Table Of ContentO MITO DA
NEUTRALIDADE
CIENTÍFICA .
O MITO DA NEUTRALIDADE CJENT1FICA
Copirraite © 1975 de Hilton Japiassu
Editoração
··coordenação: PEDRO PAULO DE SENA MADUREIRA
Revisão: IOS:b CARLOS CAMPANHA
Capa: PAULO DE OLIVEIRA
1975
Direitos adquir:idos por IMAGO EDITORA LT OA.
Av. N. Sra. de Copacabana, 330 - 109 andar
te!.: 255-2715, Rio de Janeiro.
lmp(esso no Brasil
Printed in Brazil
HILTON JAPIASSU
O MITO .DA
NEUTRALIDADE
'
CIENTIFICA
Série Logoteca
Direção de
JAYME SALOMÃO
Membro-Associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise do
Rio de Janeiro. Membro da Associação Psiquiátrica do Rio
de Janeiro. Membro da Sociedade de Psicoterapia Analítica
de Grupo do Rio de Janeiro.
IMAGO EDITORA LTDA
Rio de Janeiro
SUMÁRIO
Introdução 7
I - Objetividade Científica e Pressupostos Axiológicos .19
II - Ciências Humanas e Praxeología 49
III - Fundamentos Epistemológicos do Cientific~s!!lo 71
-
IV - A 'Etica do Conhecimento Objeth·o . 97
V - O Problema da 'Ciência da CiênCia' 123
VI - Papel do 'Educador da Inteligência' 145
Conclusão 165
A péndice 181
Bibliografia Sumária 181
INTRODUÇÃO
Irremediavelmente marcada pela sociedade em
que ela se insere, a ciência é portadora de todos os
seus traços e reflete todas as suas contradições, tan
to em sua organização interna quanto em suas apli
cações. Portanto, não há "crise da ciência", mas
somente aspectos específicos à ciência da crise so
cial geral.
Apresentação do livro dirigido por A. Jaubert e
Lévy-Leblond, Autocritique de la science _( 1973).
O que é a ciênciaT A questão parece banal. As respos
tas, .. porém, são complexas e difíceis. Talvez a ciência nem
possa-ser definida. Em geral, é mais conceituada do que pro-
- priamente definida. Porque "definir" um conceito consiste em
formular um problema e em mostrar as condições que o tor
naram formulável. No entanto, para os cientistas em geral, a
verdadeira definição de um conceito não é feita em termos de
"propriedades", mas de "operações" efetivas. Mesmo assim,
definições não faltam. Para o grande público, ciência é um
- conjunto de conhecimentos "puros" ou "aplicados", produzi
dos por métodos rigorosos, comprovados_. e objetivos, fazendo
nos captar a realidade de um modo distinto da maneira como
a filosofia, a arte, a política ou a mística a percebem. Segundo
essa concepção, os contornos da ciência são mal definidos. O
protótipo do conhecimento científico permanece a física, em
torno da qual se ordenam a matemática e as disciplinas bioló
gicas. A esse conjunto, opõem-se os conhecimentos aplicados
e técnicos, bem como as disciplinas chamadas de "humanas".
A verdadeira ciência seria um conhecimento independente dos
sistemas sociais e econômicos. Seria um conhecimento que, ba
seando-se no modelo fornecido pela física, se impõe corno uma
espécie de ideal absoluto.
Mas há outras definições: umas são extremamente am
plas e vagas, a ponto de identificarem "ciência" com "espe
culação"~ outras são demasiadamente restritivas, a ponto de
9
excluírem do domínio propriamente científico, senão todas, pe
lo menos boa parte das disciplinas humanas. Algumas defini
ções podem ser classificadas como "idealistas", na medida em
que insistem em reduzir a atividade científica à busca desinte
ressada do conhecimento ou da verdade; outras apresentam
se como "realistas", chegando ao ponto de identifjcarem pura
e simplesmente ciência e tecnologia. Uma coisa 110s parece
_ certa: não existe definição objetiva, nem muito menos neutra,
daquilo que é ou não a ciência. Esta tanto pode ser uma pro
cura metódica do saber, quanto um modo de interpretar a rea
lidade; tanto pode ser uma instituição, com seus grupos de
pressão, seus preconceitos, suas recompensas oficiais, quanto
um metiê subordinado a instâncias administrativas, políticas
ou ideológicas; tanto uma aventura intelectual conduzindo a
um conhecimento teórico (pesquisa),- quanto um saber rea
lizado ou tecn.ic izado.
- --
Se perguntarmos, por outro lado, sobre o modo de fun- ·
cionamento da ciência, sobre seu papel social, sobre sua ma
neira de explicar os fenômenos e de compreender o homem
no mundo, perceberemos facilmênte que as condições reais em
que ·são produzidos os conhecimentos objetivos e racionaliza
dos, estão banhadas por uma inegável atmosfera sócio~políti~
co-<:ultural. :S esse enquadramento sócio-histórico, fazendo da
ciência um pmduto humano, nosso produto, que Ieva_9s co
nhecimentos objetivos a fazerem apelo, quer queiram .quer não,
a pressupostos teóricos, filosóficos, ideológicos oa axiológicos
nem sempre explicitados. Em outros termos,. não há ciência
"pura", "autônQma': .e "neutra", com~ se fosse possível gozar
do privilégio de não se sabe que "imaculada concepção". Es
pontaneamente, somos levados a crer que o cientista é um in
divíduo cujo saber é inteiramente racional e objetivo, isento
não somente das perturbações da subjetividade pessoal, mas
também das influências sociais. Contudo, se o examinarmos
em sua atividade real, em suas condições concretas de traba
lho, constataremos que a ''Razão" científica não é imutável.
Ela muda. E histórica. Suas normas não têm garantia alguma
de invariância. Tampouco foram ditadas por alguma divfnda~
de imune ao tempo e às injunções da mudança. Trata-se de
normas historicamente condicionadas. Enquanto tais, evoluem
10