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ANDRÉ GOMBAY
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INTRODUÇÃO
G631d Gombay, André.
Descanes Lrecurso eletrônko] / André Gombay ; trJdução
Lia Levy. - Dados eletrônkos. - ~no Alegre : Artrned, 2009.
Editado também como livro impresso em 2009.
ISBN 978-85-363-1871-4
1. Filosofia - Descartes. L Título.
CDU l
Catalogação na publicação: Renata de Souza Borges - CRB·lO/Prov-021/08
descartes
ANDRÉ GOMBAY
Professor na Universidade de Toronto, Canadá.
Consultoria, supervisão e tradução desta edição:
Lia Levy
Mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Doutora em História da Filosofia Moderna pela
Universidade de Paris IV (Paris-Sorbonne).
Professora Adjunta na Universidade federal do Rio Grande do Sul.
Versão impresssa
desta obra: 2009
2009
Obra originalmente publicada sob o tíntlo Descartes
ISBN 978-0-631-23345-9
©André Gombay, 2007.
This edition is publishcd by arrangement with Blackwcll Publishing Ltd, Oxford.
Translated by Artmed Editora S.A. from the original English language version_
Rcsponsibilicy of the accuracy of the translation rcst solcly with Artmed Editora S.A.
and is not the responsibilicy of Blackwcll Publishing Ltd.
Capa
Tatiana Sperhacke
ilustração da capa
Gerry lmages
Preparação do original
Elliângela Rosa dos Santos
Leitura final
Marcos Vinicius Martim da Silva
Supervisão editorial
Mônica Ballejo Canto
Projeto e editoração
Armazém Digital Editoração Eletrônica - Roberto Vieira
Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, à
ARTMED"EDITORA S.A.
Av. Jerônimo de Omclas, 670 - Santana
90040-340 Porto Alegre RS
Fone (51) 3027-7000 Fax (51) 3027-7070
SÃO PAULO
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Fone (11) 3665-1100 fax (11) 3667-1333
SAC 0800 703-3444
IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED lN BRAZIL
Para B.
SUMÁRIO
Prefácio .............................................................................................................................................. 9
1. Vida e obras ........................................................................................................................... 15
2. Desconfiança e engano .......................................................................................................... 32
3. Eu e os outros ......................................................................................................................... 56
4. Eu e meu criador .................................................................................................................... n
5. Engano e direitos ................................................................................................................. 106
6. ldealiza~o ........................................................................................................................... 125
7. Realmente distinto ............................................................................................................... 147
8. Autoestima ........................................................................................................................... 169
Referênáas ..................................................................................................................................... 187
Índice Onomástico .......................................................................................................................... 189
Índice Remissivo ............................................................................................................................. 191
PREFÁCIO
Maio de 2001: uma amiga norueguesa - que não é filósofa- acaba de
nos escrever uma carta, um canto em homenagem ao retomo da primave
ra. Ela conclui: "Que sorte tenho de, diferentemente de Descartes, não
precisar pensar para ser!". A observação é sincera e não surpreende, pois é
apenas mais um testemunho de que uma certa máxima de Descartes é
uma das mais famosas da filosofia; de fato, uma das frases mais famosas já
pronunciadas. Curiosamente, ela se assemelha a um outro monumento da
nossa cultura, a Mona Lisa. Ela também tem uma face tranquila e um
sorriso secreto, um presságio de profundezas inescrutáveis. Ela também
afeta intensamente as pessoas, produzindo reações que vão além da avali
ação intelectual e estética. Máxima e pintura evocam, igualmente, uma
compulsão a criticar, a denegrir, a destruir ou a parodiar. Nossa amiga
norueguesa regozija-se por ser livre de tão enfadonha restrição; os que
veem a Mona Lisa dizem "e dai?" ou que atiram na tela. Não temos todos
visto a Mona Lisa ser pintada como uma bruxa? Ou com um bigode? Ou
piscando? Não cruzamos constantemente com paródias da frase cartesiana?
"Corro, Jogo existo" ou (para os acadêmicos), "Escrevo, Jogo existo", ou
ainda "Sou culto, Jogo existo". E tantas outras incontáveis.
Não são nem mesmo apenas estas cinco palavras de Descartes - o
cogito,* como são comumente chamadas - que provocam essas reações:
sou quase levado a dizer que é, o próprio Descartes, e não apenas quando
ele é lido por filósofos. Há alguns anos, após uma cirurgia de câncer, mi
nha esposa decidiu não seguir o conselho do cirurgião para se submeter à
• N. de T. Termo em latim no original que significa, literalmente, "penso"; contudo, está
sendo aqui empregado para designai; como se tomou costume entre os estudiosos da
filosofia de Descartes, a frase "Eu penso, logo cu existo", que ocorre na obra cartesiana,
em francês, na quarta parte do Discurso do Método ("Je pense, doncjesuis"), e em latim
("Ego cogico, ergo sum") no artigo 7" da primeira parte dos Prinápios da filosofia.
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André Gomboy
quimioterapia corno tratamento suplementar e mesmo, talvez, à radiação.
Em vez disso, optou por um regime que dava ênfase ao relaxamento, à
conscientização de si e à meditação - urna maneira de lidar com a saúde
que costuma ser chamada de holista. Ora, graças à decisão de minha espo
sa, fui Jogo iniciado em um novo idioma: nos círculos que ela passou a
frequentar, o modo comum de se referir à abordagem médica a que ela
renunciou consistia em chamá-la de medicina cartesiana.
Eis aí mais um exemplo de um "diferentemente de Descartes ... ": tal
vez, "diferentemente de Descartes, eu não preciso pensar para ser saudá
vel". E, estranhamente, esse novo distanciamento combina bem com o
anterior- ele é, poder-se-ia dizer, quase o outro lado da mesma moeda. Se
você sustentar (tal como nossa amiga norueguesa) que há mais em você
do que apenas pensar, você pode também sustentar (tal como os terapeutas
holistas) que há mais no seu corpo do que apenas engrenagens. Você pode
ria raciocinar da seguinte maneira. "O mero pensar não esgota o que sou;
outras coisas estão também envolvidas, corno os sentimentos, por exem
plo. E, certamente, eles estão muito mais entrelaçados ao que ocorre no
meu corpo. Portanto, meu corpo não pode ser algo que eu simplesmente
possuo, no mesmo sentido em que possuo meu carro. E, pela mesma ra
zão, impedir que o câncer se espalhe pelo meu corpo não pode ser corno
impedir que a poeira se espalhe pelo meu carro. Não obstante, é exata
mente assim que Descartes (e meus cirurgiões) pensam."
Eles realmente pensam assim? E Descartes, era assim que ele pensa
va? Como veremos não é, de modo algum inconteste, que ele deva ser
rotulado por essa crença. De fato, ele realmente disse coisas nesse sentido:
por exemplo, comparou o seu corpo a um relógio; mas também disse ou
tras coisas diferentes - tais como afirmar à Princesa Elizabeth que ela não
se livraria de suas febres antes de "tornar sua alma feliz". 1 É interessante
que, apesar disso, ele tenha sido tão categoricamente marcado pela opi
nião pública como um intransigente. As acusações tampouco acabam por
aí - permitam-me mencionar mais uma ou duas, restringindo-me a episó
dios de minha vida pessoal. Há poucos meses, ao ouvir que eu estava tra
balhando neste livro, meu vizinho Clive zombou: O homem que disse
'~!
que está certo bater em seu cão!". Mais uma vez, não se trata de um rótulo
novo. Em 1650, um visitante da Escola de Port-RoyaJ• relata que as crian-
· N. de T. Port-Royal era, inicialmente, um convento beneditino, fundado em 1204 e
localizado em Magny-les-J-Iameaux, a sudoeste de Paris. Depois, passou a seguir as
regras da ordem cisterciense, mas se tomou famoso a partir de 1609, quando sua
disciplina foi reformada pela abadessa Marie Angélique Arnauld, sob a direção espiri
tual de Saint-Cyr, um defensor do jansenismo. O convento tomou-se, então, refúgio de
estudo e meditação de alguns intelectuais influentes, como Antoine Arnauld. Nesse
período, foi aberta a escola a que se refere o auto~