Table Of ContentEstudando um objeto científico antigo de uma instituição pública baiana: Balança de
Sartorius (balança analítica de dois pratos com gabinete)
Marsílvio Gonçalves Pereira1, Rejâne M. Lira da Silva2, Marta C. Lourenço3
(1 DME-CE-Universidade Federal da Paraíba; PPGE-Faculdade de Educação - Universidade de São Paulo;
PPGEFHC-UFBA/UEFS; 2Instituto de Biologia - Universidade Federal da Bahia; PPGEFHC-UFBA/UEFS
3Museu de Ciência - Universidade de Lisboa)
INTRODUÇÃO
O estudo de objetos, artefatos ou instrumentos científicos é uma necessidade premente
e importante para se conhecer e divulgar aspectos e registros que constituem o acervo da
cultura material da humanidade produzida ao longo de sua história, relacionados à Ciência e a
Tecnologia.
De acordo com Fleming (1974), o estudo de artefatos, constitui uma abordagem
humanística primária, que em conjunto com o estudo da constituição física do homem, suas
ideias e instituições, os contextos em que ele viveu, e os registros de suas ações no tempo, tem
despertado nele, obviamente, um fascínio natural universal sobre suas produções culturais,
entre elas, as produções científicas e tecnológicas. E por isto mesmo revelando sua
importância para estudos da História da Ciência.
Neste trabalho, o termo cultura está sendo assumido como “todo complexo que inclui
artefatos, crenças, arte, todos outros hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma
dada sociedade, e todos os produtos da atividade humana, conforme determinado por estes
hábitos” (KLUCKHOHN; KELLY, 1945; KROEBER; KLUCKHOHN, 1963 apud
FLEMING, 1974) e o termo artefato ou objeto, como utilizado neste trabalho, pode ser
definido como “um produto de obra humana” ou “feito pelo homem a qualquer momento de
sua história” (WEBSTER'S NEW COLLEGIATE DICTIONARY, 1959; HUME, 1970 apud
FLEMING, 1974).
E ainda, seguindo a orientação de Granato et al. (2007), está sendo utilizado o termo
objeto de ciência e tecnologia, como termo genérico que engloba uma variedade de artefatos,
como a balança de precisão, objeto de estudo neste trabalho. Conforme estes autores, os
objetos mais facilmente identificados ao patrimônio cultural de Ciência & Tecnologia (C&T)
são os denominados instrumentos científicos, pois fizeram parte das atividades realizadas em
laboratórios científicos e de tecnologia aplicada. No entanto, instrumento científico é um
termo complexo e que só se aplica em período histórico determinado (século XIX e início do
século XX).
Esses instrumentos, objetos ou materiais de laboratório se constituem em fontes e
documentos importantes para as investigações em história contemporânea da ciência. E para
esses materiais, aplica-se uma regra importante: quanto mais próximos do original, melhor
(MARTINS, 2005). Para a autora, é útil dispor da reprodução de um desenho de Hooke
publicado por um historiador, por exemplo; é melhor, no entanto, dispor da própria obra de
Hooke onde esse trabalho foi publicado, e melhor ainda é ter acesso ao desenho original feito
por ele (MARTINS, 2005).
Os acervos científicos e tecnológicos são frequentemente percebidos como acessórios
ao texto, predominando sempre o seu aspecto ilustrativo (MARTINS, 2005; GRANATO;
LOURENÇO, 2011). Sua utilização como fontes primárias é muitas vezes questionada e
muito pouco praticada, especialmente no Brasil (GRANATO; LOURENÇO, 2011). De
acordo com Lourenço e Carneiro (2009), percebe-se aqui claramente a dificuldade dos
historiadores em utilizar esse tipo de fontes documentais, que pode se originar já na formação
desses profissionais, já que nos cursos de graduação em história encontram-se ausentes
disciplinas que os aproxime dos objetos e ensine uma metodologia de pesquisa que permita a
sua utilização como fontes primárias nas investigações.
A motivação para o desenvolvimento deste trabalho foi à realização do Curso de
Museus, Coleções e História da Ciência ministrado pelas Professoras Drª. Marta Lourenço da
Universidade de Lisboa (UL) e Drª. Rejâne M. Lira da Silva da Universidade Federal da
Bahia (UFBA), no segundo semestre de 2013, mais especificamente nas reflexões e
discussões acerca do seguinte tópico do curso: Estudo da História da Ciência e Cultura
Material da Ciência. Introdução à cultura material: origens, bibliografia e recursos. A cultura
material da ciência. Os artefatos como fonte. Os níveis objeto, coleção e patrimônio. O
museu enquanto fonte para a história. Estudos de instrumentos, estudos de patrimônio.
Biografias de objetos e de coleções. Abordagens metodológicas à cultura material (grifo
nosso). Tais discussões estiveram voltadas para atividades teóricas e práticas relacionadas
com a coleção de objetos científicos e naturais do Museu de História Natural do Instituto de
Biologia (IBio) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e também com a coleção de
objetos ou artefatos dispostos nos corredores do IBio/UFBA, de modo a realçar a importância
de articulação entre teoria e prática na formação de especialistas na área e valorizar os objetos
científicos na perspectiva da conservação e preservação do patrimônio e da memória da
instituição acima citada. Portanto, o objetivo deste trabalho é caracterizar e analisar um objeto
científico e tecnológico, em nosso caso específico trata-se de uma balança de precisão antiga
(Balança Analítica de Sartorius – Balança de dois pratos com gabinete), fabricada na
Tchecoslováquia, de modo a realçar sua importância no acervo do patrimônio científico e
tecnológico do IBio da UFBA.
OS OBJETOS E O PATRIMÔNIO CULTURAL CIENTÍFICO
Estudos realizados sobre o patrimônio cultural científico, especialmente aquele
existente e oriundo nas universidades (GRANATO, 2010), tem constatado a inexistência de
estudos sobre o patrimônio cultural de C&T tanto no exterior quanto no Brasil.
O patrimônio cultural tangível da Ciência e da Tecnologia em nosso país ainda é
pouco conhecido. Para Granato e Lourenço (2011), o que se sabe sobre o tema é restrito, e
muitos objetos de ciência e tecnologia já podem ter sido modernizados ou descartados para
dar lugar ao instrumento ou artefato mais recente, mais moderno. Outro gargalo apontado
pelos autores é o fato de termos poucas instituições museológicas guardiãs para proteger esse
patrimônio no Brasil. E é no interior das universidades que localizamos a grande maioria dos
museus de ciência e técnica brasileiros, resultando na predominância de instituições oriundas
da segunda linhagem - a do ensino e formação.
Conforme Granato e Lourenço (2011), quando se trabalha com artefatos científicos e
tecnológicos que muitas vezes são objetos musealizados, é importante lembrar que todo
processo de musealização inicia-se com a seleção e retirada de um objeto de seu contexto
original e completa-se com a exposição, onde acontece o encontro entre o público e os
artefatos.
Embora o termo instrumento científico possa implicar que o objeto ou artefato em
estudo tenha sido utilizado por um cientista em suas pesquisas, ou como parte do ensino de
ciências na formação de cientistas ou não, nem sempre isto necessariamente pode ocorrer.
Tais instrumentos ou objetos científicos que podem ser utilizados no ensino de
disciplinas científicas têm valor relevante como artefatos da cultura material de uma dada
instituição ou escola.
Fabricados em diferentes épocas, estes artefatos, no contexto de práticas didático-
pedagógicas em disciplinas científicas, podem ser relacionados a programas, instruções
metodológicas e propostas para o ensino de Ciências, formulados em diferentes momentos da
História da Educação, correspondem a diversos enfoques dados à experimentação ao longo do
tempo juntamente às disciplinas científicas escolares (ZANCUL, 2010).
Para esta autora, a constituição de inventários e catálogos de instrumentos científicos
antigos para o ensino das disciplinas científicas vem sendo proposta por diversas instituições
e por pesquisadores preocupados com a conservação e divulgação de um patrimônio valioso
para o estudo da história do ensino de Ciências. Também destaca que a organização de
coleções de instrumentos científicos e o estudo destas coleções constituem um campo amplo
de investigação para a história da ciência e do ensino das disciplinas da área de Ciências. Isto
é reforçado por Costa e Sousa (2009), que apontam para a necessidade da implementação, nos
museus de ciência, de práticas educativas que relacionem a História da Ciência aos conteúdos
científicos e técnicos envolvidos nos objetos do acervo.
Com isso, percebe-se uma relevância cada vez maior nos museus de ciência, na
apresentação de objetos históricos, pois estes podem atuar como:
pontes entre os conteúdos científicos e a história, a filosofia e a sociologia da
ciência, que por sua vez humanizam a ciência e a aproximam dos interesses
éticos, culturais e políticos dos indivíduos, além de tornar seus assuntos mais
estimulantes e reflexivos, incrementando assim as capacidades do
pensamento crítico. [...] A particularidade dos objetos históricos está em
serem capazes de portar sentido estabelecendo uma mediação de ordem
existencial entre o visível e o invisível, outros espaços e tempos, outras
faixas de realidade. (COSTA; SOUSA, 2009, p. s/n).
Alguns autores têm refletido sobre a função de objetos históricos autênticos
(MENEZES, 2005; JACOMY, 2007). Para o primeiro deles, o papel desses objetos é
significar o tempo e para o segundo, a função é carregar significados ou sentidos singulares e
próprios, de modo a sintetizar um fator emocional e um fator de despertar a curiosidade de
outros. É, portanto, uma base para a rememoração do patrimônio cultural científico.
OS OBJETOS NOS MUSEUS DE CIÊNCIAS E INSTITUIÇÕES ESCOLARES
De acordo com Figueroa e Marandino (2009), os museus são espaços culturais e
educativos. Marandino (2001) caracteriza os museus como espaços de produção, educação e
divulgação do conhecimento. Destaca que, não obstante, a relação dos museus com as escolas
configurou-se, ao longo dos anos, de forma quase ‘permanente’, o que faz com que esse
público seja prioritário em muitas instituições museais. As possibilidades culturais e didáticas
desses espaços e novas demandas políticas e sociais têm ajudado a compor um panorama em
que os museus são parceiros da instituição escolar (FIGUEROA; MARANDINO, 2009).
Pereira et al. (2007), admitem que os museus de ciência tem uma intenção de educar por meio
da sensibilização e cultivam a comunicação e produção de significados a partir de seus
objetos, exposições, propostas educativas e outras.
No entanto, os objetos conferem um custo elevado aos museus e as instituições
escolares e são antigas as discussões sobre sua importância, o seu papel e as suas
características (MARANDINO, 2012). Acrescenta-se a isto, as novas possibilidades que estas
instituições têm em função do desenvolvimento de novas tecnologias da informação e
comunicação, a exemplo das experiências dos museus virtuais e com a introdução dos objetos
interativos e participativos nas exposições (MARANDINO, 2001).
Em se tratando de coleções científicas, os artefatos mais comuns nos museus vão
desde objetos científicos; espécimes naturais; equipamentos e maquinário; peças
arqueológicas e etnográficas; dispositivos interativos, dentre outros. Segundo Souza (2012), é
possível encontrar diferentes formas de leitura e compreensão acerca da maneira como esses
objetos se encontram divididos e/ou classificados em um museu.
A título de ilustração, é apresentada aqui a perspectiva de Lourenço (2000), que
propõe um sistema de classificação de objetos para museus de ciência e técnica, e nele três
grandes tipos de objetos são propostos: i) objetos científicos, que foram construídos com o
propósito de investigação científica; ii) objetos pedagógicos, que foram construídos com o
propósito de ensinar ciência; iii) objetos de divulgação da ciência, que foram construídos com
o propósito de apresentar os princípios da ciência a um público mais vasto (LOURENÇO,
2000).
Inseridos no contexto de coleções científicas dos museus e instituições escolares, tais
objetos e coleções têm um papel crucial na missão educativa destas instituições, que são
quase sempre de ordem estatal ou governamental, ou seja, de transmitir uma imagem linear de
inovação e progresso, capazes de conduzir aos “triunfos contemporâneos do capitalismo”
(BENNETT, 1995, p. 77).
Lourenço (2000) discute a natureza dos objetos nos Museus de Ciência e Técnica e
segue a definição de objeto fundamentada em Mensch (1992) que considera o objeto com
identidade própria e por isso passível de reconhecimento e é também o menor elemento de
cultura material. Para Lourenço (2000), entende-se que a cultura material é constituída pelo
ambiente habitado e modificado pelo homem através de comportamentos e condicionantes
culturais. Os objetos de museus são, por definição e obrigação, fonte de informação. Não se
trata de meros objetos, mas sim de objetos autênticos extraídos de uma determinada realidade
com o objetivo de documentá-la. Neste sentido, para Lourenço (2000), não há problemas com
a identificação entre os objetos que comumente aparecem nos museus “tradicionais” de
ciência e tecnologia como objetos de museus, o que não ocorre com aqueles que geralmente
estão presentes nos centros de ciência ou instituições escolares.
É importante enfatizar que, para esta autora, do ponto de vista museológico, os objetos
pedagógicos se aproximam tanto dos de divulgação quanto dos científicos, sendo assim
Marandino (2012); Figueroa e Marandino, (2009), defendem que é urgente o
desenvolvimento de uma “teoria do objeto em Museus de Ciência e Técnica”. No sistema de
classificação de Lourenço, os atributos “valor histórico” e “participatividade” ou
“contemplação” são transversais, podendo ser encontrados em qualquer objeto.
OBJETOS CIENTÍFICOS NO INSTITUTO DE BIOLOGIA (IBio) DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA (UFBA)
O Instituo de Biologia (IBio), foi criado em 08 de fevereiro de 1968, quando da
reforma Universitária, em consonância com a Lei 5.540/68 e Dec. 62.241/68, publicado, no
Diário Oficial da União. Nasceu da antiga Faculdade de Filosofia, no tradicional bairro de
Nazaré, na cidade de São Salvador (BA). Teve sua sede instalada no prédio construído no
Campus Universitário de Ondina e inaugurado no dia 04 de julho de 1971.
O IBio/UFBA é constituído por três Departamentos: Biologia Geral; Botânica e
Zoologia e originalmente foi composto por professores oriundos das Faculdades de Filosofia e
Farmácia e das Escolas de Agronomia e de Medicina Veterinária de acordo com as suas áreas
de atuação e especialidades.
No segundo semestre de 1969, o Curso de História Natural, da Faculdade de Filosofia
e Ciências Humanas, criado em 1946, foi revisto e transformado em Curso de Ciências
Biológicas. A partir de então, o Instituto de Biologia centralizou e uniformizou o estudo da
Biologia em disciplinas, considerando o seu aspecto básico, e nas pesquisas biológicas de
diversas áreas (http://twiki.ufba.br/twiki/bin/view/Biologia/WebHome).
Em sua infraestrutura física e material, o IBio comporta o Museu de História Natural
da Universidade Federal da Bahia, que abriga um acervo de coleções científicas do Museu de
Zoologia e do Herbário Alexandre Leal Costa. Além disso, existe uma coleção de objetos
científicos e tecnológicos disposta nos corredores e instalações laboratoriais do instituto e que
constitui uma proto-coleção (figura 1).
Esta proto-coleção foi organizada pela Professora Dra. Rejâne Lira da Silva e surgiu
pelo interesse da pesquisadora em preservar o patrimônio cultural científico e tecnológico do
IBio. É nesta proto-coleção que se encontra a Balança de Sartorius (balança analítica de dois
pratos com gabinete), objeto de análise neste trabalho. Além de analisar tal objeto, interessa-
nos averiguar a história da produção do artefato e sua relação com práticas de laboratório na
pesquisa e na educação científica.
Essas coleções são constituídas por objetos que resistiram ao tempo com suas
intempéries e situações como substituição, abandono e sucateamento e foram guardados por
pessoas, motivadas por alguma razão, lhes atribuindo valores afetivos ou científicos
(LOURENÇO, 2009). Segundo a autora, só quando esse material é reunido e organizado em
conjunto, quando passa a retratar e ser entendido como vestígios materiais da memória
institucional e passam a receber cuidados em relação a sua guarda e preservação é que
constituem uma coleção.
De acordo com Lourenço e Gessner (2012), a vida típica de objetos científicos
envolvem três etapas ou fases. Embora simplificado aqui, este processo é dinâmico e
complexo: Objetos ou artefatos podem coexistir fisicamente em diferentes fases. Assim tem-
se: A Fase I pode ser designada "Uso regular". Em uma universidade, em um laboratório de
pesquisa, um hospital ou uma escola, os instrumentos são adquiridos ou desenvolvidos e
usados para um determinado fim (ensino, pesquisa, inovação, demonstração, entretenimento,
ou uma combinação de efeitos). A Fase II começa quando um dado objeto é considerado
obsoleto e substituído por um que tem um desempenho melhor, mais exato e preciso. Na Fase
II, denominada ‘limbo’, várias coisas podem acontecer a um instrumento: por exemplo, pode
ser mais desenvolvido, embora a melhoria do projeto ou inovação técnica se volte ao estágio
I, com a mesma finalidade, mas também pode retornar a Fase I com um propósito diferente,
por exemplo: rebaixado de pesquisa ao ensino, que pode ser utilizado como peça para outros
instrumentos, mas também pode ser posta de lado no laboratório ou gabinete e permanecer em
algum lugar meio esquecido entre a “vida e a morte”. Os últimos serão os primeiros a ser
considerados prontos para se juntar ao Estágio III, designado como fase de ‘eliminação’. Na
Fase III, os objetos científicos são considerados inúteis e são fisicamente removidos da sua
localização original para um sótão ou um porão, por exemplo. Seu destino final é o lixo, ou
uma coleção, ou um museu.
Figura 1. Proto-coleção de objetos científicos e tecnológicos nos corredores do IBio/UFBA. Seta indicando a
localização da Balança de Precisão Antiga com gabinete, estudada neste trabalho. Foto: Marsílvio Gonçalves
Pereira (Dezembro de 2013).
METODOLOGIA DE ESTUDO
O estudo do objeto ou artefato consistiu inicialmente de algumas tarefas: localização
física da proto-coleção; verificar se o objeto foi inventariado, coleta de dados sobre o objeto e
realização de registros fotográficos. Para isso foram tomadas orientações de Lourenço,
Pascoal e Teixeira (2011) e utilizou-se de uma ficha de inventário como comentada por
Granato et al. (2013). Também foi realizada uma entrevista não gravada com a professora
Dra. Rejâne Maria Lira da Silva do IBio/UFBA com base em um roteiro semi-estruturado.
Nas pesquisas sobre os métodos de estudos de artefatos na literatura são encontrados
como modelos, o método de Fleming (1974) e o método de Gessner (2008) como citados por
Lourenço e Gessner (2012).
O objetivo de Fleming foi propor um modelo para orientar o estudo de objetos em
museus. Um de seus objetivos consiste em fazer esta tarefa proposital e consciente através da
introdução de distinções claras entre as propriedades de artefatos e nossos modos de olhar
para elas através das seguintes operações: (1) análise do artefato (a partir da observação a olho
nu a uma micro-análise); (2) comparação do artefato com outro semelhante; (3) análise
cultural (estabelecimento de ligações entre o artefato e sua cultura original); e (4)
interpretação (estabelecimento de ligações entre a cultura que originou o artefato e as
audiências atuais). Segundo Granato e Lourenço (2010) embora Fleming tenha elaborado essa
proposta há mais de 40 anos, o seu uso difundido em várias disciplinas e as muitas discussões
e adaptações que sofreu, são uma medida clara do seu sucesso.
O modelo proposto por Gessner visa desdobrar perguntas sobre objetos que são
complexos e exigem métodos distintos para serem respondidas. Também procura abordar as
relações com as teorias científicas implícitas ou explícitas em instrumentos científicos. Este
modelo baseia-se na premissa de que duas distinções precisam ser feitas durante o estudo:
primeiro, uma distinção entre o instrumento individual (por exemplo, um determinado
microscópio) e a classe de instrumentos que partilham a mesma designação (a classe de
microscópios), em outras palavras, uma distinção entre o singular e seus aspectos típicos e,
segundo, uma distinção entre os aspectos sincrônicos (resultante da inspeção direta dos
instrumentos existentes) e aspectos diacrônicos (relativos à história). Gessner chama os
primeiros de dicotomia - classificação e os últimos de dicotomia - temporal. Eles dividem o
universo de questões em quatro quadrantes. Todas as perguntas formuladas durante o estudo
do objeto são mutuamente dependentes e igualmente importantes para a nossa compreensão,
mas elas são de natureza diferente, dependendo, portanto, de diferentes tipos de fontes o que
exige métodos diferentes para serem respondidas.
Os quatro quadrantes combinados proporcionam um programa de pesquisa que
consiste em quatro tarefas paralelas e interdependentes: (1) o estudo do objeto ou artefato de
modo individual ou autêntico; (2) a sua biografia; (3) o grupo de objetos sobreviventes
similares e sua função científica; (4) narrativas locais e globais na história da ciência em que
tal objeto desempenhou um papel. Este modelo tem sido utilizado para documentar os
instrumentos "reais" e, mais amplamente, instrumentos de documentos do acervo de Museus.
O método a ser utilizado nesse estudo foi o de Gessner (2008), utilizando a peça como
fonte primária e fontes documentais como fontes secundárias.
Buscamos como fontes documentais artigos que tratassem da história da Balança
Analítica de Sartorius (balança analítica de dois pratos com gabinete), a exemplo de Afonso e
Silva (2004) e Moreira (2005).
UMA BREVE HISTÓRIA DA BALANÇA ANALÍTICA DE DOIS PRATOS COM
GABINETE – PATRIMÔNIO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO
Afonso e Silva (2004) descrevem a evolução da balança analítica com base no seu
aprimoramento técnico. Eles confirmam que este instrumento tem sido sempre utilizado para
fins comerciais e industriais, mas o seu valor na pesquisa científica e na Química foi
reconhecido apenas muito mais tarde. O modelo clássico foi o de dois pratos em equilíbrio
por cerca de 40 séculos, mas quando a sua importância na química foi estabelecido,
particularmente a partir do final do século XVIII, muitas melhorias foram realizadas com
vista a aumentar a sensibilidade e reduzir o processo de pesagem. O design do equilíbrio
mudou muito ao longo do Século XX: os modelos de dois pratos clássicos foram substituídos
por balanças de um prato ou bandeja que foram substituídos por instrumentos eletrônicos.
A balança é um objeto que serve para determinar a massa de um dado corpo, que é
uma propriedade intrínseca do corpo. Como grandeza escalar não varia conforme o local onde
o corpo se encontre e sua unidade no Sistema Internacional de Medidas (SI) é o quilograma
(kg).
Este objeto tem como princípio mecânico de funcionamento o seguinte: como é
empregada numa operação de pesagem que é realizada pela comparação direta entre um
objeto de massa conhecida (pesos) e outro de massa desconhecida (corpo ou substância que se
deseja a medida), a balança funciona como uma alavanca. Existem três tipos de alavanca:
interfixa, inter-resistente e intermotriz. Para efeito de descrição das características essenciais
da balança, o interesse maior é no funcionamento da alavanca interfixa, onde o ponto de apoio
situa-se entre a força motriz e a resistência.
Então, a condição de equilíbrio nas alavancas é um dispositivo de referência na
pesagem, diz-se que um corpo está em equilíbrio mecânico quando duas condições são
obedecidas: a resultante das forças que agem sobre o corpo deve ser nula e o momento
resultante das forças que agem sobre o corpo também deve ser nulo.
A teoria da balança foi um tema abordado desde a Grécia antiga por Aristóteles, mas
foi somente desenvolvida em 1747, por Leonhard Euler (1707-1783), matemático e físico
suíço. Retomada por Dimitri Mendeleev (1834-1907) nos anos de 1870. O resultado de seus
cálculos mostrou que uma exatidão de 1/15 mg com uma carga de 1 kg podia ser obtida com
um tamanho de travessão até quatro vezes menor que os instrumentos da ocasião, resultado
Description:éticos, culturais e políticos dos indivíduos, além de tornar seus assuntos mais estimulantes e .. Multimondes, Montreal, 2012, p.99-120. MARTINS