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Universidade Federal de Minas Gerais
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Ronaldo Tâdêu Pena
Vice-Reitora
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Editora UFMG
Diretor
Wander Melo Miranda
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Silvana Cóser BEATRTZ SARLO
Conselho Editorial
Wander Melo Miranda (presidente)
Carlos Antônio Leite Brandão Tempc passado
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)uarez Rocha Guimarães
Maria das Graças Santa Bárbara-
Maria Helena Damasceno e Silva Megale Cultura da memória guinada subjetiva
e
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Silvana Cóser
Tiadução
Rosa Freire d'Aguiar
Editora UFÀ4G
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Carnpus Parrpuiha -,trz7o-9or - Belo HorizontelMG *@b_
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CoNrpa NrÌlrA Das
Copyright @ 2005 by Beatriz Sarlo
Sumário
Tiempo pasado h a sido publicado oiginalmente en espafiol en zoo5. Estatraducción espublí-
cada mediante acuerdo con siglo xxl Edinres Argentina [Tempo passado foi pubÌicado ori-
ginalrnente em espanhol em zoo5. Esta traduFo épubÌicada mediante acordo com sigÌo xxr
Editores Árgentinal.
Título original
Tiempo pasado - Cultura de Ia memoria y giro subjetivo. Una discusión
Capa
Rar:I Loureiro
, lmagemdampa
Fanfare (1974), de George Dannatt, guache e lápis sobre acrílico.
@ Coleção particulari The Bridgeman Art Library
Prepataçã.o
Marcos Luiz Fernandes
Revisão
Carmen S. da Costa
Isabel jorge Cury
1. Tempo passado,9
Dados Internacionais de CatalogaFo na Pubüação (crr)
(Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil) 2. Crítica do testemunho : suj eito e experiência, 23
Sallo, Beâtriz 3. A retórica testemunhal, 45
traduTçcãmo pRo opsaa sFardcoir c: cdu'Altugruai adra -m mSóãori aP acu glou i:n aCdoa mspubajúetiiav a d/â sB Lãeïitirïa sSi aBrleol o; 4. Experiência e argumentação, 69
Horizonte, : UFMG, 2007, 5. Pós-memória, reconstituições, 9o
TÍtuJo original: Ticmpo pasado, 6. Além da experiência, rr4
jsBN 978-85-359-0981-4 (Companhia das Lctras)
rsBN 978-85-7041-583-7 (Ed. UFMG)
l. ÁÌgentina - Condições sociais - 1945-1983 2.,Argentina - Condiçôo Notas, rzr
sociais - 1983 - 3. MçmóÌia - Aspectos sociais - Ar8eDtina 4. Terrorismo de
Estado - ÁÌgentina - Historiografia 5. Vítim4 dc terorismo de fstado -
Argentina . Hisroriografia.
07-1046 cDD.982
Índicc para crtálogo sistemáticoi
1. I História social 982
^rgcDtina
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( ìuerra Mundial até o presente, a memória ganhou um estatuto A retóríca testemunhal
3"
ilrcfutável. É certo que a memória pode seÍ ì-rm impulso moral da
iristória e também urna de suas fontes, mas esses dois traços não
srrportam a exigência de uma verdade mais indiscutível que aque-
las clue é possível construir com - e a partir de - outros discur-
sos. Não se deve basear na memória uma epistemologia ingênua
cujas pretensões seriam rejeitadas em qualquer outro caso.tt Não
Iii'r ccluivaiência entre o direíto de lembrar e a afirmação de uma
vcrclacìe da lernbrança;tampouco o dever de memória obriga a
rrccitar esszr equivalência. Ao contrário, grandes linhas do pensa-
llrcnto clo século xx se permitiram desconfiar de um discurso da
memória exercido como construção de verdade do sujeito. E a arte,
quando não procura mimetizar os discursos sobre memória ela-
lrorados na academia, coÍÌo acontece com certas estéticas da
nlonumentalização e contramonumentalização do Holocâusto,Ìe Quando acabaram as ditaduras do sul da América Latina,
cleilonstrou que a exploração não está contida apenas dentro dos lembrar foi uma atividade de restauração dos laços sociais e comu-
limites da mernóriar rnas que outras operaçÕes, de distanciamento nitários perdidos no exílio ou destruídos peÌa violência de Estado.
ou recuperação estética da dimensão biográfica, são possíveis. Tornaram a paiavra as vítimas e seus ïepresentantes (quer dizer,
seus narradores: desde o início, nos anos 1970, os antropólogos ou
ideólogos que representaíam histórias como as de Rigoberta
Menctrú ou de Domitila;rnais tarde, os jornaiistas).
Em meados da déca<ia de 1980, na cena européia, especial-
mente alemã, começou a se escrever um novo capítulo, clecisivo,
sobre o Hoiocausto. De um lado, o debate dos historiadores ale-
mães sobre a solução füral e o papel ativo do Estaclo alemão nas
políticas de reparaçãa e na monumentalização do Holocausto; de
outÍo, a grande difusão dos textos luminosos de Primo Levi, em
que seria difíciÌ encontrar alguma afirrnação do saber do sujeito
no Lager; rnais tarde, as ieituras de Giorgio Agamben, em qlre
tampouco é possívei encontÍar uma positividade otimista; o Íìlme
Shoahde Claude l-attzmann, que plopôs um novo tratamento do
testemunho e renunciou, ao lTlesmo tempo, à imagem dos cam-
44 45
sÍl:
Ì
I
ppoosï doeu tcroon, cfeonrtçraaçnãdoo, po rdiviascnudros-os ed, opso sr oubmre lvaivdeon, tdees .i cAo nmogernaçfãiao ea, oim spigunlsoo d od aNs utrnacnas imçõaeiss. *democráticas, que na Argentina se fez sob
acontecimentos poderia prosseguir.' Todos acompanharam pro_ o choque da violência de Estado jamais pareceu um obstácu-
cessos nem sempre surpreendentes do ponto de vista intelectual, lo para construir e escutar a narração da experiência sofrida. A
mas de grande repercussão na esfera pública; o tema ocupou um novidade dessa experiência, tão forte como a novidade dos fatos da
iugar muito visível e, na prática, produziu uma nova esfera de Primeira Guerra Mundial a que se referia Benjamin, não impediu
debate. Num desses acasos que potenci arizamfatos significativos a proliferação de discursos. As ditaduras representaram, no senti_
e não podem ser ignorados, as transições democráticas no sul da do mais forte, uma ruptuïa de épocas (como a Grande Guerra);
América coincidiram com um novo impulso da produção inte_ mas as transições democráticas não emudecerarn por causa da
lectual e da discussão ideológica européia., os dois debates se enormidade desse rompimento. pelo contrário, quando despon-
entrelaçaram de modo inevitável, em especial porque o Holo- taram as condições da transição, os discursos começaram a circu-
causto se oferece como modelo de outros crimes e isso é aceito por lar e demonstraram ser indispensáveis para arestauraçã"o de uma
quem está mais preocupado em denunciar a enormidade do ter_ esfera pública de direitos.
rorismo de Estado do que ãm definir seus traços nacionais espe_ A memória é um bem comum, urn dever (como se disse no
cíficos. caso europeu) e uma necessidade jurídica,moral e política. Aiém
os crimes das ditaduras foram exibidos em meio a um flores- da aceitação dessas características, é bem crifïcil estaberecer uma
cimento de discursos testemunhais, sobrçtudo porque os julga- perspectiva que se proponha examinar de modo crítico a narração
mentos dos responsáveis (como no caso a-rgentino) exigiram que das vítimas. se o núcieo de sua'erdade derre sel inquestionáver,
muitasvítimas dessem seutestemunho comoprovado quetinham tarnbém seu discurso deveria ser proiegido do ceiicismo e da críti
sofrido e do que sabiam que outros sofreru- até morrer. No âmbi- ca' A confiança nos testemunhos das vítimas é necessária para a ins-
to judicial e nos meios de comunic acão,aindispensáveÌ narração talação de regimes democráticos e o enraizamento de um princípio
dos fatos não foi recebida com desconfiançasobre as possibilida- de reparação e justiça. pois bem, esses discursos testemunhais,
des de reconstruir o passado, salvo pelos crirninosos e seus repre_ sejam quais forem, são discursos e não deveriam ficar confinados
sentantes, que atacaram o valor probatório das narrações testemu- nurna cristalização inabordáver. sobretudo porque, ern pararero e
nhais, quando não as acusaram de ser falsas e encobrir os crimes da construindo sentidos com os testemunhos sobre os crimes das dita-
guerrilha' se se excluem os culpados, ninguém (fora da esfe ra judi- duras, emergem outros fios de narracões que não estão protegidas
ciária) pensou em submeter a escrutínio metodológico o testernu_ pela mesma intangibilidade nem peio direito dos que sofreram.
nho em primeira pessoa das vítimas. Sem dúvld a, teriaalgo de Em outras palavras: durante cefto tempo (hoje não sabemos
monstruoso aplicar a esses discursos os princípios de dúvida *E*
metodológica que expusemos mais acima: as vítirnas falavam pela 1983-4, no governo do presidente Raúl Alfo'sín, foi criada a comissão
tprrainmsefoirram vaevza e eom q "ume actoénrtiaav-apmrim naã',o dsaó ilnhdeisg ndaizçiaã or ees ptaeimtob, érnma se mse jSNualagbcaaimotone.a nOl tsos ordebosresu ltmoa diDÌoitesas raedpsa a dcraoe mcdimiistasedãnuot,or a p.d ue(bN lpi.ce fas.sd)ooass , npor elisvirdoid aN npnecÌao emsácsri,tloerv aErarnme satoo
+6
A7
iiliHll",
qLra'to)' pelo fato de denunciar o horror, o discurso sobre os crimes que presente se rememora e qual é o passado que se recupera. O
tcm preïrogativas, justamente por comportar um víncuÌo entre hor- presente da enunciação é o "tempo de base do discurso", porque é
ror e humanidade. outras narrações, inclusive as pronunciadas pelas presente o momento de se começar anarraÍ e esse momento fica
vítimas ou por seus representantes, que se inscrevem num tempo inscrito na narração. Isso implica o narrador em sua história e a
runterior ao dos crirnes (no caso argentino, o final dos anos 1960 e o inscreve numa retórica da persuasão (o discurso pertence ao
início dos 1970) e costumam p areceÍ entrelaçadas, seja porque pro- modo persuasivo, diz Riceur). Cs relatos testemunhais são "dis-
vêrn do mesmo narrador, seja porque se sucedem umas às outras, não curso" nesse sentido, porque têm como condição um narrador
tôrn as [Ìesmas prerrogativas e) na tarefa de reconstìtuir a época implicado nos fatos, que não persegue uma verdade externa no
crrclausurada pelas ditaduras, podem ser submetidas a crítica. momeitto em que ela é enunciada. É inevitável a rnarca do presen-
Além disso, se as narrações testemunhais são a fonte principai te no ato de narrar o passado, justamente porque, no discurso, o
rl..saber sobre os crimes das ditaduras, os testeffÌunhos dos miii- presente tem uÍna hegernonia reconhecida como inevitável e os
lrr'tes, intelectuais, políticos, religiosos ou sindicalistas das déca- tempos verbais do passado não ficam livres de uma "experiência
rl;rs anteriores não são a única fonte de conhecimento; só uma feti- fenomenológica" do tempo presente da enunciação., "O presente
r lr iz.ação da verdade testemunhal poderia outorgar-lhes um peso dirige o passado assim como um maestro, seus músicos", escreveu
riul)()l'ior ao de outros documentos, inclusive os testemunhos con- Italo Svevo. E, corno observava Halbwachs, o passado se distorce
lcr,porâneos aos fatos dos anos tr960 e 1970. só urna confiança para introduzir-se coerência.'
ingônua na plimeira pessoa e na lembrança do vivido preten{eria Estendendo as noções de Ricoeur, pode-se dizer que a hegerno-
estabelecer uma ordem presidida peio testemunhal. E só uma nia do presente sobre o passado no discurso é da ordem da erlperiên-
caracterização ingênua da experiência exigiria para ela uma verda- cia e se apóia, no caso do testernunho, na mernória e na subjetivida-
clc mais alta. Não é rnenos positivista.(no sentido em que Ben- de. A rememoração do passado (que Benjamin propunha como a
.jrr rrrìrr usou essa paiavra para cayacterizar os "fatos") a intangibili- írnica perspectiva de uma história que não reificassse seu objeto) não
clrcle da experiência vivicla na nawaçãa testeinunhal do que a de é urna escolha, mas uma condição para o discurso, que não escapa da
luür relato feito a partir de outras fontes. E, se não submetemos memória nem pode iir,r'ar-se das premissas impostas pela atualidade
todas as narrações sobre os criines das ditaduras ao escrutínio à enunciação. E, mais que uma liber-taçao dos "fatos" coisificados,
ideoiógico, nãohárazãa rnorai para ignorar esse exarne quando se corno Benjamin desejava, é uma ligação, provavelmente inevitável,
trata ctras narrações sobre os anos que as precederam ou sobre fatos do passado com a subjetividade que rememora no presente.
alheios aos da repressão, que trhes foram conternporâneos. As narrações da memória também insinuam outros proble-
mas. Riceur assinala que é errado confial na idéia de que a narra-
ção possa preencher o vazio da explicação/compreensão: "Criou-se
IJMA uropla: t{Ão ESeUECER N,{D,â tima alternativa faisa quefazda narratividade tanto um obstáculo
como uiïì substituto d aexplicação'i'Há riois tipos de inteligibilida-
Paul Riccur se irergunta, no estuctro qrie dedica às diferenças de: a narrativ ae aexplicativa (causal). A primeira está apoiada num
já clássicas entre história e dlscurso, en' que presente se narra, em efei'co de "coesão", que provém da coesão atribuída a urna rrida e ao
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sujeito que a enuncia como sua. Vezzetti assinalou que a memória O discurso da memória, transformado em testemunho, tem a
Íecorre preponderantemente ou sempre a formas narrativas, cujas ambição da autodefesa; quer persuadir o interlocutor presente e
representações "ficam necessariamente estilizadas e simplifica- assegurar-se uma posição no futuro; justamente por isso também é
das".6 Naturalmente, a estilização unifica etraçauma linha argu- atribuído a ele um efeito reparador da subjetividade. É esse aspecto
mental forte, mas também instala o relato num horizonte em que que salientam as apologias do testemunho como "cura" de identi-
tem raízes a ilusão de evitar a dispersão do sentido. dades em perigo. De fato, tanto a atribuição de um sentido único à
Da perspectiva da disciplina histórica, em compensação, jár história como a acumulação de detalhes produzem um moclo rea-
não se pretende reconduzir os acontecimentos a uma origem; ao lista-romântico em que o sujeito que narra atribui sentidos a todo
rdnunciar a uma teleologia simples, a história renuncia, ao mesmo detalhe pelo próprio fato de que eie o incluiu em seu relato; e, em
tempo, a um único princípio de inteligibiÌidade forte e, sobretudo, contrapartida, não se crê obrigado a atribuir sentidos nem a expli-
apropriado à intervenção na esfera pública, em que os velhos dis- car as ausências, como acontece no caso da história. O primado do
cursos de uma história com argumentos nítidos prevalecem sobre detalhe é um modo realista-romântico de fortalecimento da credi-
as perspectivas monográfìcas da história acadêmica. Justamente o bilidade do narrador e da veracidade de sua na rração.
discurso da memória e as.rÍarrações em primeira pessoa se movem Ao contrário, a disciplina histórica se localiza longe da utopia
pelo impulso de bloquear os sentidos que escapam; não só eles se de que sua narração pode incluir tudo. Opera com elipses, por
articulam contïa o esquecimento, mas também lutam por um sig- motivos rrretodológicos e expositivos. Sobre essa questão, Riceur
nificado que unifique a interpretação. estabeleceu uma diferença entre "individual" e "específìco" (que
No limite está a utopia de um relatõacompleto", do qual nada lembra a defìnição lukacsiana de tipo):"paui Veyne desenvolve o
reste do lado de fora. A tendência ao detaJhe e ao-acúmulo de pre- aparente paradoxo de que a história não tem como objeto o indi-
cisões cria a ilusão de que o concreto da experiência passada ficou víduo, mas o específico.A noção de intriga nos afasta de toda defe-
capturado no discurso. Muito mais que a história, o d.iscurso é con- sa da história como urna ciência do concreto. Incluir um elemen-
creto e pormenorizado, por causa de sua ancoragem na experiên- to em uma intriga irnplica enunciar algo inteligível e, por
cíarecuperada a partir do singular. O testemunho é insepar âvelda conseguinte, específico:'Tüdo o que se pode enunciar sobre um
autodesignação do sujeito que testemunha porque ele esteve ali indivíduo possui uma espécie de generaliclade"'.0 C específico his-
onde os fatos (lhe) aconteceram. É indivisível de sua presença no tórico é o que pode compor a intriga, não como simples detalhe
local do fato e tem a opacidade de uma história pessoal "afundada verossímil, rnas como traço signifìcativo;não é uma expansão des-
em outras histórias".'Por isso é admissível a desconfiança; nìas, âo critiva da intriga, mas urn elemento constitutirro submetido à sua
mesmo tempo, o testemunho é uma instituição da sociedade, que Ìógica. O princípio da elipse, confrontado com a idéia ingênua de
tem a ver com a esfera jurídica e com um laço social de confiança, que todo o narrável é importante, governa o específico porque,
como apontouArendt. Quando o testemunlao narra a morte ou a como acontece na literatura, a elipse é uma das iógicas de sentido
vexação extrema, esse laço estabelece tambérn uma cena para o de um relato.
luto, fundando assim Ìima comunidade ali onde ela foi destruída.'
5o
51
,,uú&.*,
( } M ()I)0 I].EALISTA-ROMÂNTICO
acaso, The linle school começa com o relato da captura de partnoy
tios rc( s)ittocsi Sduas hains tSóorinat aég pnreoc cisoom ecçoon.f iSaur am aednvoesr tnêan cmiae dmeó qruiae ed imanaties lmcivoernod,ti aaodduoatr oep moter r ttueomr cee mpir ratien ïpcceeípsirsiaoo apd,e esd sdeoia sm tvâoanldeco ica o.q muEeo, quaum aidasee e nsntpiaféi ccmiaeeç tdãaeod c eos redtjeoa
rr;ts opcrarções intelectuais, compreender tanto ou mais que lem-
lrrrr', corresponde à de Annette Wieviorka, quando afirma que no movimento de identificação autobiográfica; a terceira pessoa é
vivcrnos "[...] uma época em que, de modo geral, o relato indivi- um compÍomisso com o específico da situação e não simplesmen_
te com o que ela tem de individuaÌ. A primeira frase é: "Naquere
tltral c a opinião pessoal ocupam muitas vezes o lugar da análise',.t' meio-dia ela estava calçando os chinelos do marido'Ì Esse mundo
cxplicSaet ievsas e déa o intotrmig ada, qéupeo)c ap,a irma pdoarrt aa lsgaulimenat ainr tae lpigoitbeinlicdiaaldìdea de familiar concreto se quebra com as batidas à porta; chegam os
- seqüestradores" No primeiro capítulo, a presa_desaparecida,
I)oucoírnportaquãoproblernática fatosreconstituídos,
rclsctvric n ron adnettearlh ue.m M caosn, tsreo nleã os oéb sreu bom deettiadloh eà. cSríetimca d, úov dideata, rah vee ardfeatdaea dreacsé qmue-t raa inmspfeerdideam pdaera v e"ar, Eusmcaol imnhaan,c] hi dae naztiufilc eag, optaosr bdea isxaon dgause v: esnã_o
as caiças de seu marido' Nada mais, a não ser a decisão de registrar
ri nnitlr imgaa sp onãr os unae acebsusnadrâianmceiãn tree avliestrad,a disetoir oé., pAo pr rsoeluif earsapçeãcoto dvoe rdoestsaí-- tudo (olhando de soslaio, pâra o chão, pela fenda do purro q* rupu
lhe i'dividual fecha ilusoriamente as fendas da intriga e a apresen- stleeu ssc ohlohool ss)e' "n ePgelaam re ap ecrtiiçaãr ou dmo cinosnigjunniftio c adnet er,e porse dseetnatlahçeãso d. ep Tahrten toity-
tcao mcopmleoto see ceolan spiusdteensstee poourq dueev eos sdee rteJp[ere soe cnetartri fiucma, tsoedmo ,t earl gdoe poes raterïnucmema saa buemnado e xqpueer isêãnoc mia umitou tiplaoduaco ps eela m imuiotob ipliodbardees , ppeorrmqau_e
vmeordsatrdaer ísnutiam nae cdeos sriedlaadtoe:. oÁ lnéarnrr addisosro ,q uoe d leetranbhreaã dfoe rmçao doo teoxmau dse- nente e pela oclusão do visíver. o detalhe insignificante e repetido
se adapta melhor que a proliferação ao que ela relata.
tivo seria incapaz de passar por alto o importante, nem forçá-Ìo,
Nenhuma soma de detalhes consegue evitar que uma história
pclhloueiess eodle eq vvueieum nc aaprmarar oe sfc operrrró npfoarulisa osus mo, lp hdooesrsq.vNuãuoem po e tesesfseotieatoml dudene sh vuoea, rvdjaidamad,ae i es d soeãspo edfanetdtoaes- tdÍoìeq susaeepm arepresrectri diftioacs a à sdi niizncetoernmrr oipsgsleaotç odõe ee sd q ivqueuere sd areshv eme dmaen rceaoimran stoi:n rsiugeaenrmt eaü. ìco oqsnu fseirt rhouo írs_e lroda.e-
rlc'les, inclusive de sua acumulação e repetição.rÌ
À4uitos relatos testemunhais são ercessivamente detalhadas, Isso tem uma dimensão dramática e jurídica que expressa a minu_
ciosa destruição dos vestígios levada a cabo peros responsáveis por
até proÌír'èrativos e alheios a qualquer pr-incípio cornpositivo; isso é desaparecimentos.
bern claro no caso dos desaparecidos argentiiros, chilenos e uru-
ég ucaoionstr, oel addeo s epuesl afa irdnéiliiaa rdees .u hm4aas rheáp raelgseunnsta çteãxoto rse setmrit aq udea os idtueataçiãhoe não éE smó ao udtoro psa ci aosuo sd, aq umaãned oa sas ahsisstinóaridao sq,u qeu saen dcelos eoja qrueec osen bsutistucair
Pcaerncseorá erirar ' eT,hp.oe rl itctolen ssecghuoinotl,e ,d ab eamrg ernnatiisn alim Aitliacdiaa Fàsa srtunaos yc.o Nndãioçõ peos.r teinntoe nddoe rc onrãpoo é, tqaunaton doo l uagsa pr roeute anss cõiercsu dnas tânnacrriaasc ãdoa umltor.ratpea es soa dmes a-
busca de uma lesposta à uergunta sobre as condições em que se
))
exerceu a violência de Estado e visam incluir a paisagem cultural e estabelecido de antemão, os detalhes se acomodam nessa direção,
política anterior às intervenções militares, ficam bem evidentes as mesmo quando os próprios protagonistas custam a percebê-la. Os
fraquezas de uma memória que lembra uma profusão de detalhes traços, peculiaridades, defeitos menores e manias dos personagens
não significativos, uma memória qÌre, como não podia deixar de do testemunho acabam se organizando em algum tipo de necessi-
ser, ora entende e ora não entende aquilo mesmo que ela reconsti- dade inscrita além deles. O modo a que chamei de realista-român-
tui. É nesse momento que a ilusão de uma representação comple- tico se adapta bem a essas características da narração testemunhal
ta produz disquisições narrativas e descritivas, digressões e desvios que, justamente por estarem respaldadas por uma subjetividade
çujo motivo é apenas o fato de ter acontecido com o narrador ou que narra sua experiência, dão a impressão de colocá-la além do
com o sujeito que ele evoca. E, então, a proliferação multiplica os exame.
fios de um relato testemunhal sem encontrar arazão argumenta- A qualidade romântica tem a ver com duas características. A
tiva ou estética que sustente sua trama. Esse é o caso do livro de primeira, evidentemente, é o fato de centrar-se na primeira pessoa,
Cristina Zuker) que tem como objeto a vida de seu irmão Ricardo, ou numa terceira pessoa apresentada pelo discurso indireto livre,
militante montonero, desaparecido na fracassada contra-ofensiva que confere ao narrador a perspectiva de uma primeira pessoa. O
iniciada em 1979. O subtítulo Una saga familiar ê especialmente narrador confia na representação de uma subjetividade e, com fre-
apropriado à missão reconstitutiva, que começa com os avós qüência, em sua expressão efusiva e sentimental, que rernete a um
maternos e paternos dos dois irmãos, sua infância, a relação com horizonte narrativo identificável com o "toque de cor" do jornalis-
os pais, a relação entre os pais, os conflLtos psicológicos de urna mo, algumas formas do non fiction olr os maus romances (sou
família, as preferências cotidianas, tudo isso conlo-um preâmbulo consciente de que o adjetivo mattsdesperta certa inquietação rela-
que se imagina necessário (como se se tratasse de um romance Íea- tivista, mas gostaria que se admitisse a existência de rornances a
lista) antes de entrar nos anos 1970; e,uté *.t*o nesses anos, os que se pode aplicar o adjetivo).
detalhes da vida farniÌiar, as crianças, o destino dos filhos de desa- Em segundo lugar, os textos <ie inspiração memorialística
parecidos ou combatentes ocupam posições importantes no rela- produzidos sobre as décadas de 1960 e1970 se referem àjuventu-
to, que, assim, se sustenta numa dimensão afetiva de rememora- de de seus protagonistas e narradores. Não se trata de r.lm simpies
ção. Restrita à idéia realista do romance, Zuker escreve um capítulo dado demográfico (a metade dos mortos e desaparecidos argenti-
final em que, como em Dickens, se acompanha o destino dos per- nos tinha menos de 25 anos), mas antes da crença em que certa
sonagens) em alguns casos até a morte, apresentada como emble- etapa de uma gigantesca mobilização revolucionária se desenvol-
mâlrcado que sofreram em vida, seÍn esses esclarecimentos finais veu sob o signo inaugural e iminente c1a juventude. Desde os anos
terem uma razão compositiva que os ligue à história central, que, da ditadura argentina, as organizações de direitos humanos, espe-
de toda maneira, foi se bifurcando em um testernunho da autora cialmente as Mães e mais tarde as Avós, falaram de "nossos fìlhos",
sobre a relação com seu irmão e muitas outras coisas.rl fixando numa palavra de ordem um argumento poderoso: sacrifi-
Entre detalhe individual e relato ieleológico há uma rclação cados ern plena juventude, justamente porque correspondiam a
óbvia, embora nem sempÍe visível. Se a história tern um sentido uma imagem da juventude que coincide com o senso comulïì -
54 55
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,' /l;tì(' sl;PÌ ('cr'rdain'dreoÌ rotos ,f ìlíhmopse dtoe,s siedse amrisilimtaon. teAs qmuaorridtoasd eo uju dveesnaiÌp aér eecnifdaotsi- o presente em que estão respondendo; o mesmo acontece com os
rlrrPlic:irr' o efeito de juventude, destacando que eres são, na atua- sobreviventes dos campos de concentração, impelidos a ir mais
litlrrrle, mais velhos que os pais no momento em que estes foram longe do que lembrariam se entregues apenas a uma rememoração
sri'rÌrtsr sos urdtséesc.iandaadso sé' aE jnutvree natsu Mdeã eess see onsc iFaill,h coosn, goe rsaudjea itnoa sd afo mtoegmraóÍìraias de ensa- npeãesoprt ooqn utdeâornesem lao .c leLamiasn bdzramorsa, cnsaunam sfp oporrçsóa pa r oilaess ma lbmdreiasõére rsioa psq oueÌe oi nnedessfqneuisde acqedureea smv i,vd eoia rqanumtee
É evidente que, para as vítimas ou seus familiares, montar dos trens que passavam com as vítimas; e também consegue obter
rr nrrarrran ehiirsat,ó ar iare éc ounms tcitaupiçíãtuol od noas bfautsocsa ndoe mumoda ov erredaardiset aq-uroe,m dâen ttoicdoa mquaeísm pleemrsbergauneç acso md os uqau ceâ mase "rea saptéo nqtuâen ealagsu,n, sd odse lesoslbhreepveivçeanmte qsu, ea
n'ãaor ratetmiv,a i név uamria vdeirlemiteon tee,' acoo nedxieçõrceês- ldoe, reemstbaourraar .s uAb psirsáttaic aa pdaesrtsea idmêp ao seinçãtroe vdisat am epmoró reian.c eTrarandtoa .n oNso asl ddeoõiess ccaosmoso, tnraotsa _ssoeb redvei vuemn_a
incompreendida do passado, e anarraçãonão consiga responder tes, embora de modos distintos, a memória é exigida além do que
às perguntas que a gerarair, a lembrança como processo subjetivo os sujeitos pensaram que ela poderia ser e além de seus interesses e
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realista sustenta que a acumulação de-pcripécias produz o saber quem dá seu testemunho, e pressionando a lembrança habitual.
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sente. Cs aldeoes ou as vítimas falam no presente e, inevitavelmen_
te, sabem rnais do que sabiam no momento dos fatos, embora tam
O QUE FOI O PRESENTE? bérn tenham esquecido ou procui-ado o esquecimento.
Essa discordância dos terïpos é inevitáveJ nas narrações tes_
escreÁve mu eFr{naólbrwiaa cér srse.m Ap rren eainnaócrriaôn nicãao:. ,éu min varerivaevleaÌdmoer ndtoe peresspeonntetâ,,-, cietrronnuinshmacis, ' eA u dmis dceip isineuas hpirsotóbrÌeicmaa tsa méb juésmta mé peenrtsee grueicdoan hpeercoê _alnoa -e
nea. No frLme Slrcah, os aÌdeões poioneses, a quem Lanzmann traçar seus limites. Todo ato cle discorrer sobre o passado tem urna
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E-
se responsablízariapor uma dívida de sofrimento com o passado, posto daquilo que um sujeito se permite ou pode lembrar, daqui-
ou seja, no momento em que a história pensa em construir uma lo que ele esquece, cala intencionalmente, modifica, inventa,
paisagem do passado diferente da que percorre, com espanto, o transfere de um tom ou gênero a outro, daquilo que seus instru-
anio de Klee, ele está indicando não só que o presente opera sobre mentos culturais lhe permitem captar do passado, que suas idéias
a construção do passado, mas que também é seu dever fazê-lo. atuais lhe indicam que deve ser enfatizadoem função de uma ação
Ó anacronismo benjaminiano tem, por um lado, uma dimen- política ou moral no presente, daquilo que ele tttfizacomo dispo-
são ética e, por outro , faz parte da polêmica contra o fetichismo sitivo retórico para argumentar, atacar ou defender-se, daquilo
documental da história científica do começo do século xx. No que conhece por experiência e pelos meios de comunicação, e que
entanto, a crítica da qualidade objetiva atribuída à reconstituição se confunde, depois de um tempo, com sua experiência etc. etc.la
dos fatos não esgota o problema da dupla inscríção temporal da A,impurezado testemunho é uma fonte inesgotável de vitali-
história. A indicação de Benjamin também poderia ser lida como dade polêmica, mas também requer que seu viés não seja esqueci-
uma lição para historiadores: olhar para o passado com os olhos de do em face do impacto da prirneira pessoa que fala por si e estarn-
quem o viveu, para poder ali captar o sofrimento e as ruínas. A pa seu nome como uma reafirmação de suaverdade' Tânto quanto
exortação seria, ness-dcaso, metodológicae, em vez de fortalecer o as de qualquer outro discurso, as pretensões de verdade do teste-
anacronismo, seria um instrumento para dissolvê-lo. munho são isto: uma exigência de prerrogativas. Se no testemunho
Essas questões de perspectiva se colocam para encarar um o anacronismo é mais inevitávetr que em qualquer outro gênero de
problema que, de toda maneira, persjstirá. Simplesmente, â histó- história, isso não obriga a aceitar o inevitável como ínexistente,
ria não pode cultivar o anacronismo por esçolha, pois se trata de queuJizegaesquecê-1o justarnente porque não é possível eliminá-
uma contingência que a golpeia sern interrupções e é sustentada io. Peio contrário: é pleciso lernbrar a qualidade anactônicaporque
por um processo de enunciação q.r., .o*o se viu, está sempre pre- é impossível elirniná-la.
sente. Mas acontece que a disciplina histórica sabe que não deve se Quando falo de anacronismo,'' ref,iro-me ao que Georges
instalar comodamente nessa dupla temporalidade de sua escrita e Didi-Huberman chama de "tiivial", que não ilumina o passaclo,
de seu objeto.Isso a distingue das narrações testemunhais, em que mas mostra os lirnites que a distância impõe para sua compreen-
o presente da enunciação é a própria condição da remernor ação: é são. Contudo, Didi-F{ubeíÌ-nan reconhece, diante da triviaiidade
suamatériatemporal,assim como o passado é aquelamatériatem- de remeter qualquer passado ao presente, uma peÍspectiva da qual
poral que se quer recaptuÍaÍ. As narrações testemunhais sentem- se descobre nos fatos pretéritos "uma assemblagede anacronismos
se confortáveis no presente porque é aattalidade (política, social, sutis, fibra.s de tempo entremeaàas, campo aÍqueolÓgico a deci-
cultural, biográfìca) q.ue possibilita sua difusão, quando não sua f,rar'1tu btresse sentido, o anacronismo nunca poderia ser totalmen-
emergência. O núc.leo do testemunho é a memória; o mesmo não te eiiminado, e só uma- visão dominada pela generalização abstra-
se poderia dizer da história (afirrnar que é precis a fazer história ia seria capaz deconseguir aplainar as textuïas temporais que não
como sese recordasse apenas abre uma hipótese). apenas aïmam o discurso damemória e da história, como tarnbém
O testernunho pode se perrnitir o anacronism o, jâqueé com- mostram de que substância ternporal heterogênea são tecidos os
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