Antonio Alone Maia

206 Pages·2011·1.47 MB·Portuguese

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATOLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP

ANTONIO ALONE MAIA

Saúde e Doença na Cultura Nyungwe:
Um Olhar Antropológico-Teológico

MESTRADO EM TEOLOGIA SISTEMÁTICA

SÃO PAULO
2011
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP

ANTONIO ALONE MAIA

Saúde e Doença na Cultura Nyungwe:
Um Olhar Antropológico - Teológico

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para
obtenção do título de MESTRE em Teologia Sistemática com
concentração em Dogma, sob orientação do Prof. Dr. Pe. Lisâneos
Francisco Prates.

SÃO PAULO
2011
FICHA DE APROVAÇÃO
António Alone Maia
Saúde e Doença na Cultura Nyungwe: Um olhar Antropológico-Teológico.
Dissertação apresentada ao programa de Teologia da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo para obtenção do título de mestre em Teologia Sistemática.
Área de concentração: Dogma
Aprovado em:
Banca examinadora:
Prof. Doutor: ________________________________________________________________

Instituição:_____________________________Assinatura: ___________________________

Prof. Doutor: ________________________________________________________________

Instituição:_____________________________Assinatura: ___________________________

Prof. Doutor: ________________________________________________________________

Instituição:_____________________________Assinatura:____________________________

Prof. Doutor: ________________________________________________________________

Instituição:_____________________________Assinatura:____________________________

Prof. Doutor: ________________________________________________________________

Instituição:_____________________________Assinatura: ___________________________

SÃO PAULO
2011
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha mãe Améria Alone Maia, ao meu pai já falecido Luis
José Maia por terem me educado e ensinado a partir de princípios éticos e morais baseados na
cultura africana: respeito às pessoas e amor ao trabalho. À minha avó paterna Tibalile que tive
alegria de conhecer.
Dedico igualmente aos meus irmãos: João de Deus Amílcar, Ana Siza Milione
Maxwell, Araújo Alone Maia, Paula Luis José Maia, Morena Luis José Maia, Regina Luis
José Maia, Alberto Luis José Maia por todo apoio e incentivo que me têm dado nesta
caminhada acadêmica. Aos meus sobrinhos Aurélio José João da Silva, Ornela José João da
Silva, Ângela José João da Silva, Neuza José João da Silva, Sansão Amílcar, Celma Amílcar,
João Amílcar, Nelinha Amílcar, Manzire, Ohawa, Aloha, Madalena, Amarildo.
Dedico também aos meus amigos e colegas de caminhada na pastoral: Padre Manuel
dos Anjos Martins, Padre Luis Fernando, Padre Cláudio, Padre Valentino Benigna, a toda a
família de Lorenzo Benigna, Padre Cláudio Crimi, Padre Alberto do Songo a quem sempre
tratei de Baba (Pai) e que me trata de Akulu akulu (grande), Padre José Alone Kodiasse,
Eulária Sandoca e Sandoca, mãe Eulária, Isabel e Laurinda, Wayway Kimbada Rufin, Maria
Virgínia Oliveira Soares, Evandro, Maria Aparecida.
Dedico de uma forma especial a todos os missionários Combonianos pela ajuda que
me deram e pelas experiências que tive em vários lugares, em Moçambique, na África do Sul,
na província Malawi-Zambia e no Brasil trabalhando com as comunidades cristãs na zona
leste de São Paulo, o contato com a província do Brasil-Nordeste. Foram oportunidades que
de alguma forma despertaram o ânimo para o desenvolvimento desta pesquisa.
A todos um cordial agradecimento.
AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar agradeço a Deus pelo dom da vida e pela proteção em todos os
momentos por meio de meus antepassados. Agradeço imensamente ao professor Frei Lisâneos
por ter me orientado nesta dissertação. Não foi fácil no começo devido à complexidade do
tema e à dificuldade de encontrar a literatura específica. Assumi o desafio de levar o tema da
pesquisa até o fim e Frei Lisâneos assumiu junto esse desafio, de imediato sugerindo alguns
canais através dos quais eu iria encontrar a literatura adequada para a pesquisa, um desses
canais foi o Padre Antonio Aparecido. Tive pouca sorte, o contato com o padre Toninho
(nome pelo qual era mais conhecido) foi apenas por telefone, tínhamos agendado alguns
encontros, mas nenhum deles deu certo, pois sua saúde estava crítica e acabou falecendo sem
que nos tivéssemos encontrado.
Agradeço de coração ao Professor Pe. Antonio Manzatto que acolheu o meu projeto
de pesquisa e deu o maior incentivo para que levasse a frente a pesquisa, dada a sua
pertinência e a necessidade de diálogo entre a teologia e as culturas africanas. Sem o apoio do
Pe. Manzatto, sinceramente eu não teria meios financeiros para desenvolver essa pesquisa, foi
através dele que conseguí a bolsa da Adveniat para desenvolvê-la. A ele e à Adveniat o meu
cordial agradecimento. Aos padres Ney de Sousa e Pedro Iwashita que deram importantes
sugestões na qualificação. Ao professor Matthias Grenzer pelo incentivo, sempre se
mostrando disponível para dúvidas e esclarecimentos. Agradeço igualmente à Pontifícia
Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção na pessoa de todo o corpo docente, pois
aqui me senti acolhido e incentivado para desenvolver as minhas pesquisas desde a graduação
até o presente momento. Agradeço aos funcionários/as da Assunção pela ajuda nas
documentações seja pela renovação do visto, seja pela renovação da bolsa, sempre estiveram
prontos para ajudar e sem esquecer do pessoal da biblioteca. Agradeço ao professor Afonso
Maria Ligório Soares pelas indicações bibliográficas que enriqueceram muito esta pesquisa.
Ao professor Adailton Maciel que também sugeriu algumas obras para esta pesquisa.
Agradeço à professora Maria Helena Vilas Boas Concone que me abriu os caminhos
para entrar em contato com uma vasta literatura na área de antropologia médica. Agradeço de
igual modo à professora Carmen Junqueira e à professora Dorotheia Passeti, sempre abertas
para esse projeto. Agradeço a casas África e ao Atabaque onde encontrei portas abertas para
essa pesquisa.
SIGLAS E ABREVIAÇÕES

AIDS - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
AMETRAMO - Associação dos Médicos Tradicionais de Moçambique
DGS - Direção-Geral de Segurança
FRELIMO - Frente de Libertação de Moçambique
HIV - Vírus da Imunodeficiência Humana
JOSA - Jovens de Santa Anuarite
MPLA - Movimento Popular de Libertação de Angola
OMS - Organização Mundial de Saúde
PAIGC - Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde
PIDE - Polícia Internacional e de Defesa do Estado
RIBLA - Revista de Interpretação Bíblica Latino Americana
RESUMO

Durante o período colonial muitas práticas culturais dos povos africanos foram
combatidas em nome da civilização. No entanto, os saberes locais fazem parte da cultura e a
cultura é algo vivo e atuante que o povo carrega dentro de si. Mudou o regime colonial, mas
seus rastos e suas políticas ficaram de alguma forma imperando nos novos governos locais
nos períodos da independência e pós- independência. Mas o povo que antes sofrera com a
situação colonial e depois com as guerras civis, nunca deixou de viver a sua cultura da forma
como foi herdada dos seus antepassados em matéria de saberes, relacionamento e regras de
conduta. É do povo moçambicano que a pesquisa está falando concretamente.
A pesquisa pretende falar das etiologias de saúde, doença e cura na cultura Nyungwe,
com um olhar antropológico-teológico: atendimento, tratamento e cura. Onde é que as pessoas
encontram resposta para as situações quotidianas relacionadas à saúde? Quando uma mulher
não consegue ficar grávida ou um homem não consegue engravidar uma mulher, como é que
a biomedicina lida com essa situação? Se uma mulher fica grávida e não consegue ganhar o
nenê ou quando ela tem abortos espontâneos no período da gravidez, como é que os médicos
da medicina hospitalar assim como os médicos tradicionais lidam com esse problema? A
pesquisa quer também trazer à tona o papel dos ancestrais, dos médicos tradicionais dentro da
cultura Nyungwe e a partir destas categorias re-pensar a cristologia nos moldes africanos e
não ocidentais.

Palavras-chave: cultura, antepassado, etiologia, médico tradicional, saúde.
ABSTRACT

During the period of colonization most African cultural practices were discouraged in
the name of civilization. Nevertheless, the local knowledge is part of the culture and the
culture is something alive and active that people carry inside themselves. The colonial regime
changed, but its track and politics somehow remained commanding in the new local
governments in the period of independence and post independence. But the people, who had
suffered before because of the colonial situation, then by the civil war, never gave up living
its culture the way they inherited from their ancestors in matters of knowledge, relationship
and behavior. This research talks concretely about the Mozambican people.
The aim of this research is to talk about Nyungwe’s cultural etiologies of health,
disease and cure from an anthropological and theological point of view: attendance, treatment
and cure. Where do people find response for daily situations related to health? When a woman
does not get pregnant, or a man does not manage to make a woman pregnant, how does
biomedicine handle this issue? If the woman gets pregnant and does not manage to have the
baby or if she has a spontaneous abortion during pregnancy period, how do the doctors from
the hospital as well as the traditional doctor deal with this problem? The research aims as well
to point out the role of the ancestors, traditional doctors within nyungwe’s culture and from
these categories to set a Christology reflection according to African and not Western ways.

Key-words: culture, ancestors, etiology, traditional doctor, health.
SUMÁRIO
Breve memorial.........................................................................................................................11
INTRODUÇÃO........................................................................................................................14

CAPÍTULO I - Contextualização da província de Tete......................................................21
1.1 Sinopse geográfica e histórica.......................................................................................22
1.2 O vale do Zambeze........................................................................................................24
1.3 O colonialismo português em Moçambique:
o conflito com o nacionalismo e o desejo da liberdade........................................................26
1.4 A política portuguesa na colônia...................................................................................30
1.5 Primeira Frente de Libertação Nacional........................................................................35
1.6 Segunda Frente de Libertação Nacional........................................................................37
1.7 A situação eclesial.........................................................................................................38
1.8 Cultura...........................................................................................................................41

CAPÍTULO II - A cosmovisão africana nyungwe...............................................................47
2.1 Da visão hegemônica para uma cosmovisão africana....................................................48
2.2 A relação da pessoa consigo e com os outros................................................................52
2.3 A relação da pessoa (munthu) com a família de sangue.................................................54
2.4 A relação da pessoa com a natureza...............................................................................57
2.5 A relação da pessoa com o transcendente......................................................................61
2.6 Interpretações dos fenômenos na visão laica nyungwe..................................................68
2.7 A visão espiritual da vida...............................................................................................72

CAPÍTULO III - Saúde e doença..........................................................................................77
3.1 Antropologia...................................................................................................................78
3.2 A concepção da doença e o papel dos médicos tradicionais:
uma análise do corpo enquanto sistema simbólico e sua relação com a cultura.................78
3.3 O conceito de etiologia...................................................................................................81
3.4 Saúde e doença dentro do sistema cultural.....................................................................82
3.5 Uma visão unitária de corpo e globalizante de saúde....................................................91
3.6 Saúdes como projeto de vida..........................................................................................94
3.7 Médicos tradicionais. .....................................................................................................96
3.8 Causas da doença..........................................................................................................100
3.9 Doenças causadas pela maldade de um terceiro...........................................................106
3.10 Doenças causadas pelo amor possessivo de um terceiro............................................109
3.10.1 Doenças causadas pelo castigo ou transgressão......................................................110
3.10.2 Ciwindo...................................................................................................................110
3.10.3 A moral do ciwindo.................................................................................................113
3.11 O likaho......................................................................................................................114
3.11.1 Classificação do likankho........................................................................................115
3.11.2 Likankho de navalha...............................................................................................115
3.11.3 Likankho de embondeiro.........................................................................................115
3.11.4 Likankho de capim..................................................................................................116
3.11.5 Likankho de melância.............................................................................................116
3.11.6 Likankho de peixe...................................................................................................116
3.11.7 Likankho de tartaruga..............................................................................................116
3.12 As interpretações etiológicas populares da doença e da cura....................................118
3.13 Características essenciais da cura africana.................................................................125
3.14 A medicina integralizada............................................................................................125
3.15 A medicina comunitária.............................................................................................126
3.16 A medicina litúrgica...................................................................................................127
3.17 A mulher banto e a sua vocação para a maternidade.................................................129
3.18 A mulher como ministra de cura................................................................................132

CAPÍTULO IV - Caminhos para uma Cristologia africana.............................................136
4.1 A vitalidade das culturas e religiões africanas frente à persistência
da situação de dominação..................................................................................................137
4.2 Jesus, O proto Ancestral...............................................................................................145
4.3 Jesus, o irmão mais velho.............................................................................................160
4.4 Jesus, o curador............................................................................................................162
4.5 A relação entre a Salvação e a Cura.............................................................................169
CONCLUSÃO........................................................................................................................171
BIBLIOGRAFIA....................................................................................................................175
APÊNDICES...........................................................................................................................187
ANEXOS....…………………………………………………………………………………204
GLOSSÁRIO..........................................................................................................................206