE NARRATIVA DA VIDA HUMANA......................180
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