Table Of Content1ª edição
Rio de Janeiro
2020
Copyright © Eduardo Moreira, 2020
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
Moreira, Eduardo
M837e Economia do desejo [recurso eletrônico]: a farsa da tese neoliberal / Eduardo Moreira;
[texto de orelha Betto]; [prefácio Luiz Gonzaga Belluzzo]. – 1. ed. – Rio de Janeiro:
Civilização brasileira, 2020.
recurso digital
Formato: ePub
Requisitos do sistema: Adobe Digital Editions
Modo de acesso: World Wide Web
ISBN 9788520014158 (recurso eletrônico)
1. Economia. 2. Consumo (Economia) – Aspectos sociais. 3. Capitalismo. 4.
Neoliberalismo. 5. Livros eletrônicos. I. Betto. II. Belluzzo, Luiz Gonzaga. III. Título.
20-63994 CDD: 330.122
CDU: 330.142.1
Leandra Felix da Cruz Candido – Bibliotecária – CRB-7/6135
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, o armazenamento ou a transmissão de partes deste
livro, através de quaisquer meios, sem prévia autorização por escrito.
Texto revisado segundo o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
Direitos desta edição adquiridos pela
EDITORA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA
Um selo da
EDITORA JOSÉ OLYMPIO LTDA.
Rua Argentina, 171 – Rio de Janeiro, RJ – 20921-380 – Tel.: (21) 2585-2000.
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Produzido no Brasil
2020
SUMÁRIO
Prefácio
Introdução
1. A lógica capitalista
2. A economia do desejo
3. O Estado e a economia da necessidade
4. A economia do ódio
5. Conclusão — paz e guerra
Dedico este livro a Juliana, Francisco, Catarina e Maria Eduarda, onde busco
força e serenidade para seguir adiante.
PREFÁCIO
Luiz Gonzaga Belluzzo
Abrigado nas trincheiras domésticas para escapar da mortal artilharia do
Coronavírus, recebi um gentil telefonema de Eduardo. Sempre descontraído
em seu sotaque carioca que me desperta agradáveis lembranças dos anos de
Colégio Santo Inácio, Eduardo sugeriu que eu assumisse o encargo de escrever
o prefácio de seu novo livro.
O título Economia do desejo suscitou a esperança de encontrar uma
narrativa que escapa aos espartilhos que aprisionam a “razão econômica” nos
calabouços de teorias ignorantes da complexidade da ação humana na
sociedade dos indivíduos. Foi, de fato, o que encontrei.
O espartilho é a fábula do indivíduo racional e maximizador da utilidade.
Nas versões eruditas ou nas traduções vulgares, a hipótese da racionalidade
individual é um pressuposto metafísico da ideologia dominante, necessária para
apoiar a “construção” do mercado como um servomecanismo capaz de
conciliar os planos individuais e egoístas dos agentes.
Para esse paradigma, a sociedade onde se desenvolve a ação econômica é
constituída mediante a agregação dos indivíduos, articulados entre si por nexos
externos e não necessários, tais como os que atavam Robinson Crusoé a Sexta-
Feira.
Ainda no alvorecer do século XVIII, A fábula das abelhas , de Bernard de
Mandeville, buscou a sociedade ideal trafegando na faixa da moral
individualista, racionalista e utilitarista. Vícios privados, virtudes públicas.
Mandeville conta a história de uma colmeia próspera e progressista, ambiente
em que prevaleciam os vícios egoístas de todos as habitantes, incluído o roubo
do produto alheio. Esse comportamento foi interceptado, em certo momento,
pela nostalgia da moral cristã, a nostalgia da virtude. As abelhas resolveram
retroceder, voltar à prática da virtude. A prosperidade se converteu na
decadência.
Voltaire acolheu ironicamente as peregrinações de Leibniz e Mandeville.
No Cândido, ou O otimismo , o ilustre iluminista encarregou o professor
Pangloss de justificar as múltiplas formas do mal: “Tudo isso era indispensável
[...]; infortúnios particulares fazem o bem geral.” Isso permitiu que Cândido
formulasse uma definição da filosofia de Pangloss: é preciso dizer que está tudo
bem quando as coisas andam mal.
Já no primeiro capítulo do livro, Eduardo oferece aos leitores a narrativa de
um episódio revelador das insidiosas práticas pseudocientíficas que abarrotam o
mundo contemporâneo. Ao ministrar uma aula na Casa do Saber, foi
interpelado por um cavalheiro de fino trato a respeito das críticas do
palestrante ao neoliberalismo. O gentil cavalheiro manifestou sua discordância
de forma cortês. Seu argumento foi ilustrado com o sucesso inequívoco das
economias da Holanda, Dinamarca, Suécia, Noruega, Finlândia, Canadá.
Nos debates corriqueiros com amigos e colegas neoliberais, Eduardo era
frequentemente contraditado com a exibição do ranking dos países mais bem-
sucedidos. Esse ranking era construído a partir de um índice elaborado pela
Heritage Foundation, conhecida e reconhecida por sua filiação aos princípios
do liberalismo econômico. Cito Eduardo: “O índice mais utilizado para definir
o grau de ‘liberdade econômica’ de um país e embasar as teses neoliberais leva
este mesmo nome: Index of Economic Freedom . Um índice elaborado e
calculado por uma fundação americana chamada Heritage, que na primeira
página de seu site define sua missão como ‘formular e promover políticas
públicas conservadoras baseadas nos princípios do livre mercado, Estado
mínimo, liberdades individuais, valores tradicionais estadunidenses e
fortalecimento da defesa estadunidense’.”
Surpreso com a afirmação peremptória do cavalheiro elegante, Eduardo
empenhou-se em examinar de forma mais acurada a construção do índice de
liberdade econômica e descobriu que nos bastidores da precisão estatística
abrigava-se uma fraude conceitual.
“Percebe-se, ao final da análise, que o índice funciona como uma ‘conta de
chegada’, criada para atribuir aos países mais ricos e desenvolvidos o rótulo de
‘livres’ ou ‘majoritariamente livres’ economicamente, e gerar uma relação
enviesada e equivocada nas pessoas de relação de causa e efeito, num típico
exemplo da falácia cum hoc ergo propter hoc (se ambos acontecem juntos, um
causa o outro).”
Ao ler as considerações mencionadas, a respeito da construção do índice,
recorri à psicanalista francesa Élisabeth Roudinesco, autora, entre outras obras,
de uma imperdível biografia de Sigmund Freud.
Exímia em percorrer os caminhos perigosos da filosofia e da psicanálise,
Roudinesco ausculta, na aurora do século XXI, rumores cochichados nos
bastidores da sociedade contemporânea. Descobre que a sociabilidade
competitiva de nossos tempos entrega razão a Mandeville.
Diz Roudinesco que estamos sempre nos indagando o que preferimos: as
figuras mais puras, as maiores, as mais medíocres, as mais charlatãs, as mais
criminosas? Classificar, ranquear, calcular, medir, colocar um preço,
homogeneizar: esse é o nada absoluto das investigações contemporâneas,
impondo-se sem limites em nome de uma modernidade falsa que solapa todas
as formas de inteligência, como a crítica fundamentada na análise da
complexidade das coisas e das pessoas.
Roudinesco desvela os desencantos da sexualidade pós-moderna. “Nunca a
sexualidade foi tão desenfreada, e nunca a ciência avançou tanto na exploração
do corpo e do cérebro. No entanto, nunca o sofrimento psicológico foi tão
intenso: solidão, uso de drogas que alteram a mente, tédio, fadiga, dieta,
obesidade, medicalização de cada segundo da existência. A liberdade do eu, tão
necessária, e conquistada à custa de tanta luta durante o século XX, parece ter
se transformado em uma demanda por contenção puritana.”
Quanto ao sofrimento social, diz Roudinesco, é cada vez mais difícil de
suportar, porque parece estar constantemente em ascensão, num contexto de
desemprego juvenil e trágicos fechamentos de fábricas. O sexo não é
experimentado como o companheiro do desejo, mas como um desempenho,
uma ginástica, como a higiene para os órgãos, o que só pode levar à confusão
afetiva. “Qual é o tamanho ideal da vagina, o comprimento correto do pênis?
Com que frequência? Quantos parceiros em uma vida, em uma semana, em
um único dia, minuto a minuto?” O avanço exasperado da “quantidade”
encolhe o espaço de fruição da experiência amorosa. Não por acaso, estamos
assistindo a um aumento nas queixas de todos os tipos.
Ainda no primeiro capítulo, Eduardo recorre a Facebook, Google e demais
gigantes da Internet para nos proporcionar uma análise excelente a respeito do
processo de concorrência no capitalismo de todos os tempos. No capitalismo