Table Of Content1
Universidade Federal da Bahia
Instituto de Letras
Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística
RUA BARÃO DE GEREMOABO, Nº147 - CEP: 40170-290 - CAMPUS UNIVERSITÁRIO ONDINA SALVAD OR-BA
TEL.: (71) 3263 - 6256 – SITE: HTTP://WWW.PPGLL.UFBA.BR - E-MAIL: [email protected]
Fernanda Mota Pereira
Literatura como memória, memórias como literatura:
entrecruzamentos do autobiográfico com o ficcional em textos de
Judith Grossmann e Virginia Woolf
Salvador
2010
2
Fernanda Mota Pereira
Literatura como memória, memórias como literatura:
entrecruzamentos do autobiográfico com o ficcional em textos de
Judith Grossmann e Virginia Woolf
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Letras e Linguística do Instituto de Letras da Universidade
Federal da Bahia como parte dos requisitos para obtenção
do título de doutora em Letras.
ORIENTADORA: PROFa. DRa. LÍGIA GUIMARÃES TELLES
Salvador
2010
3
Sistema de Bibliotecas da UFBA
Pereira, Fernanda Mota.
Literatura como memória, memórias como literatura: entrecruzamentos do autobiográfico com
o ficcional em textos de Judith Grossmann e Virginia Woolf / Fernanda Mota Pereira. - 2010.
238 f.
Orientadora : Profª. Drª. Lígia Guimarães Telles.
Tese (doutorado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto de Letras, Salvador, 2009.
1. Grossmann, Judith, 1931- 2. Woolf, Virginia, 1882-1941. 3. Memória na literatura. 4.
Autobiografia. I. Telles, Lígia Guimarães. II. Universidade Federal da Bahia. Instituto de Letras.
III. Título.
CDD - 809.9
CDU - 82-94
4
Dedico esta tese a Lígia Guimarães Telles, pelos profícuos
ensinamentos amalgamados na tessitura destas páginas e em
singulares momentos da minha vida, envolvidos por constelações de
afeto projetadas de suas palavras e gestos, que espero continuar tendo
como farol, orientando meus passos.
5
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Antonio Pereira e Antonia Mota, e, inserido nesse bordado familiar, um amigo
especial que, não aleatoriamente, também se chama Antonio: Antonio Eduardo Laranjeira. A
eles agradeço pela intensidade desmedida de carinho que suaviza mesmo os mais árduos
caminhos e enaltece as mais felizes jornadas.
A minhas irmãs, Márcia e Bruna, pela cumplicidade, atenção e compreensão.
Aos irmãos que escolhi – meus grandes amigos –, com quem compartilho alegrias e,
ocasionalmente, algumas angústias, acolhidas por eles com a mesma amplitude de cuidado e
afeto, de forma generosa e incondicional. São eles, entre algumas omissões impressas pela
traiçoeira memória: Arivaldo Sacramento, Viviane Ramos, Elizabeth Lima, José Carlos,
Marielson Carvalho, Gildeci Leite, Vitor Garcia.
Aos meus alunos e ex-alunos, pela composição de uma rede de aprendizagens que
compartilhamos e que produz as centelhas necessárias para potencializar a minha vontade de
saber.
A Evelina Hoisel, cujas aulas e textos engendraram reflexões fulcrais para a escrita desta tese,
constituindo-se como uma presença solar nos percursos e veredas trilhados ao longo do
doutorado e representando tantos outros mestres que deixaram marcas significativas em
estudos que desenvolvi nos campos paradisíacos da literatura.
A colegas de trabalho, com quem, honrosamente, passei a conviver a partir deste ano, cujas
contribuições inspiradoras, tecidas em conversas informais e/ou encontros de pesquisa,
auxiliaram a ritmar a escrita dos últimos capítulos. Inspiração também suscitada por serem
intelectuais exemplares, e sustentada, sobretudo, pelas fagulhas de afetividade que emanam da
amizade que tecemos e que ilumina o declarado amor pela área em que nos inserimos. São
eles: Denise Carrascosa, Newton Seixas, Suzane Lima, Júlia Morena, Anna Amélia e Sávio
Siqueira.
Aos funcionários Wilson Gabriel, Cristiane Daltro e Alessandra, pela forma atenciosa,
paciente e sensível com que atenderam minhas solicitações e me guiaram quando tive que
trilhar alguns infecundos caminhos da burocracia.
A três professores, pelas orientações no âmbito dos cuidados com o corpo, guiadas pela
seriedade do trabalho que desempenham e pela preocupação afável com uma aluna pouco
aplicada nesse campo. São eles: Márcio Mattos, Vitor Costa e Carlos Ventura.
A Cláudio Tetsuo, pela forma paciente e disciplinadora com que, nos últimos meses, ministra
lições em uma arte de matriz judaica, conduzindo uma aluna pouco habilidosa e desatenta nos
trilhos da configuração das estratégias necessárias para erigir, sobretudo, a autoconfiança,
que, conforme nosso Mestre, é sinônimo de liberdade.
6
[...] personagem, pessoa, uma coisa é a outra. (GROSSMANN, 1997c, p. 33)
[...] o escritor faz nascer, do seu amor de si mesmo e de sua necessidade de amar,
um outro, que é ainda ele próprio, o texto. Filho feito e não-feito, memória,
memento do ego. (GROSSMANN, 1983, p. 9)
A Memória é costureira, e costureira caprichosa. A Memória faz a sua agulha correr
para dentro e para fora, para cima e para baixo, para cá e para lá. Não sabemos o que
vem em seguida, o que virá depois. (WOOLF, 1986, p. 46)
Pois se há (por acaso) setenta e seis tempos diferentes, todos pulsando
simultaneamente na cabeça, quantas pessoas diferentes não haverá – valha-nos o céu
–, todas morando, num tempo ou noutro, no espírito humano? Alguns dizem que
duas mil e cinquenta e duas. (WOOLF, 1986, p. 183)
7
RESUMO
Nesta tese, são tecidas reflexões sobre entrecruzamentos do autobiográfico com o ficcional no
horizonte do tema: “literatura como memória, memórias como literatura”, expresso em seu
título. O uso da palavra “como” entre os termos literatura e memória(s) simboliza migrações
que os marcam, compreendendo, ainda, categorias textuais relacionadas a eles, a saber: a
crítica e o arquivo. Migrações que têm sua cena na memória, concebida como um bloco
mágico no qual imaginação, devaneios, lembranças, leituras de si e do outro se emaranham,
constituindo, criativamente, narrativas literárias, diários, depoimentos, ensaios, artigos e
arquivos, que compõem o corpus, aqui investigado, no âmbito da produção intelectual de
Virginia Woolf e Judith Grossmann. Em narrativas e outras categorias discursivas eleitas para
este estudo, vislumbra-se a representação de sujeitos, cuja tessitura amalgama-se na escrita de
seus textos, desmarcando a distinção entre eles por configurarem-se como traços atuantes em
grafias de si, presentes, mesmo sob o signo da ausência, nos mais diversos textos – de
narrativas escritas em primeira pessoa a escritos nos quais esta não consta –, e por terem como
esboço o arquitexto, delineado na memória. Cada uma das categorias discursivas mencionadas
foi tratada em um capítulo desta tese, sem, contudo, deixar de trazer à baila as confluências
que as atravessam e denotam seus entrelaces, sob o compasso de digressões e redes alusivas
da memória.
PALAVRAS-CHAVE: Grossmann, Judith; Woolf, Virginia; Memória na literatura;
Autobiografia.
8
ABSTRACT
In this doctoral dissertation, reflections on the intercrossing of the autobiographical with the
fictional are developed in the horizon of the theme: “literature as memory, memories as
literature”, expressed in its title. The use of the word “as” between the terms literature and
memory or memories symbolize migrations which mark them, involving textual categories
related to them as well, such as: criticism and archive. Migrations which have their scene in
the memory, conceived as the Wunderblock in which imagination, daydreams, reminiscences,
readings of the self and of others merge, constituting, in a creative way, literary narratives,
diaries, testimonies, essays, articles, and archives, which compose the corpus, investigated
here, in the field of Virginia Woolf and Judith Grossmann’s intellectual production. In
narratives and other discourse categories chosen to be studied, the representation of subjects,
whose tessitura mingles in the writing of their texts, are beheld, mining the distinction among
them for being configured as traces which act in writings of the self, present, even through the
sign of absence, in diverse texts – from narratives written in the first person to writings in
which it does not occur – and for having as a sketch the arch-text, delineated in the memory.
Each of these discourse categories aforementioned were studied in a chapter of this
dissertation, without, nonetheless, failing to convey confluences which cross them and denote
their interrelationship, following the cadence of digressions and allusive connections of the
memory.
Keywords: Grossmann, Judith; Woolf, Virginia; Memories in literature; Autobiography.
9
SUMÁRIO
PUXANDO FIOS DE UMA TESSITURA (IN)TERMINÁVEL ........ p. 10
REFRAÇÕES E INVERSÕES EM ESPELHOS DE NARCISO ........ p. 16
2 ENTRECRUZAMENTOS DO AUTOBIOGRÁFICO COM O
FICCIONAL ......................................................................................... p. 17
2. 1 Uma nota sobre autobiografia e ficção: transmigrações na cena da
escrita .................................................................................................... p. 23
2. 1. 1 AUTOBIOGRAFIA E FICÇÃO: TRANSMIGRAÇÕES EM MEU
AMIGO MARCEL PROUST ROMANCE E DEPOIMENTOS DE
JUDITH GROSSMANN ...................................................................... p. 25
2. 1. 2 AUTOBIOGRAFIA E FICÇÃO: TRANSMIGRAÇÕES EM
MOMENTS OF BEING E MRS. DALLOWAY ...................................... p. 43
3 NOS LABIRINTOS DA MEMÓRIA: O EU E O OUTRO ................. p. 65
3. 1 Tessituras do ser: A “pessoa” em Rumo ao farol ................................. p. 70
3. 2 A “pessoa” em Fausto Mefisto Romance .............................................. p. 87
A PESSOA ENTRE MEMÓRIAS E FICÇÕES ................................... p. 108
4 COMO UM “NÓ EM UMA REDE”: MISCELÂNEAS DE
CAMPOS DISCURSIVOS SOB O SIGNO DA MEMÓRIA .............. p. 117
4. 1 TEORIAS E CRÍTICA COMO ESCRITA AUTOBIOGRÁFICA:
UMA LEITURA DE TEXTOS DE VIRGINIA WOOLF .................... p. 137
4.2 TEORIAS E CRÍTICA COMO ESCRITA AUTOBIOGRÁFICA:
UMA LEITURA DE TEXTOS DE JUDITH GROSSMANN ............. p. 160
5 ARQUIVO: ALGUMAS IMPRESSÕES .............................................. p. 187
5. 1 UMA COMPOSIÇÃO DE ARQUIVOS EM TEXTOS DE VIRGINIA
WOOLF .............................................................................................. p. 203
5. 2 UMA COMPOSIÇÃO DE ARQUIVOS EM DEPOIMENTOS,
PASTAS, LIVROS, INSTITUIÇÕES, PESSOAS .............................. p. 214
ESCRITAS NARCÍSICAS EM COMPOSIÇÕES DE ARQUIVOS .... p. 219
ALINHAVANDO FIOS......................................................................... p. 229
10
PUXANDO FIOS DE UMA TESSITURA (IN)TERMINÁVEL
Os livros são reais, pensou Fanny Elmer, colocando os pés em cima da lareira.
Algumas pessoas o são. (WOOLF, 2003a, p. 135)
Como lembranças puxadas em uma rede de digressões, formando linhas de
pensamento, as reflexões sobre o tema “literatura como memória, memórias como literatura”
desfiam-se de um ponto fundamental: a interrelação entre ficção e vida sob o signo da
memória. Nesse ponto, enredam-se subtemas referentes à subjetividade, escrita, leitura e
arquivo, distribuídos nos quatro capítulos constituintes desta tese, os quais se entrecruzam
pelas confluências que os assinalam.
Os estudos que se descortinam nas malhas deste texto seguem cadências uníssonas aos
tons que permeiam o tema nele tratado. Se labirínticos e narcísicos são os caminhos trilhados
nas discussões em torno dos entrecruzamentos do autobiográfico com o ficcional, essas duas
imagens não estarão menos presentes na tessitura desta tese e servem para qualificar o
percurso do sujeito que a escreve; pois se reconhece que a escrita traz uma grafia de si em seu
bojo. Grafia na qual, por mais que se tente decantar o grau de subjetividade existente nesse
ato, traços de um eu se emaranham no texto do escritor, no qual este também se deixa
produzir.
Nessa linha de pensamento, as veredas abertas em torno do tema desta tese denotam
uma trajetória de formação do sujeito que a escreve nos campos de estudo sobre Virginia
Woolf e Judith Grossmann. Escritoras cuja vida e literatura apresentaram-se, desde as
primeiras imersões em seus textos, como motes a comporem reflexões que, à guisa de
configurações teóricas contemporâneas, renderiam profícuas discussões, em cujos matizes
vislumbra-se não uma teoria de caráter conclusivo, mas a desconstrução de fronteiras
atribuídas a textos literários e de cunho autobiográfico. Não obstante essa atribuição,
reconhece-se, na contemporaneidade, a recorrência de debates trazidos à baila por diversos
teóricos, muitos dos quais a serem abordados aqui, em torno das interseções entre essas
formas textuais.
Nesta tese, todavia, o olhar que se lança sobre essa questão traz a contribuição de
pensar literatura, autobiografia, crítica e arquivo como memória, desmarcando suas fronteiras
ao mesmo tempo em que enuncia a confluência de sua tessitura. Para isso, desenvolvem-se
considerações que ampliam a concepção sobre as referidas formas discursivas, com base em
reflexões pautadas na leitura de textos de pensadores como Jacques Derrida e Sigmund Freud.
Description:dissertação de mestrado intitulada “Memórias de vi(n)das nos tempos de Mrs. Dalloway e. Meu Amigo Marcel Mrs. Dalloway e Meu Amigo Marcel Proust Romance, de Virginia Woolf e Judith. Grossmann Uma retomada em matizes multicores que preenchem não só as páginas da poesia ou do