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ESTUDOS RURAIS
títulos publicados
Estrutura Agrária e Produção de Subsistência na Agricultura Brasileira, José
Graziano da Silva (coord.)
Introdução Crítica a Sociologia Rural, José de Souza Martins (org.)
Roteiro do café e Outros Ensaios, Sérgio Milliet
Subordinação do Trabalho ao Capital na Lavoura Cacaueira da Bahia, Amílcar
Baiardi
Evolução Agrária e Pressão Demográfica, Ester Boserup
O Estado, a Agroindústria e a Pequena Produção, John Wilkinson
O Arrendamento Capitalista na Agricultura, Paulo Roberto Beskow
EVOLUÇÃO AGRÁRIA
E PRESSÃO DEMOGRÁFICA
Ester Boserup
EVOLUÇÃO AGRÁRIA
E PRESSÃO DEMOGRÁFICA
Tradução de
Oriowaldo Queda e João Carlos Duarte
EDITORA HUCITEC
EDITORA POLIS
São Paulo, 1 9 8 7
Traduzido da edição publicada em inglês, em 1972, com o título The Conditions of
Agricultural Growth, por George Allen & Unwin, Londres, Inglaterra.
Direitos de tradução e de publicação em língua portuguesa reservados pela Editora de
Humanismo, Ciência e Tecnologia "Hucitec" Ltda., Rua Comendador Eduardo Saccab,
3 4 4 — 0 4 6 0 2 São Paulo, Brasil. Telefone: (011) 61-6319.
Capa: Estúdio Hucitec.
Composição: Forma Composições Gráficas Ltda.
ISBN 85-271-0020-7-Hucitec
Esta obra, em parte ou no todo, não poderá ser reproduzida, por qualquer meio, mesmo
reprográfico. sem autorização escrita das editoras.
Co-edição com
LIVRARIA E EDITORA POLIS LTDA
Rua Caramuru, 1196
04138 São Paulo Brasil
Telefone: (011) 275-7586.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 7
1. A DINÂMICA DO USO DA TERRA 13
A seqüência histórica 15
Uso da terra nos trópicos 16
A paisagem em mudança 18
2. INTERDEPENDÊNCIA ENTRE USO DA TERRA E MU
DANÇA TÉCNICA 23
Sistemas de pousio e tipos de técnicas 24
Tipos de instrumentos versus fabricação de instrumentos 26
3. PRODUTIVIDADE DO TRABALHO NOS SISTEMAS DE
POUSIO LONGO E POUSIO CURTO 29
Do pousio florestal ao pousio arbustivo 30
O advento do cultivo com arado 33
4. CAPACIDADE DE SUPORTE DA TERRA E PRODUTIVI
DADE DO TRABALHO NA AGRICULTURA INTENSIVA 37
Do pastoreio ao cultivo de forrageiras 38
Da agricultura de sequeiro à agricultura irrigada 41
Crescimento populacional e produtividade do trabalho 43
5. CRESCIMENTO POPULACIONAL E HORAS DE TRABA
LHO . 47
Jornada curta no sistema de pousio longo 48
A estação morta no sistema de pousio curto 53
O trabalho árduo da agricultura intensiva 57
A mudança gradual dos hábitos de trabalho 59
6. A COEXISTÊNCIA DE DIVERSOS SISTEMAS DE CUL
TIVO 63
Adaptação do uso da terra às condições naturais 65
Os casos de Java e do Japão 67
Redução da densidade populacional 70
Os efeitos do rápido crescimento da população 72
7. RENDIMENTOS DECRESCENTES DO TRABALHO E
INÉRCIA TÉCNICA 75
8. O CÍRCULO VICIOSO DA POPULAÇÃO ESPARSA E DAS
TÉCNICAS PRIMITIVAS 81
As precondicões à concentração da população 83
Padrões divergentes de agricultura 87
9. OS SISTEMAS DE USO DO SOLO COMO UM DETERMI
NANTE DO SISTEMA DE POSSE E USO DA TERRA .... 89
Direitos gerais e específicos de cultivo 91
As características do sistema senhorial de posse e uso da terra 94
Os direitos de pastagem e o encurtamento dos períodos de pousio 98
Do sistema senhorial de posse e uso da terra à propriedade privada da terra .. 100
10. INVESTIMENTO E POSSE E USO DA TERRA NAS CO
MUNIDADES TRIBAIS 103
A organização do investimento no sistema tribal de posse e uso da terra 104
A luta pelos direitos de propriedade 107
11. INVESTIMENTOS RURAIS NO SISTEMA SENHORIAL
DE POSSE E USO DA TERRA 111
A agricultura intensiva sob o domínio dos senhores feudais 113
A negligência do investimento sob o domínio colonial 115
A resposta aos estímulos de preços 117
12. OS ESTÍMULOS AO INVESTIMENTO NO SISTEMA MO
DERNO DE POSSE E USO DA TERRA 119
O investimento na exploração familiar 122
Salários reais e emprego 124
Os preços dos alimentos e a taxação da agricultura 129
13. A UTILIZAÇÃO DE INSUMOS INDUSTRIAIS NA AGRI
CULTURA PRIMITIVA 131
14. ALGUMAS PERSPECTIVAS E IMPLICAÇÕES 135
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INTRODUÇÃO
O problema da relação entre crescimento da população e produção de
alimentos tem ocupado os economistas desde o momento em que eles
começaram a se interessar pelo estudo das tendências seculares das
sociedades humanas. Existem dois modos fundamentalmente diferen
tes de abordar esse problema. Pode-se perguntar de que maneira mu
danças nas condições agrícolas afetam a situação demográfica. Inver
samente, podem-se investigar os efeitos de mudanças populacionais
sobre a agricultura.
Formular a primeira dessas questões é adotar a abordagem de
Malthus e seus seguidores mais ou menos fiéis. O raciocínio que eles
desenvolvem baseia-se na crença de que a oferta de alimentos e ineren
temente inelástica, sendo essa falta de elasticidade o principal fator
determinante da taxa de crescimento da população. Assim, o cresci
mento populacional é visto como variável dependente, determinada por
mudanças na produtividade agrícola que, por sua vez, resultariam de
fatores exógenos como, para exemplificar, um fortuito fator de inven
ção ou imitação técnica. Em outras palavras, desde esse ponto de vista
essencialmente malthusiano, existiria para cada comunidade e em cada
tempo uma taxa esperada de crescimento populacional. A ela a taxa
real de crescimento tenderia a se ajustar.
O presente estudo parte da concepção oposta. Baseia-se na supo
sição — que a autora acredita mais realista e mais fértil — de que a
ordem principal de causação corre na direção inversa: o crescimento
populacional é aqui considerado variável independente e o principal
fator determinante de mudanças na agricultura.
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Esta mudança de perspectiva mostra-se aceitável quando se atenta
para alguns eventos mais ou menos recentes. Poucos estudiosos suge
ririam que os enormes aumentos das taxas de crescimento populacional
observados no mundo subdesenvolvido no pós-guerra poderiam ser
explicados por mudanças nas condições de produção de alimentos.
Esta razoavelmente claro que a explosão demográfica é uma mudança
autônoma de condições básicas, no sentido de que a explicação para
essa mudança não deve ser procurada na melhora das condições de
produção de alimentos mas, sim, nos avanços da medicina e em outros
fatores que, para o estudioso do desenvolvimento agrícola, seriam va
riáveis independentes.
A tarefa do presente estudo e, portanto, mostrar que, não apenas
no caso especial e óbvio do pós-guerra mas, para o desenvolvimento
agrícola em geral a linha dominante de causação corre das tendências
da população as mudanças na agricultura, não o inverso. A autora
espera ter mostrado que essa abordagem conduz a um entendimento
mais perfeito do curso histórico da agricultura, aí incluídos tanto o
desenvolvimento de padrões e técnicas de cultivo como as estruturas
sociais das comunidades agrárias.
O fato de que se tenha centrado a atenção na concepção malthusiana
de evolução da produção de alimentos como fator determinante do
crescimento da população não impediu que os economistas analisassem
também a questão de como o crescimento populacional afeta, por sua
vez, a produção agrícola. De fato, a teoria da renda da terra desenvol
vida pelos clássicos constitui uma parte da resposta a esta questão:
o que acontece à produção de alimentos quando a população aumenta?
No entanto, a maneira pela qual os economistas clássicos abordaram
esse problema foi determinada pelas condições algo especiais da agri
cultura do Ocidente naquela época, resultando numa visão excessiva
mente simplificada das mudanças de padrões agrícolas produzidas pela
pressão do crescimento populacional. Este ponto tem importância cru
cial para tudo o que se segue no presente estudo. Por isso faz-se neces
sária uma explicação adicional.
Os economistas clássicos escreveram durante uma época em que
as terras ate então ainda não aproveitadas do hemisfério ocidental es
tavam sendo gradualmente incorporadas a agricultura por coloniza
dores europeus. Era natural, portanto, que aqueles economistas enfati
zassem a importância de reservas de terras virgens e fizessem uma clara
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distinção entre dois métodos de aumento do produto agrícola: a expan
são da produção na margem extensiva pela incorporação de novos tra
tos de terra e a expansão da produção através do cultivo mais intensivo
dos campos já existentes.
Essa concepção ultra-simplificada tem persistido na literatura
econômica e ainda hoje esse é o tipo de análise que se oferece quando
problemas de países subdesenvolvidos são discutidos. Essa abordagem
não e apropriada para uma teoria geral do desenvolvimento agrícola.
A razão disso é que muitos tipos de agricultura primitiva não se fazem
sobre campos permanentes: eles são itinerantes.
Esse fato, que parece ter sido ignorado pelos economistas clás
sicos, é fundamental para o nosso problema, pois dele se segue que não
pode haver, no caso, distinção nítida entre terra cultivada e terra não
cultivada e que, da mesma maneira, é impossível distinguir claramente
entre a criação de novos campos e a mudança de métodos nos campos
já existentes.
Este estudo tenta levar em conta todas as conseqüências dessas
constatações. A própria distinção entre campos e terras não cultivadas
é descartada; a ênfase recai sobre a freqüência de cultivo. Em outras
palavras, sugere-se que se considere um contínuo de tipos de uso da
terra, do caso extremo de terra verdadeiramente virgem, nunca culti
vada, passando pelos casos de terras onde se colhe e planta a intervalos
cada vez mais curtos, até, finalmente, aqueles territórios onde se se
meia tão logo, a cultura anterior tenha sido colhida. A intenção é a de
prover com essa nova abordagem o quadro de referência para uma
análise dinâmica que englobe todos os tipos de agricultura primitiva,
tanto os que recorrem ao pousio prolongado, às vezes por mais de uma
geração, como os de cultivo contínuo, onde se semeia e colhe, no mesmo
campo, diversas vezes ao ano.
Quando a antiga distinção entre terra cultivada e terra não culti
vada é substituída pelo conceito de freqüência de cultivo, a teoria eco
nômica do desenvolvimento agrícola torna-se compatível com as teorias
de mudança da paisagem propostas pelos cientistas naturais. Os pais
da teoria econômica pensaram como sendo imutáveis (e nisso estavam
de acordo com os cientistas naturais da época) muitas das caracterís
ticas que os cientistas de hoje consideram produzidas pelo homem,
socialmente determinadas. Em particular, a distinção entre terra natu
ralmente fértil e terra menos fértil foi considerada como um elemento
crucial para a explicação de mudanças na agricultura.
Em contraste, quando a análise é baseada no conceito de fre
qüência de cultivo, torna-se virtualmente impossível cair na tentação de
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