Table Of ContentDEPARTAMENTO DE HISTÓRIA MEDIEVAL,
MODERNA E CONTEMPORÂNEA
FACULDADE DE GEOGRAFIA E HISTÓRIA
INQUISIÇÃO E CRISTÃOS-NOVOS NA CIDADE DE VISEU
(PORTUGAL): morfologia, identidades e integração
sociocultural (séculos XVI-XVII)
Tese de doutoramento de
Maria Teresa Gomes Cordeiro
Direcção de
Dr. José Carlos Rueda Fernández
Salamanca, Maio de 2015
2
Tese de doutoramento apresentada por Maria
Teresa Gomes Cordeiro e dirigida por D. José Carlos
Rueda Fernández, do Departamento de História
Medieval, Moderna e Contemporânea, Faculdade de
Geografia e História, Universidade de Salamanca.
Salamanca, Maio de 2015
O Director, A Doutoranda,
___________________________ ___________________________
(D. José Carlos Rueda Fernández) (Maria Teresa Gomes Cordeiro)
3
Bah! Bah! Bah! Longe daqui, loiro fradezinho,
Não entres na casa da água
Que estão lavando suas alvas camisas
As moças de Israel, as noivas do Islão, as donzelas cristãs…
Fernando Campos, A Casa do Pó
Herege infame, torpe, vil profano
Que as imagens dos Santos abominas,
(…) Turco insolente, Mouro pertinaz
Baptizado judeu, cristão fingido.
João de Pavia, Descricam da cidade de Vizeu e suas antiguidades e couzas
notaueis que contem em sim, e seu Bispado composta por hum natural. Anno de 1638
4
Sumário
Resumo / palavras-chave ........................................................................................................... 7
Resumen / palavras clave ........................................................................................................... 8
Abstract / keywords .................................................................................................................... 9
Observações Prévias ................................................................................................................ 10
Agradecimentos ........................................................................................................................ 11
Lista de Imagens e Quadros .................................................................................................... 13
Lista de Siglas e Abreviaturas ................................................................................................. 14
Introdução .................................................................................................................................. 15
1. Antes, no tempo dos judeus ................................................................................................ 33
1.1. Judiarias, comuna e sinagoga ..................................................................................... 33
1.2. Judeus laboram na cidade e junto dela ....................................................................... 50
1.2.1. A ocupação da terra: vinha e olival ................................................................... 50
1.2.2. Os ofícios e a raia com Castela: trânsito de gente e bens ............................... 55
2. Fixação na geografia urbana................................................................................................ 59
2.1. Padrão morfológico de centro ...................................................................................... 59
3. Identidade, parentesco e outros modos de reprodução social ........................................ 84
3.1. Questões identitárias: nome, apelido e alcunha .......................................................... 84
3.2. Estratégias de vínculo e coesão: parentesco, linhagem e clientelas ........................ 121
3.3. A instrução dos jovens ............................................................................................... 149
4. Trabalho, poder e erudição ................................................................................................ 157
4.1.Rendimento agrário ..................................................................................................... 157
4.2. Artes mecânicas ......................................................................................................... 173
4.3. Finança e administração ............................................................................................ 191
4.4. O ofício da mercancia ................................................................................................ 218
4.5. Artes liberais, erudição e as Universidades de Coimbra e Salamanca ..................... 249
5. Cooperação, conflitos e rupturas ...................................................................................... 280
5.1. No interior da comunidade cristã-nova ...................................................................... 280
5.1.1. Parentes, vizinhos e gente do mesmo ofício .................................................. 280
5.1.2. O caso das famílias mistas ............................................................................. 304
5.2. Na relação com os outros cristãos ............................................................................. 316
6. A gestão da diferença normalizada ................................................................................... 345
6.1. A mitra e a clausura ou estratégias securitárias ........................................................ 345
6.2. Gerindo solidariedades cristãs: confrarias, irmandades e fundação de capelas ...... 367
7. Cristãos-Novos de Viseu entre Moisés e Jesus............................................................... 388
7.1. A iniciação dos jovens ................................................................................................ 388
7.2. Mestres e ajuntamentos, messianismo e simulações cristãs .................................... 403
7.3. Costumes sabáticos, festas e jejuns .......................................................................... 420
7.4. Livros e orações ......................................................................................................... 447
7.5. Alimentos e preceitos dietéticos ................................................................................ 462
7.6. Nascimento e morte: circuncisão e rituais fúnebres .................................................. 469
7.7. Afinal, sincretismo de crenças ou uma nova religiosidade? ...................................... 480
5
Debates e Conclusões ............................................................................................................ 490
Fontes e Bibliografia ............................................................................................................... 509
I. Fontes Manuscritas ........................................................................................................ 509
II. Fontes Impressas .......................................................................................................... 511
III. Dicionários, Catálogos e Inventários ........................................................................... 513
IV. Bibliografia ................................................................................................................... 514
V. Fontes Electrónicas ...................................................................................................... 529
Apêndices ................................................................................................................................ 530
Apêndice 1 Processos de judaísmo da cidade de Viseu (1542-1746) – Genealogia
Apêndice 2 Consanguinidade e endogamia conversa na cidade de Viseu
Apêndice 3 O caso dos Reinoso
Apêndice 4 Redes familiares nas malhas do Santo Ofício (1543-1745)
Apêndice 5 Processos de judaísmo da cidade de Viseu (1542-1746) - Profissões
6
Resumo
Nos séculos XVI e XVII vive em Viseu uma comunidade de cristãos-novos que ocupa
um papel central nas dinâmicas da cidade, evidenciado tanto na ocupação das ruas
centrais da urbe como na afirmação destacada no seu tecido social, tomando a seu
cargo os trânsitos mercantis. Aproveitam o efeito de permeabilidade da raia e das redes
familiares que os enquadram, exploram rotas e produtos que unem os dois lados da
fronteira. Assumem destacados cargos administrativos, são médicos, legistas, rendeiros
de rei e dos bispos.
Nas diferentes formas de reprodução social, conhecemos as questões do
parentesco e da identidade pessoal, tuteladas pelo sistema celular e clientelar do tempo.
Revelam estratégias de conservação da sua memória colectiva ao mesmo tempo
que desenvolvem esforços muito persistentes de integração na lógica da elite cristã-
velha, através da adesão aos modelos de vida religiosa e como impulsionadores de
instituições de solidariedade cristã (hospitais, irmandades e confrarias). Na sua relação
com cristãos-velhos e dentro da comunidade cristã-nova revela-se a ambiguidade de
gestos e intenções, sobressaindo nos propósitos uma visão muito pragmática e utilitária
da vida daqueles que participam na elite da cidade.
Alguns persistiam em antigas e agora proibidas representações religiosas, nem
que já muito pouco respeitem os preceitos da velha religião mosaica e acusem claros
indícios de um sincretismo ritual, às vezes parecendo mesmo tratar-se de uma nova
ritualidade. No fundo, interessava aglutinar numa qualquer ideia essencial as condições
de sobrevivência de um povo, por muitos dos seus colocada em risco pela cedência a
processos de assimilação em curso.
Mas, em tempos de unicismo religioso e manutenção de um certo establishment,
sofrerá a cidade de Viseu, quer por efeito das leis de limpeza de sangue, quer com a
acção do Santo Ofício. Muitos decidem partir. Outros ficarão ao alcance da prisão e do
arresto de bens, sobrando para a cidade a perda do capital humano que ofereciam estes
homens de sangue manchado.
PALAVRAS-CHAVE
Idade Moderna (séculos XVI; XVII); Viseu; Portugal; judaísmo; multiculturalidade; judeus
sefarditas; cristãos-novos; endogamia; processos de assimilação; comércio; finança; rendeiros;
família; estratégias familiares; fronteira; patronato; clientelismo; Inquisição; criptojudaísmo,
sincretismo.
7
Resumen
En los siglos XVI y XVII vive en Viseu una comunidad de cristianos nuevos que
sobresale en las dinámicas de la ciudad. Esto es evidente por su ubicación en las calles
más principales de la urbe de aquella época así como por su relevo en el
correspondiente tejido social. Toman a su cargo los tráficos mercantiles más importantes
de Viseu. Aprovechan las ventajas aportadas por el efecto de permeabilidad de la raya
y por su inclusión en las redes familiares que la atraviesan, explotando rutas e productos
que unen los dos lados de la frontera. Además, ocupan cargos profesionales de
destaque: son médicos, abocados y cobradores de rentas del rey y de los obispos. La
reproducción social de esta comunidad es complexa y toma varias formas. Miramos en
particular las cuestiones del parentesco y de la identidad, dominadas en ese entonces
por un sistema clientelar y celular. Sus elementos revelan estrategias de conservación
de la memoria colectiva y, sin embargo, exhiben al mismo tiempo esfuerzos muy
persistentes de integración social que siguen más bien la lógica de la elite de los
cristianos viejos como la de la adhesión a las pautas de la vida religiosa cristiana y del
impulsar de las respectivas instituciones de solidaridad (hospitales, hermandades y
cofradías). En el interior de esa comunidad de conversos y en la relación con la de los
cristianos viejos es visible la ambigüedad de los gestos y de las intenciones, sino que
entre los que forman parte de la elite de la ciudad sobresalga una visión muy pragmática
y utilitaria de la vida. Algunos de sus elementos insisten en antiguas (y, por lo tanto,
prohibidas en su época) representaciones religiosas, ahora bien poco respecten los
preceptos del viejo credo mosaico y exhiban claros señales de un sincretismo ritual que
a veces más bien parece constituir una nueva práctica religiosa. Lo que parecia importar
era la aglutinación en una idea esencial de las condiciones de supervivencia de un
pueblo, puesta en riesgo por muchos de los que se rindieron a los procesos de
asimilación en curso. Pero en eses tiempos de unicismo religioso y de manutención
rigurosa de un cierto establishment también la propia Viseu habría de sufrir con ese final.
Las leyes de limpieza de la sangre y la acción del Santo Oficio hicieron bien su trabajo.
Muchos decidieron partir. Otros se quedaron al alcance de la cárcel y del embargo de
sus bienes, sobrando para la ciudad no más que la pérdida del capital humano de las
personas de la sangre maculada.
PALAVRAS CLAVE
Edad Moderna (siglos XVI; XVII); Viseu; Portugal; judaísmo; multiculturalidad; judíos sefarditas;
cristianos nuevos; endogamia; procesos de asimilación; comercio; finanzas; arrendadores de
rentas; familia; estrategias familiares; frontera; patronazgo; clientelismo; Inquisición;
criptojudaísmo; sincretismo.
8
Abstract
In the city of Viseu (Portugal), during the 16th and 17th centuries, lived a community of
new Christians (cristãos-novos) that took up a central role within the local dynamics,
underlined by its establishment in the central quarters and streets and by its prominent
social status, seen namely through the undertaking of the mercantile transit routes.
Taking advantage of the permeability effect of the frontier and the familiar networks that
frame the community, they explored the routes and goods that united both sides of the
border between Portugal and Spain. They assumed high administrative positions and
offices; they were doctors, lawmen and tax collectors for kings and bishops. In the
different forms of social reproduction, we become aware of the questions related to
kinship and personal identity, tutored simultaneously by the cellular and clientele system.
They reveal strategies to conserve their collective memory at the same time they develop
persistent efforts to integrate in the society of the old Christian (cristã-velha) elite point
of view; whether by adhering to the models of religious living or as forbearers of Christian
solidarity institutions (hospitals, brotherhoods [irmandades] and fellowships [confrarias]).
In their relation with old Christians and inside the new Christian community the ambiguity
of gestures and intents is perceived, overlying what could be considered – when looking
at their purposes – a very pragmatic and utilitarian view of life by those who also became
part of the city elite. Some persist on old and already forbidden religious representations,
even if only a small number still adhere to a strict following of the old Mosaic religion’s
precepts and depict ever more clear signs of ritual syncretism, at times even representing
what could almost be thought of as a new rituality. The relevant trait seemed to be the
agglutination to a paramount notion of survival of a people that had been placed in harm’s
way by many of its own, through the surrendering to the assimilation processes at course.
Nevertheless and when in a time of religious unicity and the maintenance of an already
(almost) secure establishment, the city of Viseu suffered, whether by the aftermath of the
cleanliness of blood (limpeza de sangue) laws or by the role of the Holy Inquisition (Santo
Ofício). Many decided to leave. Others were at arm’s length from imprisonment and
seizure of property and other material possessions, resulting in an unequivocal loss of
human capital in Viseu that the stained blood (sangue manchado) people portrayed.
KEYWORDS
Modern History (16th and 17th centuries); Viseu; Portugal; Judaism; multiculturalism; Sephardi
Jews; new Christians; endogamy; assimilation processes; commerce; finance; family; familiar
strategies; frontier; patronage; Patron–client systems; Inquisition; Crypto-Judaism; syncretism.
9
Observações Prévias
1. No corpo do texto utilizou-se a fonte Arial, considerada de legibilidade absoluta por
especialistas em ergonomia da informação.
2. As referências bibliográficas aqui apresentadas seguem a Norma Portuguesa
(Informação e Documentação: Referências Bibliográficas), editada pelo Instituto
Português de Qualidade (NP 405-1, 405-2, 405-3 e 405-4), referente à descrição e
especificação dos documentos impressos (1994), de materiais não livro (1998), dos
documentos não publicados (2000) e de documentos electrónicos. Esta Norma foi
homologada em Diário da República, III Série, nº 128, de 03 de Junho de 1994 e
baseia-se na normalização internacional ISO 690 (2010) - Information and
documentation: Guidelines for bibliographic references and citations to information
resources e aplicações subsequentes.
3. Quanto aos critérios de transcrição de documentos manuscritos, introduziram-se
modificações ortográficas com o intuito de modernizar a grafia do texto e assim
facilitar a sua leitura.
10
Description:(Fundo do Santo Ofício) e envolveu no caso o estudo dos processos pelo crime de judaísmo, inventários, cartas e arquivos do Santo Ofício sobre cristãos-novos da cidade de Viseu (e um dos primeiros sabrian que cosa era la maldicion de Adan que dixe com sudor de tu haz comeras tu pan55.