Table Of ContentExtração lipídica em leveduras oleaginosas de queijo artesanal
Lucio Menezes de Amorim¹*, Priscila Dallé da Rosa², Patricia Valente²
Leveduras oleaginosas de queijo
1. Graduando em Ciências Biológicas, UFRGS
2. PPGMAA - Programa de Pós-graduação em Microbiologia Agrícola e do Meio
Ambiente, Instituto de Ciências Básicas da Saúde, UFRGS, Rua Sarmento Leite, 500,
Porto Alegre- RS- Brasil
*. E-mail: [email protected]
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Resumo: Algumas espécies de leveduras podem acumular até 70% do seu peso seco em
lipídeos tornando-as ótimas para produção de óleo microbiano e aplicações
biotecnológicas. É importante o estudo dessas leveduras oleaginosas e a posterior
quantificação e utilização do lipídeo produzido em uma série de bioprodutos. O objetivo
do trabalho foi quantificar o teor de lipídeos produzidos por leveduras isoladas de queijo
do Rio Grande do Sul. Foram utilizadas oito cepas da espécie Yarrowia lipolytica. O
experimento foi realizado em três etapas: o pré-inóculo, o inóculo e a extração lipídica. O
rendimento em lipídeos foi obtido comparando-se o peso dos lipídeos extraídos com o
peso da biomassa liofilizada. A avaliação do perfil lipídico das leveduras foi realizado
através da Cromatografia Gasosa. O óleo de levedura pré extraído, foi saponificado
diretamente e, após a formação dos ésteres, 2 mL de hexano foram utilizados para
recuperar os derivados. Leveduras que possuem um rendimento igual ou superior a 20%
são consideradas oleaginosas. As leveduras QU11, QU21, QU29, QU69, QU111 e
QU137 obtiveram um rendimento de 75%, 46%, 28%, 29%, 22% e 61% de lipídeos,
respectivamente, sendo, portanto, oleaginosas. As leveduras que produziram maior
biomassa foram as QU36, QU50, QU111 e QU137.
Palavras-Chave: Óleo microbiano, Yarrowia lipolytica , rendimento.
Abstract: Lipid Extraction in Handmade Cheese Oleaginous Yeasts. Some yeast species
can accumulate up to 70% of their dry weight in lipids, rendering them optimal for
microbial oil production and biotechnological applications. The study of these yeasts their
lipid quantification and later use in a series of bioproducts is important. The objective of
the study was to quantify lipids produced by yeasts isolated from cheese at Rio Grande do
Sul. Eight strains of Yarrowia lipolytica were used. The experiment was carried out in
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three stages: pre-inoculum, inoculum and lipid extraction. The lipids yield was obtained
comparing the weight of the extracted lipids with the weight of the lyophilized biomass.
Moreover, the evaluation of the lipid profile was performed by gas chromatography. The
preextracted yeast oil was directly saponified. Shortly after the formation of the esters,
2mL of hexane were used to recover the derivatives. Yeasts with a yield equal to or
superior to 20% are considered oleaginous. The yeasts QU11, QU21, QU29, QU69,
QU111 and QU137achieved lipid yields of, respectively, 75%, 46%, 28%, 29%, 22% and
61%, hence being regarded as oleaginous. Yeasts which produced greater biomass were
QU36, QU50, QU111 and QU137.
Key Words: Microbial oil, Yarrowia lipolytica, yield.
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INTRODUÇÃO
Todos os organismos eucarióticos e algumas bactérias gram-positivas armazenam
triacilgliceróis em compartimentos intracelulares que são variadamente chamados de
partículas de lipídios, gotículas lipídicas, corpos lipídicos, corpos oleosos, oleossomas ou
esferossomas (plantas). A estrutura destes compartimentos lipídicos é semelhante em todos os
tipos celulares (Mlícková et al., 2004).
As leveduras são os microrganismos mais comumente utilizados em processos fermentativos.
Algumas delas podem acumular até 70% do seu peso seco em lipídeos- óleo microbiano
(Angerbauer et al., 2008). O óleo pode ser utilizado em uma série de subprodutos, possuindo
diversas aplicações biotecnológicas.
O principal fator que auxilia o acúmulo de lipídeos em microrganimos é a razão
Carbono/Nitrogênio (C/N), quanto maior a razão, maior será a produção de óleo microbiano.
Outros fatores podem influenciar a produção de lipídeos. A fonte de carbono mais utilizada é
a glicose, entretanto, muitos estudos têm sido dedicados à utilização de outras fontes
presentes em material vegetal (amido e xilose) e resíduos agro-industriais. Um dos resíduos
com melhores resultados é o glicerol, um subproduto do biodiesel (Hou, 2008; Papanikolaou
et al., 2003). Já para as fontes de nitrogênio, tanto as fontes orgânicas quanto inorgânicas são
utilizadas. O pH e diferentes temperaturas de incubação também podem influenciar a
produção de lipídeos (Zhu & Whu, 2008).
Os lipídeos produzidos são classificados em: neutros (triglicerídeos) e polares (glicolipídeos e
fosfolipídeos), sendo a grande parte constituída por triglicerídeos saturados e
monoinsaturados (MUFAs).
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O óleo microbiano pode ter muitas utilizações, aplicações nutracêuticas, produção de
biodiesel e como atividade antimicrobiana. A expressão “nutracêutico” tem como definição
uma ampla variedade de alimentos e componentes alimentícios com aplicações na saúde. Sua
ação varia do suprimento de minerais e vitaminas essenciais até a proteção contra várias
doenças infecciosas (Hungenholtz & Smid, 2002).
Biodiesel é um combustível que pode ser gerado por esterificação, transesterificação e
craqueamento. Na transesterificação, o processo mais comumente usado pelas usinas, são
utilizados óleo (animal, vegetal e de outras fontes), solventes orgânicos e um catalisador,
produzindo ésteres de ácidos graxos- o biodiesel- glicerol e resíduos contaminantes.
Há relatos do potencial dos ácidos graxos na ação antimicrobiana, produzidos como uma
defesa natural contra microrganismos patogênicos (Smith et al., 2010). Eles atuam na
membrana celular, inibem certas atividades enzimáticas, geram produtos que causam
peroxidação e causam a lise celular de microrganismos (Desbois & Smith, 2010).
O objetivo do presente trabalho foi quantificar o óleo microbiano produzido por leveduras
isoladas de queijo artesanal e avaliar o perfil de ácidos graxos componentes do óleo, visando
o aproveitamento desse material em bioprodutos de alto valor agregado.
MATERIAL E MÉTODOS
Microrganismos
Foram utilizadas oito cepas da espécie Yarrowia lipolytica (QU11, QU21, QU29, QU36,
QU50, QU69, QU111 e QU137), identificadas através de sequenciamento da região D1/D2
do 26s rDNA.
Pré-Inóculo
Os experimentos foram realizados em triplicata. As leveduras foram cultivadas em meio GYP
(2% de glicose e ágar, 1% de peptona e 0,5% de extrato de levedura) por 24 horas a 25 °C.
Após esse tempo, uma alçada de uma colônia de cada cepa foi inoculada em um Erlenmeyer
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contendo 25 mL de meio A (10% de glicose, 0,1% de KH PO , 0,1% de (NH ) SO e 0,05%
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de MgCl 6H O), razão C:N 100:1, incubada em incubadora com agitação (IKA® KS 4000 ic)
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a 25 °C e 150 rpm por cerca de 40 horas.
Inóculo
10 mL do pré-inóculo foram transferidos para 50 mL de meio A , que foi incubado sob as
mesmas condições do pré-inóculo. A biomassa celular foi coletada por centrifugação,
congelada por 48 horas a -30 °C e liofilizada por 24 horas.
Extração Lipídica
Os lipídeos foram extraidos através do método proposto por Bligh & Dyer (1959) com uma
modificação: a lise das células foi realizada com o auxílio de Turrax durante três minutos,
com intervalos a cada minuto, sendo a biomassa mantida em gelo durante os intervalos. Os
solventes foram evaporados em um rotaevaporador (Heidolph® Laborota 4000), restando
somente uma gotícula de lipídeo característica.
Cromatografia Gasosa
O óleo de levedura pré-extraído foi saponificado diretamente com KOH 0,5 M em metanol a
80 °C por uma hora, para posterior esterificação com H SO 1,0 M em metanol sob
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aquecimento de 80 °C por uma hora. Logo após a formação dos ésteres, foi utilizado 2 mL de
hexano para recuperar os derivados.
Os ésteres foram então analisados em cromatógrafo gasoso equipado com o detector de
ionização de chama (FID) e coluna capilar (60 m x 0,25 mm x 0,2 um). As temperaturas do
detector e do injetor foram 260 ºC e 240 ºC, respectivamente. A programação de aquecimento
da coluna foi iniciada com 120 ºC por 5 minutos e aumento gradual de 4 ºC por minuto até a
temperatura final de 240 ºC, permanecendo assim por 5 min. O fluxo de gás de arraste (H )
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foi de 17 mL.min-1. O volume de injeção foi de 0,5 μL com razão de split de 1:100. A
identificação dos picos, assim como a quantificação, foi realizada pela comparação dos
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tempos de retenção e da área dos picos das amostras com as de padrões de ésteres metílicos
de ácidos graxos.
Análises Estatísticas
As análises estatísticas foram obtidas pela One-way ANOVA (não paramétrica) através do
programa GraphPad Prism.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Todas as leveduras utilizadas foram identificadas como Yarrowia lipolityca. A Yarrowia
lipolytica é uma levedura de alto teor de lipídeos. Diversas tecnologias, incluindo diversas
configurações de fermentação, já foram utilizadas para a produção de óleo (Milanesio et al.,
2012).
Leveduras que possuem um rendimento igual ou superior a 20% são consideradas
oleaginosas. A quantificação da biomassa seca e do óleo microbiano podem ser observadas
nas Tabelas 1 e 2. As leveduras QU11, QU21, QU29, QU69, QU111 e QU137 obtiveram um
rendimento de 75%, 46%, 28%, 29%, 22% e 61% de lipídeos, respectivamente, sendo,
portanto, oleaginosas (Tab. 3). As leveduras que produziram maior biomassa foram as
QU36, QU50, QU111 e QU137 (Tab. 1). A biomassa das leveduras QU36 e QU50
mostraram um valor significativo em relação à levedura QU11 com o valor de F=10,94 e um
P<0,0001 (Tab. 1), já no lipídeo, a QU137 se mostrou com um valor significativo em relação
à levedura QU11 com o valor de F=6,983 e um P=0,0007 (Tab. 2).
O perfil lipídico das leveduras foi obtido através da Cromatografia Gasosa. As leveduras
QU11, QU21, QU36 e QU111 apresentaram todos os principais ácidos graxos, à exceção do
Ácido Linolênico. A levedura QU137 foi a única que apresentou o àcido Linolênico (Tab. 4).
Comparando esses rendimentos com os rendimentos obtidos por Rosa (2011), que utilizou as
mesmas leveduras à exceção da levedura QU111 (QU11 – 28%, QU21 – 35%, QU29 – 45%,
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QU69 – 50% e QU137 – 40%), constatou-se que a grande maioria das leveduras teve um
rendimento melhor à exceção das leveduras QU29 e QU69. Isso, provavelmente, deve-se a
dois fatores: a concentração do Pré-Inóculo foi maior no trabalho atual e o método de
extração foi diferente.
Milanesio et al. (2012) utilizando etanol na mistura do solvente, obtiveram uma concentração
máxima de 15000 mg/L. Segundo Milanesio et al. (2012), a adição de etanol aprimora a
solubilidade do óleo microbiano.
Poli et al. (2013a), utilizando a cepa QU21, constataram um rendimento de 26,5% com o
método de maceração utilizando nitrogênio líquido seguido por sonicador. Usando o método
Bligh & Dyer (1959), a cepa QU21 obteve um rendimento de 46%. Em outro trabalho de Poli
et al. (2013b), observaram que o peso do óleo microbiano foi de 492 e 460 mg/L utilizando o
método de fluorescência e de análise gravimétrica, respectivamente, para a mesma cepa
QU21, resultado muito superior a todas as cepas utilizadas no trabalho atual.
Os lipídeos obtidos nesse experimento foram coletados e armazenados e serão testados para
atividade antimicrobiana.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq) e à Fapergs pelo apoio financeiro (processo 11/2047-0).
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Média do peso da biomassa seca em mg/L.
Tabela 2. Média do peso do óleo microbiana em mg/L.
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Tabela 3. Rendimento do peso médio das leveduras em mg/L e em percentagem.
Tabela 4. Perfil lipídico encontrado nas leveduras com a percentagem de cada ácido graxo.
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