Table Of ContentFicha Técnica
Copyright © 2014 Pedro Mendonça Burgos Todos os direitos reservados.
Diretor editorial: Pascoal Soto
Editora executiva: Tainã Bispo
Produção editorial: Pamela J. Oliveira, Renata Alves, Maitê Zickuhr Diretor de produção gráfica: Marcos Rocha Gerente de produção
gráfica: Fábio Menezes
Preparação de texto: Marleine Cohen Revisão: Iracy Borges
Capa: Mateus Valadares
Ilustração de capa: Stefano Marra
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Angélica Ilacqua CRB-8/7057
Burgos, Pedro
Conecte-se ao que importa : um manual para a vida digital saudável / Pedro Burgos. – São Paulo : LeYa, 2014.
Bibliografia
ISBN 9788580447583
1. Tecnologia da informação 2. Redes de relações sociais 3. Internet 4. Tecnologia e civilização I. Título
13-1047 CDD 004.6
Índices para catálogo sistemático: 1. Internet – aspectos sociais
2014
Texto Editores Ltda.
[Uma editora do Grupo LeYa]
Rua Desembargador Paulo Passaláqua, 86
01248-010 – Pacaembu – São Paulo – SP
www.leya.com.br
Dedicatória
Para Nina, por todo o amor. Para meu pai, por me ensinar o valor de
conhecer melhor a tecnologia. E a minha mãe, por me inspirar a
compreender e amar as pessoas.
Apresentação
“A gente devia fazer isso mais vezes.”
É a minha e possivelmente a sua despedida padrão, parecida com o “vamos
combinar outro dia”. É uma frase que eu ouvi e me peguei falando ou pensando
inúmeras vezes nos últimos anos. Em várias situações: depois de um jantar com
amigos em casa, de uma peça de teatro sensacional, de assistir a um desses
filmões de cinema com amigos que apreciam os mesmos heróis, depois de uma
manhã no parque jogando basquete com estranhos, de ler um romance incrível
ou de ficar sozinho apreciando a grandiosidade da natureza. Inevitavelmente,
depois de coisas legais assim, é o que eu penso. E se estou com alguém, o meu
sorriso é sempre correspondido: “É, precisamos”.
Comecei a perceber que há algo que une as experiências que “precisamos fazer
mais vezes”, as que ficaram na memória com detalhes e gosto de quero mais: são
coisas, digamos, reais, em lugares reais, que você pode apreciar não apenas com
os olhos, mas com todos os sentidos. Seja com outras pessoas ou sozinho,
prestando toda a atenção. Isso parece óbvio, se pararmos para pensar. Mas por
que, então, estamos favorecendo – inconscientemente ou não – a realidade
mediada pelas telas de diversos tamanhos, que nos acompanham desde que
acordamos até pouco antes de dormir?
Nos últimos anos, vivi alguns episódios bem interessantes, que aconteceram
diante do computador ou da telinha do celular, mas, quando parei para
contabilizar os melhores momentos da minha vida recente e pedi para outras
pessoas fazerem o mesmo, percebi que as novas tecnologias nunca estiveram em
primeiro plano, por mais conectada que a pessoa estivesse. Daqui a alguns anos,
não vou lembrar se a longa conversa que tive com um amigo outro dia foi
combinada pelo Facebook ou por telefone, se usei o Google Maps para chegar ao
local ou se o aparelho que tinha em mãos quando vi a mensagem “estou
chegando” era um Android ou um iPhone. As novas tecnologias estavam lá o
tempo todo, e elas são importantíssimas. Mas elas são mais importantes quando
nos conectam ao que importa.
A “boa tecnologia é a que está basicamente invisível”, diria Steve Jobs. O
objetivo de todo o aparato tecnológico é (ou deveria ser) servir como meio para
crescermos como pessoas, não como um fim em si. Passamos da era do
computador pessoal para a do computador íntimo, o das telinhas que nos
acompanham e nos conectam a tudo e a todos o tempo inteiro. É hora de colocar
o smartphone sobre a mesa, no silencioso, e refletir sobre o que ele representa.
A vontade de escrever sobre o assunto surgiu no início de 2011, depois da
melhor viagem da minha vida, precedida por alguns momentos de estresse
absoluto, em que passei o tempo todo checando emails no celular e participando
de inúmeras discussões online. Estava de férias, no deserto do Atacama. Longe
da minha cidade e do trabalho, tive tempo de ler livros e artigos que tratavam
dos efeitos de algumas tecnologias sobre as pessoas – e, o mais importante, pude
meditar sobre eles. Comecei a observá-los em mim: conectado, o tempo todo, a
um celular de distância dos amigos e do trabalho, estava mais ansioso, menos
atento, com menos tempo, menos sociável (apesar dos mais de 2 mil amigos nas
redes sociais) e, em última instância, mais gordo.
É difícil dizer que minha vida estava pior “por causa da tecnologia”, pois há
dezenas de benefícios nisso tudo e, convenhamos, temos uma certa tendência em
eleger grandes culpados pelos males da humanidade. Toda geração elege seu
grande mal do século: se hoje existem os “perigos da hiperconectividade”, há 15
anos era lançado um novo livro sobre “como combater o estresse” por dia. E,
durante a gestação do livro, para cada pessoa que reconhecia haver algo de
errado na maneira como lidamos com os nossos aparatos, havia outra para dizer
que o problema “não é da tecnologia, mas das pessoas”. O que é quase certo. A
culpa de recebermos emails de trabalho no fim de semana, quando estamos no
cinema, por exemplo, é da cultura workaholic de chefes sem empatia e da linha
cada vez mais tênue que separa a vida pessoal da profissional. Mas enquanto não
podemos mudar estruturas capitalistas, podemos desligar as notificações do
celular por mais tempo e chegar quase ao mesmo resultado. O ponto aqui não é
demonizar os nossos smartphones, mas entender as consequências de um modo
de viver onde eles são peça fundamental no cotidiano de cada vez mais pessoas,
e como fazer, enfim, para usar a conexão para o que importa.
Há motivos bem estabelecidos e embasados na Ciência para explicar por que
ficamos tão felizes diante de situações que alguns chamariam de reais. Sim,
parece que precisamos que algum cientista explique por que o abraço de alguém
querido é importante (oxitocina!) e por que precisamos sair mais para fora (pela
vitamina D, pelo menos). Da mesma forma, já sabemos agora como o cérebro é
enganado para acreditar que a simulação da realidade – o amigo curtindo uma
foto sua em vez de uma pessoa sorrindo enquanto você relata uma viagem – nos
parece suficientemente legal e nos traz uma efêmera alegria, embora não seja
necessariamente desejável ou sustentável no longo prazo.
Não faltam críticos mais apocalípticos e intelectuais saudosistas acreditando
que estamos caminhando para um futuro inexoravelmente mais triste, mais
solitário e até mais ignorante. É absolutamente verdade que quanto mais usamos
as telas onipresentes, mais a qualidade das relações com o mundo e com as
pessoas muda. Mas o impacto disso ainda está sob o nosso controle – e ele pode
inclusive ser bastante positivo.
Então por que não estamos fazendo “isso” mais vezes? Todos parecem ter uma
desculpa padrão. Talvez ela esteja na sua cabeça agora. É bom tirá-la da frente
logo.
Quando perguntava às pessoas que boas lembranças tinham dos últimos meses
– a fim de entender o que “realmente importa” –, os sorrisos saudosos vinham
com um “falta tempo” dito com um suspiro. Parece que falta. Mas não deveria
faltar. Porque a tecnologia não está acabando com a nossa vida e o nosso tempo,
ela está nos dando mais. Não precisamos mais ir ao banco, ou a um outro setor
da empresa para resolver um problema, largamos mão dos Correios e considero
não ser mais necessário bater perna em lojas de eletrodomésticos para comparar
preços. Pense em todos os serviços delivery que apareceram nos últimos anos, e
como é fácil achar qualquer endereço ou telefone. A internet e os smartphones
nos deram a chance de nos concentrarmos apenas no que importa. A rede nos dá
um mar de possibilidades, e o que fazemos com ela?
Gastamos um terço (e cada vez mais) do tempo online apenas nas redes
sociais, clicamos em sites com notícias desimportantes e vídeos pouco
engraçados e lemos milhares de emails que por algum motivo não caíram na
lixeira. No fim do dia, tal como a peixe Dori de Procurando Nemo, não nos
lembramos do que fizemos. Só sabemos que é tarde, uma vez que, por conta de
tudo isso, acabamos ficando mais tempo nos escritórios, seja para responder
àquele último email, seja para escapar do trânsito.
Mas vamos nos concentrar na vida profissional por um instante: a tecnologia
hiperconectada ao trabalho traz benefícios claríssimos.
Quando penso em como, décadas atrás, os jornalistas tinham de descer ao
centro de documentação para conferir uma única data, enquanto eu uso um
atalho no teclado, faço uma busca no Google e respondo à dúvida com precisão,
sinto que deveria estar escrevendo artigos cada vez melhores e mais profundos,
em menos tempo. Mas não estou. Ao invés disso, caí no conto da multitarefa,
acumulo algumas dezenas de emails por dia e passo horas lendo coisas inúteis.
Em vez de ganhar tempo e profundidade, fiquei mais atarefado e superficial em
mais níveis que gostaria de admitir.
É claro que pessoas diferentes têm níveis de conexão diferentes, mas tenho
certeza de que este livro servirá tanto para quem passa o dia todo com o
smartphone vibrando, cheio de mensagens, quanto para alguém razoavelmente
offline, que está testando a temperatura antes de cair na água. Mesmo quem não
está tão online conscientemente, precisa saber lidar melhor com as telas no
trabalho, já que um número cada vez maior de empregos envolve estar no
computador o dia todo e fazer hora extra com o celular. E quando não estamos
fazendo isso, no trabalho, muitos de nós têm uma telinha de smartphone aberta
no bolso, uma TV “inteligente” na sala, um notebook no quarto ou um tablet
para levar para a cama ou ao banheiro. Se passamos tanto tempo com objetos
tecnológicos conectados, é preciso saber como se relacionar com eles, como não
gastar tempo ou dinheiro demais com eles e como a sociedade precisa se
comportar para não ser engolida pela tecnologia. A informação, os dispositivos e
a conexão estão ágeis demais. É importante avaliar a nossa relação com tudo
isso.
“Você precisa escrever um livro com essas dicas de tecnologia”, era o que
ouvia de amigos, toda vez que indicava um aplicativo que melhorava a vida
cotidiana ou um atalho do navegador para economizar milissegundos. Quando
tive a ideia de escrever este livro, estava no meu terceiro ano como editor-chefe
do Gizmodo Brasil, um blog de tecnologia independente, acessado por mais de
um milhão de pessoas todo mês. Já tinha participado das principais feiras de
tecnologia do mundo, de Las Vegas ao Japão, conhecendo as novidades que
fariam parte do cotidiano das pessoas anos mais tarde. Toda semana, tinha um
gadget novo em casa ou no bolso e testava smartphones, tablets e TVs 3D antes
de eles chegarem ao mercado. Era um trabalho invejável, divertido, que poderia
ser bem aproveitado em um “guia de compras” e dicas, numa versão estendida.
Mas quando eu parei para pensar, a minha necessidade de escrever o livro
vinha justamente do esgotamento do assunto tecnologia. A minha sensação é que
os jornalistas e leitores ficavam muito ligados às especificações do produto (os
gigahertz, polegadas e sistemas operacionais) e deixavam de lado o que
importava na tecnologia: de que maneira ela tornava a vida fora da tela mais
rica. “Tecnologia é um meio, não um fim”, virou o meu slogan oficial. Eu
defendia, por exemplo, a ideia do tablet não por ser ele um “notebook mais
leve”, mas porque com o iPad redescobri minha paixão por histórias em
quadrinhos e pude assinar revistas estrangeiras, além de soltar a imaginação
mexendo com fotos e jogando jogos de tabuleiro com amigos distantes. Mas era
difícil defender essas questões subjetivas perante uma plateia ansiosa por
comparativos técnicos e testes de laboratório, a minha labuta diária no Gizmodo.
E à medida que fui pesquisando para selecionar as maneiras como a tecnologia
enriquecia nossas vidas, quais as melhores ferramentas e programas, passei a
entender melhor a influência deles sobre os nossos comportamentos. Será que o
limite de 140 caracteres imposto às mensagens no Twitter e a opção única de
“gostar” no Facebook mudam de alguma forma o nosso discurso e as nossas
relações? Qual o impacto da multitarefa na nossa produtividade? E o papel das
redes sociais no discurso político e nas manifestações populares de 2013? Existe
algo como uma overdose de informação? A pirataria digital é a popularização da
cultura ou o empobrecimento da arte? Quais os efeitos da memória perfeita do
Google sobre a nossa privacidade? E o vídeogame como aproveitá-lo sem se
viciar? Será que, por causa das novas tecnologias, esta é a “geração superficial”,
como sugeriu Nicholas Carr em seu controverso livro, ou será que estamos
“sozinhos, juntos, e esperamos mais da tecnologia do que das pessoas”, como
prega Sherry Turkle?
Há muitas perguntas no ar e poucas respostas definitivas porque estamos
passando por um daqueles raros momentos da história em que a tecnologia muda
profundamente a vida das pessoas. E de maneira incrivelmente rápida. Das
definições dos transtornos psiquiátricos às regras de etiqueta, tudo está mudando
enquanto você lê estas páginas. Mais importante do que dar soluções para o que
nos aflige nas relações com a tecnologia, quero suscitar reflexões e debates.
Mas o que eu quero mesmo é que, ao final de cada capítulo, você tenha
vontade de dar uma olhada na sua lista de amigos do Facebook, pegue o telefone
e ligue para alguém que não vê há algum tempo, convidando-o para um jantar.
Quero que vasculhe na internet uma receita interessante, prepare uma playlist
que tem a ver com as preferências das suas visitas e as receba em casa, ou saia
para algum bar recomendado naquele aplicativo de smartphone. Experimente
deixar o celular no bolso, tirar fotos mentais, sorrir mais e escrever menos
“risos”. No fim, conte quantos convidados dirão: “Precisamos fazer isso mais
vezes”. Todos nós precisamos.
Introdução
“Cada nova tecnologia é uma reprogramação da
nossa vida sensorial.” – Marshall McLuhan1
Usar ferramentas não é uma exclusividade do ser humano. Outros animais,
como os castores, as formigas e até os polvos são capazes de criar tecnologias
para modificar seu ambiente e aumentar as chances de sobrevivência. Era o que
fazia o nosso parente direto mais antigo, o Homo habilis, que surgiu no Leste da
África há cerca de 2,5 milhões de anos. Ele não era muito melhor que os outros
macacos, mas usava o seu cérebro de 630 cm³ (maior que o dos primatas da
época, mas equivalente à metade do que temos hoje) para jogar pedras em outros
animais e usar ossos e gravetos como ferramentas rudimentares. Os habilis, que
não eram tão habilidosos, viveram assim por 25 mil gerações, até basicamente
sumir do mapa, provavelmente porque não se adaptaram às mudanças climáticas.
Eles precisavam de tecnologias melhores.
Depois da extinção do habilis, que mal andava em pé, outros membros do
gênero homo apareceram, com cérebros cada vez maiores. Algumas ossadas
datadas de até 1,7 milhão de anos atrás mostram que outros “homens das
cavernas” (como o Homo erectus, espécie que veio depois do habilis) estiveram
por toda a parte, da África e Europa até a China. Naquela época e por milhares
de anos depois, as ferramentas dos hominídeos não mudaram significativamente
e os agrupamentos eram pequenos. A tecnologia se limitava aos instrumentos de
caça e ainda não tinham sido inventadas roupas ou mesmo cabanas (a expressão
“homem das cavernas” não existe à toa), o que restringia a colonização a zonas
tropicais e os tornava bastante suscetíveis às mudanças mais drásticas do
ambiente. Os homens e as mulheres daquele tempo comiam os animais que
conseguiam matar e as frutas e vegetais que colhiam. O futuro dos homens das
cavernas não parecia dos mais brilhantes, especialmente porque eles não eram
amigos do meio ambiente: qualquer animal grande e relativamente lento virava
comida e 90% de todas as espécies da megafauna (como o mamute)
desapareceram na época dos nossos ancestrais por falta de consciência
ecológica.
Description:É possível manter uma relação saudável com a tecnologia? Um número cada vez maior de empregos envolve olhar para o computador o dia todo e fazer hora extra com o celular. E quando não estamos fazendo isso, no trabalho, muitos de nós temos uma telinha de smartphone no bolso, uma TV "inteligen