Table Of ContentPAS S Vol. 12 N.º 1. págs. 123-136. 2014
Revista de Turismo y Patrimonio Cultural https://doi.org/10.25145/j.pasos.2014.12.009
www.pasosonline.org
Análise das Representações Sociais dos comerciantes
ambulantes e suas implicações no planejamento turístico
Sinthya Pinheiro Costa*
Kerlei Eniele Sonaglio**
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Brasil)
Resumo: Objetivamos analisar de que maneira as representações sociais dos comerciantes ambulantes
da praia de Ponta Negra/RN podem ser utilizadas como elemento para o planejamento turístico. Para
tanto, realizou -se um estudo descritivo, utilizando a pesquisa bibliográfica e Associação Livre de Palavras,
aplicados com 90 ambulantes em Ponta Negra/RN. O núcleo central das representações apresenta o con-
hecimento dos ambulantes pautado nos saberes coletivamente partilhados pelo turismo. Não obstante, o
planejamento representa o pensamento no futuro e elaboração de planos que busquem melhorias. Então,
entende -se que compreender as necessidades dos ambulantes fornece subsídios para elaboração de estraté-
gias visando o desenvolvimento turístico, constituindo -se como importante teoria a ser utilizada com indi-
víduos que vivem a realidade e necessidades locais, mas encontram -se a margem dos processos decisórios.
Palavras- chave: Economia Informal. Praia. Turismo. Representação Social. Núcleo Central.
Analysis of Social Representations of the itinerant traders and their implications for tourism
planning
Abstract: We aimed to analyze how the social representations of itinerant traders from the beach of
Ponta Negra / RN can be used as an element for tourism planning. For this purpose, we performed a
descriptive study, using methods such as the literature search and Free Word Association, applied to 90
itinerant traders in Ponta Negra / RN. The central core of the representations presenter the knowledge of
itinerant traders collectively shared by tourism. The plan represents the forward thinking and formula-
ting plans to seek improvements. We conclude that understanding the needs of tinerant traders provides
grants to developing strategies for tourism development, becoming an important theory to be used with
individuals living reality and local needs, but are the margin of decision -making processes.
Key words: Informal Economy. Beach. Tourism. Social Representation. Central Core.
1. Introdução uma análise à luz da Teoria das Representações
Sociais”, apresentada ao Programa de Pós Gra-
O artigo ora apresentado é parte integrante duação em Turismo da Universidade Federal
da Dissertação de Mestrado intitulada “O Pla- do Rio Grande do Norte no ano de 2012. Seu
nejamento Turístico e o Comércio Ambulante: objetivo é analisar de que maneira as represen-
* Bacharel em Turismo. Especialista em Planejamento e Consultoria Turística. Mestre em Turismo. Professora Volun-
tária no curso de Turismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Brasil); E -mail: [email protected]
** Bacharel em Turismo. Especialista em Turismo Empreendedor. Meste em Engenharia Ambiental. Doutora em
Engenharia Ambiental. Docente no Programa de Pós Graduação stricto sensu em Turismo da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte; E -mail: [email protected]
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tações sociais dos comerciantes ambulantes da Nesse ínterim da relação entre o planeja-
praia de Ponta Negra/RN podem ser utilizadas mento e o turismo, cresce a necessidade de se
como elemento para o planejamento turístico. A encontrar maneiras de inserir os atores envol-
necessidade de estudar esta temática surgiu de vidos na atividade turística, neste estudo em
indagações acerca do crescimento da economia particular os comerciantes ambulantes, que
informal e suas motivações. se encontrando a margem dos processos deci-
Evidencia -se que a vulnerabilidade do mer- sórios e sendo partícipes da atividade podem
cado de trabalho brasileiro se deve principal- contribuir para que o processo de planejamento
mente a legislação trabalhista, a estrutura e aconteça de maneira mais eficaz e coerente com
funcionamento da sociedade, a elevada carga o que se propõe. É nesse sentido que emerge a
tributária e a burocracia extrema, que acirram necessidade de um planejamento que envolva
a relação entre a formalidade e a informali- as diversas esferas da sociedade e tenha nas
dade e que provoca a instabilidade das relações necessidades humanas o caminho para busca
de trabalho. Assim, aumenta -se a quantidade de estratégias que viabilizem a sustentabilidade
de empregos temporários, terceirizados e até dos destinos turísticos, entre elas a de Ponta
mesmo o subemprego; uma vez que, como o Negra/RN, selecionada como espaço para con-
mercado passa a não comportar a quantidade de solidação desta pesquisa, que sofre as pressões
profissionais disponíveis, restringem -se, as opor- exercidas pela população local e pelos turistas a
tunidades, aumenta -se o desemprego e estimula- partir do uso inadequado de seus recursos.
-se o crescimento das atividades periféricas. Dessa forma, o uso da Teoria das Represen-
Neste sentido, o comércio ambulante confi- tações Sociais como método de entendimento da
gura -se como uma opção para aqueles trabalha- sociedade e de captação de possíveis soluções
dores que, estando fora do mercado de trabalho para os problemas da mesma, configura -se como
formal e necessitando de recurso financeiro um caminho a ser seguido, possibilitando assim,
para suprir pelo menos as necessidades básicas que relações dicotômicas sejam compreendidas
de sua família, buscam por meio de um traba- e apaziguadas. Assim sendo, apresenta -se como
lho árduo a garantia de sobrevivência. Assim, um referencial teórico e instrumento para o
encontram no turismo um forte impulsionador entendimento do turismo e dos imaginários que
desta atividade visto que, são os turistas e laze- permeiam os atores deste fenômeno.
rista1, os principais consumidores dos produtos
e serviços comercializados pelos ambulantes
contribuindo, assim, para a perpetuação da ati- 2. As representações sociais e o comércio
vidade. ambulante: uma análise conceitual
Entretanto, apesar de participarem da dinâ-
mica do turismo no que Beni (2006) chama de 2.1 O estudo das Representações Sociais
conjunto das ações operacionais, enquadrados As RS simplificam a realidade, transformando
no subsistema de produção e de distribuição, os fenômenos estudados em objetos, sendo a
ou seja, atividades que suprem a necessidade finalidade de um estudo nesta área selecionar
da demanda, os ambulantes encontram -se a e delimitar as dimensões do fenômeno -objeto.
margem dos processos decisórios da atividade Assim, a representação é de alguém (sujeito)
turística, dentre eles do planejamento turístico. que a elabora e de alguma coisa (objeto) que é
Embora o planejamento turístico atual seja cha- elaborada.
mado de participativo e/ou descentralizado, con- Considera -se que os membros de um grupo
forme afirma o Ministério do Turismo (Brasil, criam o objeto representado, dão -lhe significado
2007), e sabendo que nestes formatos as reuni- e realidade. Essa interação entre as pessoas
ões e demais atividades relacionadas ao planeja- confirma suas crenças subjacentes; assim, a
mento e organização do turismo são abertas ao representação social é sempre uma unidade do
público, mesmo estes não tendo direito a voto, que as pessoas pensam e do modo como fazem.
já que as ações são definidas pelos representan- Uma representação é mais do que uma imagem
tes das diversas instituições que trabalham no estática de um objeto na mente das pessoas; ela
turismo, é difícil a participação dos ambulantes é também seu comportamento e a prática intera-
nesse processo. De acordo com Tyler (2003: 13) tiva de um grupo (Wagner, 1998).
“(...) a gestão de turismo em cidades é um pro- Dessa forma, a representação social se iden-
cesso político convoluto, interativo e com várias tifica com a realidade social, mutante, evolutiva
dimensões”, por isso, nenhuma dimensão pode e ao mesmo tempo segura, compreensível com os
deixar de ser considerada na elaboração de ações indivíduos que nela atuam. Acredita -se que, ao
decisórias. conhecer as representações sociais, seus meca-
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nismos de construção e circulação e suas funções representações estão presentes tanto ‘no mundo’
possibilitam -se a compreensão dos significados como ‘na mente’, e elas devem ser pesquisadas
pelos quais as pessoas organizam -se e agem, em ambos os contextos” (Farr, 2008: 46).
tomando como referência os processos de objeti- Desta forma, para se estudar as RS de um
vação e ancoragem. sujeito, frequentemente recorre -se ao entendi-
mento do (s) elemento(s) mais importante que
“(...) defendemos que as representações sociais permeia o seu imaginário, utilizando para isso a
são uma importante via para a desconstrução Teoria do Núcleo Central. Esta teoria se consti-
da eficácia do poder simbólico, na medida em tui como um aporte metodológico complementar
que permite ao pesquisador, interventor ou a TRS uma vez que, é a partir da determinação
trabalhador social, entre outros, conhecer, do núcleo central, que a representação social do
nas suas múltiplas dimensões, as condições que se estuda é significada.
concretas de produção das ressignificações
dos signos hegemônicos, assim como a organi-
zação interna das mesmas, fruto da dinâmica 2.2. A Teoria do Núcleo Central
particular que caracteriza a formação das A Teoria do Núcleo Central teve a sua gênese
representações sociais” (Sobrinho, 2003: 68). no quadro da pesquisa experimental em 1976
por Jean -Claude Abric, por meio de sua tese
De acordo com Nóbrega (2001: 73), o processo de doutorado intitulada Jeux, conflits et repré‑
de objetivação consiste em “materializar as sentations sociales, defendida na Universidade
abstrações, corporificar os pensamentos, tornar de Provence. Esta teoria se constitui como um
físico e visível o impalpável, enfim, transformar recurso complementar a Teoria das Represen-
em objeto o que é representado”. Neste sentido, tações Sociais, pois esclarece significativamente
objetivar é materializar as significações pro- aspectos que dizem respeito à aparente contra-
vocando um distanciamento das mesmas. Esse dição que permeia as Representações Sociais, as
processo divide -se em três fases (Ibid: 74): (I) quais podem ser rígidas e flexíveis, estáveis e
construção seletiva, ou seja, apropriação do cor- instáveis (Sá, 1996).
pus teórico pelo público consumidor dos meios Segundo Abric (2002) a hipótese do núcleo
de comunicação de massa; (II) esquematização central pode ser formulada da seguinte forma:
estruturante correspondendo ao elemento duro e uma representação social apresenta uma carac-
mais estável da representação – núcleo central; terística específica, de ser organizada em torno
e (III) naturalização, como a projeção de noções de um núcleo central, sendo este constituído
abstratas, de materialização e de espacialização de um ou mais elementos, que dão significado
de entidades conceituais. à representação. O referido autor afirma ainda
Por sua vez, a ancoragem “permite a incor- que núcleo central é “todo elemento que desem-
poração do desconhecido ou novo em uma rede penha um papel privilegiado na representação,
de categorias usuais” (Ibid: 77). Possibilita com- no sentido que os outros elementos dependem
preender a maneira na qual os elementos repre- dele diretamente porque é em relação a ele que
sentados contribuem para exprimir e constituir se definem seu peso e seu valor para o sujeito
as relações sociais. Organiza -se sobre três con- (...)” (Ibid: 31).
dições estruturantes, a saber: (I) atribuição de O núcleo central é considerado o elemento
sentido determina a rede de significações em que mais estável da representação que permeia o
um objeto está representado; (II) a instrumen‑ indivíduo ou a sociedade. Desta forma, os objetos
talização do saber conferindo valor funcional e que se encontram no núcleo central são aque-
estrutura de imagem a representação, contribui les que dificilmente serão modificados. E que,
para construir as relações sociais a partir da para sê -lo, é necessário que haja uma evolução
interpretação e da gestão da realidade do grupo que provocará uma transformação completa da
ou do indivíduo; e (III) enraizamento no sistema representação. Pode -se considerá -lo como uma
do pensamento que permite a coexistência entre rocha: concisa, resistente e inflexível, mas, que
os fenômenos opostos no interior do processo for- dependendo das pressões exercidas sobre ela –
mativo das novas representações. levando -se em consideração os fatores tempo,
A representação é mediada pela linguagem, continuidade, velocidade, força etc. – pode sofrer
mas não flui diretamente nos discursos dos sujei- modificações.
tos, e por isso a análise de representação social Ao redor do núcleo central organizam -se os
carrega freqüentemente a marca do instrumento elementos periféricos. Eles constituem os com-
de coleta de dados do material, necessitando que ponentes mais acessíveis, mais vivos e mais
o cientista social reconstrua a representação. “As concretos das representações. Permitem a anco-
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ragem na realidade, espelhando as modulações um avanço para além das necessidades e prag-
individuais e tendo a grande importância de for- máticas dos fazeres.
necer pistas ao pesquisador (Sá, 1996).
Neste contexto, verifica -se que tanto o núcleo
central como os elementos periféricos exer- 2.3. A Economia Informal no Brasil: a Pers-
cem funções distintas, mas importantes para a pectiva do Comércio Ambulante
manutenção das representações. Cada um tem Com o acúmulo de riquezas provenientes da
um caráter específico e complementar da outra inserção do capitalismo na economia mundial,
parte, não podendo existir sozinhos. Funcionam ocorreu a intensificação da divisão de classes
como um duplo sistema, com características dife- sociais e do mercado. “O desenvolvimento acar-
renciadas como apresentado no quadro 1. retado pela mundialização do capital não repre-
sentou crescimento equânime para todas as
nações envolvidas nas transações estabelecidas
Quadro 1. Características do sistema
neste contexto” (Oliveira, 2009: 40).
central e do sistema periférico de uma
De acordo com Harvey (2009), a acumulação
representação
flexível fruto da atividade capitalista é marcada
Sistema central Sistema periférico por um confronto direto com a rigidez do for-
dismo. Enquanto este é caracterizado pelos mer-
Permite a integração
Ligado à memória coletiva cados estáveis, racionalidade técnico- científico,
de experiências e
e à historia do grupo produção em massa etc. aquele se apóia na
histórias individuais
flexibilidade dos processos de trabalho, dos
Consensual mercados de trabalho, dos produtos e padrões
Tolera a heterogenei-
define a homogeneidade do dade do grupo de consumo, resultando assim no surgimento
grupo
de setores de produção inteiramente novos,
Estável Flexível novas maneiras de fornecimento de serviços
Coerente Tolera as contradi- financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas
Rígido ções altamente intensificadas de inovação comercial,
Resiste às mudanças Evolutivo tecnológica e organizacional.
Considerando -se as principais mudanças eco-
Pouco sensível ao contexto Sensível ao contexto
nômicas, sociais e culturais que tem acontecido
imediato imediato
desde o final do século XX, em nível mundial,
Funções sendo elas: os novos hábitos e comportamentos
Funções:
permite a adaptação dos consumidores, as novas relações de trabalho
gera o significado da
representação à realidade concreta e de produção, decorrentes do processo de mun-
permite a diferença
determina sua organização dialização e do desenvolvimento de novas técni-
de conteúdo
cas e tecnologias de produção, de informatização;
Fonte: Abric, 2002. os postos de trabalho foram reduzidos significa-
tivamente provocando uma série de alterações
A centralidade proporciona a estabilidade da na economia mundial (Cleps, 2009).
representação uma vez que, ligada a memória e O mercado de trabalho também passou por
a historia resiste a mudanças. Já a periferia per- uma radical reconstrução com a imposição de
mite que novas experiências sejam agregadas, regimes e contratos de trabalhos mais flexíveis,
porém, de uma maneira a proteger a represen- redução do emprego regular em favor do cres-
tação mais antiga. É nesse sentido que grupos cente uso do trabalho em tempo parcial, tempo-
com representações mais ‘parecidas’ conseguem rário ou subcontratado, o que contribui signifi-
se entender mantendo o respeito aos que se dife- cativamente para o crescimento da economia
renciam. Neste caso, o sistema central possibi- informal, sendo esta uma nova forma de produ-
lita à proximidade e o sistema periférico aceita zir e reproduzir o capital e se recuperar em um
as contradições de pensamento. momento de crise.
Ressalta -se que a preocupação deste traba- O termo “economia informal” apresenta diver-
lho é com o conhecimento do senso comum, sua sas possibilidades de interpretação podendo estar
dinâmica de produção e inserção social nas rela- ligado a fenômenos como: a evasão e a sonega-
ções que vão definindo o ambiente a partir da ção fiscal, a terceirização, a formação de micro-
interação dos grupos sociais. Dessa forma, as empresas, o comércio de rua ou ambulante, a
pesquisas devem produzir saberes, conhecimen- contratação ilegal de trabalhadores assalariados
tos e entendimentos, os quais permitam uma nativos ou migrantes, o trabalho temporário, o
aproximação às práticas subjacentes, ou seja, trabalho em domicílio etc,. Contudo, a sua defini‑
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ção relaciona -se “as atividades que operam com integrar -se economicamente, buscando meios de
base no trabalho do proprietário do instrumento sobrevivência e reproduzindo -se como trabalha-
de trabalho, ajudado por mão de obra familiar e/ dores, que acessaram a integração econômica,
ou alguns auxiliares” (Martins, 2003: 22). permitindo renda e possibilitando a subsistência
Qualificado como setor informal da economia, própria e da família, o acesso ao consumo e a
o comércio ambulante ocorre nos interstícios da recursos materiais.
produção capitalista sendo forma de escoamento
de bens e de fomento a outras atividades pro-
dutivas. Constitui -se, portanto como modalidade 3. Procedimentos metodológicos
de integração econômica, estando submetido aos
movimentos do capital que cria seu espaço e Este estudo caracteriza -se por ter uma abor-
pode destruí -lo (Cacciamali, 1983). dagem qualitativa, ou seja, orientada para a
De acordo com a Classificação Brasileira de compreensão de processos subjetivos, traba-
Ocupações, documento normalizador do Ministé- lhando com o universo dos significados, dos
rio do Trabalho e do Emprego, que reconhece, motivos, das aspirações, das crenças, dos valores
nomeia e codifica os títulos e conteúdos das e das atitudes humanas. Por conseguinte, nas
ocupações do mercado de trabalho brasileiro, pesquisas qualitativas, não são levados em con-
os comerciantes ambulantes são caracterizados sideração valores numéricos, mas sim, a capaci-
como aqueles que: dade humana de dissertar sobre uma temática
e as inferências que podem ser realizadas a
“atuam em vias e logradouros públicos, a pé, partir de suas ponderações. De natureza descri-
carregando a própria mercadoria junto ao tiva, consiste em uma investigação, cuja princi-
corpo, em sacolas, malas, bolsas ou carrinhos pal finalidade é o delineamento ou análise das
de mão. Trabalham sem vínculo empregatício, características de fatos ou fenômenos (Lakatos;
como autônomos, a céu aberto ou em veículos 1991, Marconi, 1991).
automotores ou de tração animal. Trabalham A coleta de dados aconteceu entre os dias
em horário diurno ou noturno, em pé, por lon- 6 e 15 de junho de 2011 com 90 comerciantes
gos períodos, sujeitos à exposição de ruídos, ambulantes na praia de Ponta Negra/RN, a par-
condições adversas de temperatura e material tir da aplicação da Técnica de Associação Livre
tóxico, que pode resultar em estresse” (Mte, de Palavras (TALP) e de questionário. Com
2010: n/p). uma faixa de terra de mais de 3 quilômetros de
extensão, Ponta Negra acolhe milhares de pes-
Esta modalidade da economia comporta a soas que circulam diariamente nas suas areias,
contradição de ser regulamentada pela legislação seja a trabalho ou a passeio. Pessoas estas que
brasileira, mas renegada pela iniciativa pública disputam espaço ao sol entre barracas, cadeiras,
e privada que prefere esconder a conjuntura da quiosques, comerciantes ambulantes e demais
qual faz parte. A Lei nº 6.586 de 06 de novem- transeuntes. Em seu entorno encontram -se
bro de 1978, lei esta que classifica o comerciante quase 200 meios de hospedagem, que juntos ofe-
ambulante para fins trabalhistas e previdenciá- recem aproximadamente 10 mil leitos, além de
rios em seu primeiro artigo “considera -se comer- “mais de 50 restaurantes, (...) dezenas de bares
ciante ambulante aquele que, pessoalmente, por cuja quantidade exata é difícil contabilizar,
conta própria e a seus riscos, exerce pequena em função da expansão incessante e em larga
atividade comercial em via pública, ou de porta escala, que o resultado é atividade turística o
em porta” (art. 1o). ano inteiro” (Prefeitura do Natal, 2011: n/p).
A (i)legalidade do ambulante não é explícita Foram selecionados quatro termos indutores,
pelas autoridades, assim é produzido um campo sendo eles: Turismo, Ambulante, Planejamento
de ação onde a (in)formalidade é negociada. O e Turistas. A escolha dessas palavras deu -se a
comércio ambulante não só é “producto de la partir da identificação delas como as principais
debilidad del Estado sino como una relación variáveis obtidas com os estudos preliminares
contradictoria, conflictiva e incluso conciliadora do referencial teórico, constituindo -se assim
entre las organizaciones de comerciantes ambu‑ como as palavras norteadoras desta pesquisa.
lantes y las acciones deliberadas de las agencias Não obstante, estas palavras apresentam íntima
estatales” (Londoño, 2010: 197). relação com a temática em questão e permitem
Os vendedores ambulantes inserem -se numa responder os objetivos para a problemática pro-
extensa trama de trocas sociais de diversos tipos posta. A seleção dos sujeitos pesquisados seguiu
e qualidades, o que não permite qualificá -lo alguns critérios que corroborassem com o jul-
somente como espaço de exclusão. É buscando
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gamento de tipicidade da população em análise tencerem ao núcleo central e ao sistema perifé-
nesta pesquisa, sendo eles: rico da representação, admitindo, assim, confi-
a) Ser comerciante ambulante; gurar uma distribuição das evocações em quatro
b) Ser maior de 18 anos; quadrantes (Gadelha, 2009).
c) Comercializar produtos na Praia de Ponta O primeiro quadrante refere -se as evoca-
Negra – Natal/RN; ções com frequência superior ou igual à média
d) Comercializar produtos legais, tais como: e prontamente expressas. O segundo e terceiro
bebidas, comidas, bijuterias, roupas, etc; quadrante refere -se aos elementos com ordem
e) Não possuir ponto de venda constituído; OME e frequência maior ou igual à média de
evocações. O último tem OME maior ou igual
A escolha pela TALP deu -se por esta técnica à média das médias e frequência menor que a
possibilitar a apreensão das projeções mentais média das citações (ver figura 1).
dos indivíduos, reduzindo as dificuldades e os
limites das expressões discursivas e trazendo Figura 1: Quadrantes do EVOC/TABGFR
a memória as imaginações, as lembranças que
estão implícitas nos indivíduos (Oliveira et.al.,
2005) . Para análise das evocações provenien- 1º Quadrante 2º Quadrante
tes do TALP utilizou -se o software Ensemble de
programmes permettant I’analyse dês evocations
– Programa Permissivo da Análise de Evocações
(EVOC). “Esse recurso informático representa
um grande auxílio na organização dos dados,
particularmente na identificação de discrepân-
cias derivadas da polissemia do material cole-
tado (...)” (Ibid: 580). 3º Quadrante 4º Quadrante
O EVOC é utilizado para analisar a frequên-
cia com que as palavras são evocadas pelos par-
Fonte: Adaptado de Dantas (2009)
ticipantes da pesquisa. A partir dessa análise, os
dados são categorizados e divididos em quatro Em suma, o núcleo central é responsável por
quadrantes, de onde sairão os elementos que agrupar os elementos mais freqüentes e mais
compõe o núcleo central e a periferia, ou seja, importantes, podendo ser acompanhados de ele-
os elementos mais e menos representativos, res- mentos com menor valor significativo, de sinôni-
pectivamente, para amostra pesquisada. O pro- mos e de protótipos associados ao objeto. Assim
grama utiliza -se da técnica da análise fatorial sendo, as palavras, segundo a teoria utilizada,
para o cálculo da frequência e por isso exige uma que provavelmente formam o núcleo central
amostra mínima de 90 sujeitos para a determi- do estudo, serão aquelas que tiveram as maio-
nação do agrupamento. Este programa é com- res frequências e que forem mais prontamente
posto por um conjunto de programas integrados evocadas, situando -se no quadrante superior
que permite dois tipos de análise: a lexicográfica esquerdo. As palavras situadas no quadrante
e a categorização por uma análise de conteúdo. superior direito e inferior esquerdo serão consi-
A análise lexicográfica é responsável pela deradas elementos intermediários enquanto as
criação do dicionário de palavras produzidas localizadas no quadrante inferior direito serão
pela amostra pesquisada que, uma vez evocadas os elementos mais periféricos.
vão constituir o campo semântico das Represen-
tações Sociais. A análise de conteúdo por sua
vez, é responsável por categorizar as palavras 4. Análise dos resultados
que compõe o “dicionário” e agrupá -las de modo
a determinar o núcleo central e periférico da O estudo ora apresentado contou com a parti-
representação (Dantas, 2009). cipação de 90 comerciantes ambulantes atuantes
Decorrendo -se a análise dos dois índices (X na Praia de Ponta Negra/RN, consubstanciando
e Y), de modo simultâneo e combinado, devido uma amostra predominantemente masculina.
a saliência, a técnica de análise dos programas As evocações, provenientes do TALP foram ana-
integrantes do software EVOC permite, a partir lisadas e categorizadas de modo a considerar
da combinação da frequência média de ocorrên- a dimensão individual (frequência) e coletiva
cia das palavras citadas e da ordem média das (ordem média de evocações), objetivando identi-
citações (evocações produzidas), a identificação ficar o núcleo central. A classificação das cate-
dos elementos com maior probabilidade de per- gorias obtidas pelo estímulo indutor a partir do
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cruzamento das linhas das médias resultou no entendimento do turismo que condiz com a
diagrama de quatro quadrantes. De posse dessas conceituação literal da atividade. Desta forma,
informações, iniciou -se a análise das evocações como elementos mais estáveis da representação
provenientes dos estímulos indutores. Faz -se aparecessem o deslocamento, ou seja, para haver
mister entender que as palavras evocadas são as turismo é necessário que haja uma viajem; o
primeiras respostas fornecidas ao estímulo indu- lazer, representado pela categoria diversão,
tor em questão. como sendo o uso do tempo livre para descanso e
Assim, foi pedido aos comerciantes ambu- entretenimento; e a questão econômica, tão pre-
lantes que ao ouvirem os estímulos indutores sente no discurso do turismo como gerador de
(turismo/ planejamento/ ambulante/ turista) divisas para as localidades e que nesta pesquisa
proferidos pela pesquisadora, fossem associa- aparecesse representado pela palavra dinheiro.
das quatro palavras que apresentassem alguma É necessário fazer uma ressalva que
ligação com esses, as quais são chamadas de “dinheiro” é visto pelos comerciantes ambulantes
palavras induzidas, respostas ou evocações. A tanto como objeto necessário para que as pes-
segunda e última etapa consistia em hierar- soas possam viajar e assim se divertir, quanto
quizar, ou seja, atribuir grau de importância a como algo que beneficia os trabalhadores pelos
cada resposta dada. O objetivo da aplicação deste turistas, sendo este de suma importância para
teste consiste no fato de que no momento em que garantir a sobrevivência das pessoas que vivem
se associa uma palavra, traz -se a lembrança algo desta atividade.
que está presente na memória dos indivíduos, Contudo, um fato que chama atenção na
possibilitando a análise do sistema de referência, representação do termo indutor turismo é que
de significações que permeiam estes indivíduos. os turistas, ou seja, as pessoas que fazem a ati-
vidade acontecer, através do seu deslocamento
para se entreter, aparecem como sendo os ele-
4.1. Termo Indutor Turismo mentos mais periféricos da representação em
Para o estímulo indutor Turismo, foi possível estudo. Desta forma, pode -se perceber que os
encontrar 76 palavras diferentes. A partir da comerciantes ambulantes reconhecem os turis-
introdução destas palavras no software EVOC tas como elementos de menor importância para
2000 foram criados os quatro quadrantes que a atividade. Isto pode ser justificado pela dificul-
caracterizam o núcleo central e os elementos dade de diferenciação de turistas e comunidade
periféricos e darão significado a representação local como mercado consumidor, pela ausência
do termo em estudo. Por conseguinte, a diagra- de conhecimento das nomenclaturas e diferen-
mação em quadrantes é resultado da análise ciações deste para aquele, ou pela simples nega-
da frequência de cada categoria e da média das tiva de existência do turista enquanto público
ordens médias das evocações (OME). alvo dos negócios realizados na praia.
O núcleo central do termo indutor Turismo Em resumo, o turismo pode ser considerado
é composto pelas palavras Dinheiro, Diversão e sob a ótica dos comerciantes ambulantes que
Viagem. A partir da observação desta centrali- atuam em praias urbanas, como uma viagem
dade, pode -se inferir que, apesar dos comercian- realizada por pessoas que buscam diversão. Para
tes ambulantes que atuam nas praias urbanas tanto, é necessário dispor de recursos financei-
desconhecerem o conceito formal da palavra ros em abundância tanto para o deslocamento
turismo, a vivência prática proporcionou um quanto para garantir a subsistência da socie-
Quadro 2. Possíveis elementos do núcleo central das representações
acerca do estímulo indutor Turismo.
Frequência ≥ 12 Média < 2 Frequência ≥ 12 Média ≥ 2
Dinheiro 21 1,571 Bom 13 2,077
Diversão 12 1,583 Passeio 18 2,667
Viagem 12 1,750 Praia 30 2,067
Frequência < 12 Média < 2 Frequência < 12 Média ≥ 2
Emprego 8 1,750 Conhecer 8 2,250
Lazer 8 1,750 Turista 8 2,000
Melhorias 8 1,875
Sobrevivencia 6 1,333
Trabalho 11 1,727
Fonte: Estudo de campo, 2011.
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 12(1). 2014 ISSN 1695-7121
130 Análise das Representações Sociais …
dade local. Destaca -se que a palavra dinheiro foi dos, remetem ao desejo de se conquistar melho-
a que apresentou a maior frequência. rias a partir do trabalho, mesmo reconhecendo
O desafio que se coloca é minimizar a visão que o mesmo não é fácil, tampouco responsável
meramente econômica do turismo e maximizar por muitos benefícios.
as pessoas como elementos importantes para Compondo a lista das palavras evocadas
o desenvolvimento e para a perpetuação das encontram -se as palavras futuro, melhorias,
atividades a ele ligados. O entendimento do organizar, pensar, plano e trabalho que apre-
turismo como sendo deslocamento, dinheiro, sentaram uma maior frequência de aparição e
pessoas, etc. é condizente com o que se compre- consequentemente uma maior representativi-
ende como sendo a definição do turismo pela dade para os sujeitos pesquisados. Estas pala-
ótica dos prestadores de serviço e da comu- vras irão compor o núcleo central e periférico e
nidade local. Entretanto, é necessário que as somadas a outras, serão responsáveis por dar
pessoas entendam a atividade turística como significado a representação. A delimitação do
sendo importante para o desenvolvimento das núcleo central e dos elementos periféricos para
localidades, inserindo -se assim na dinâmica o estímulo indutor planejamento é apresentado
da mesma, participando, exigindo e buscando no quadro 3.
melhorias não só para o turismo, mais para No senso comum, o planejamento é visto
toda a comunidade que está direta ou indi- como sendo uma forma de organização que atra-
retamente envolvida, seja por residir em um vés da informação, abre caminhos para o futuro.
destino turístico, seja por trabalhar na praia, Apesar de simplificada, a visão comum está
no hotel, nos restaurantes. Esse envolvimento relacionada com o conceito de planejamento
incide diretamente na qualidade dos serviços, que de acordo com Molina (2005: 45) “consiste
proporcionando cada vez mais o aumento do em estabelecer um curso de ação que conduza
fluxo de visitantes e garantindo a sobrevivência à obtenção de uma situação desejada, mediante
das localidades turísticas. Desta forma, turismo um esforço constante, coerente, organizado, sis-
é dinheiro, diversão e viagem, mas também são temático e generalizado”. Para os comerciantes
pessoas – turistas ou não – que contribuem ambulantes pesquisados, o planejamento pode
para o fortalecimento da atividade. ser definido pelas palavras: Futuro, Pensar e
Plano, que juntas compõem o núcleo central e
reforçam as expectativas desses sujeitos.
4.2. Termo Indutor Planejamento Não diferente do senso comum, o planeja-
Quando instigados a responder sobre as qua- mento é visto pelos comerciantes ambulantes
tro palavras que vinham a mente quando se ouvia como algo realizado em longo prazo, principal-
o estímulo “planejamento” ou se via as fotos da mente quando associado a realizações pessoais,
reunião de planejamento do Conselho Estadual como por exemplo a compra de uma casa nova,
de Turismo (apresentadas quando o entrevistado ou a garantia de estudo para os filhos. Para o
não conhecia o estímulo em questão) grande presente, não são realizados planos, no máximo
parte dos comerciantes ambulantes prontamente pensa -se sobre as tarefas cotidianas, que ficam
responderam: “eu planejo um futuro melhor” apenas na base do pensar e não no agir ou
ou “eu planejo comprar uma casa” ou ainda “eu mesmo em traçar metas, objetivos ou caminhos
planejo sair dessa vida”. Essas respostas, comu- a serem percorridos. Isto justifica a frequência
mente proferidas pelos trabalhadores pesquisa- de aparição (21 vezes) para a palavra “pensa-
Quadro 3. Possíveis elementos do núcleo central das representações
acerca do estímulo indutor Planejamento.
Frequência ≥14 Média < 2 Frequência ≥ 14
Média ≥ 2
Futuro 27 1,852 Melhorias 22
2,045
Pensar 21 1,857 Organizar 18
2,000
Plano 15 1,933
Frequência < 14 Média < 2 Frequência < 14 Média ≥ 2
Infra estrutura 6 1,667 Conhecimento 7 2,000
Crescimento 8 2,000
Necessário 6 2,000
Trabalho 12 2,083
Vendas 9 2,000
Fonte: Estudo de campo, 2011
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 12(1). 2014 ISSN 1695-7121
Sinthya Pinheiro Costa; Kerlei Eniele Sonaglio 131
mento”. O futuro, mesmo quando idealizado, 4.3. Termo Indutor Turistas
também não é planejado a fim de se tornar algo A análise do termo indutor “turista” se torna
palpável, fica apenas no imaginário, no campo imprescindível nesta pesquisa, para que se possa
do “pensar”. compreender como os comerciantes ambulan-
No campo do planejamento formal, este deve tes vêem àquelas pessoas que são as principais
ser de responsabilidade do poder público e não responsáveis pelo desenvolvimento da atividade
da comunidade, já que aqueles, uma vez eleitos comercial a qual se dedicam. Contudo, é impor-
representantes do povo, devem buscar caminhos tante que se remeta ao primeiro termo indutor
para melhorar e/ou organizar a infraestrutura analisado – Turismo – para se contrapor as duas
e a vida dos cidadãos. Isto é evidenciado nos realidades verificadas: turista como representa-
quadrantes 2 e 3 – elementos intermediários – ção do estímulo turismo; e como estímulo que
que apresentam evocações relativas aos objeti- dará significado a uma representação. Naquele
vos do planejamento. Requer atenção o fato dos momento, turista é representado nos elementos
comerciantes ambulantes não se sentirem parte mais periféricos, sendo estes os elementos mais
integrante do planejamento, nem enquanto tra- flexíveis, sensíveis ao contexto imediato e mais
balhadores e muito menos como cidadãos em adaptativos à realidade concreta (Abric, 2002).
busca de melhorias efetivas para sua localidade Neste sentido, os turistas, são vistos como
e, consequentemente, para si mesmos. Por con- importantes, mas não essenciais ao comércio
seguinte, isto pode explicar a ausência de partes ambulante, já que materializando a realidade
interessadas nas audiências públicas que ante- momentânea, podem a qualquer momento deixar
cedem as ações de planejamento, já que essas de ter representatividade para os entrevistados.
acreditam que, uma vez elegendo representan- A centralidade continua a ser voltada para as
tes, sua missão já está cumprida. Assim, cada questões econômicas e de deslocamento. Turista
vez mais os trabalhadores se mostram insatis- reflete a parcela compradora de produtos.
feitos com as decisões tomadas contra a classe, Desta forma, ser turista, trabalhar com
embora nada seja feito por eles para melhorar a turismo, fazer turismo, planejar a atividade
situação através da participação social. entre outros, são materializações econômicas
Contraditoriamente, os elementos periféricos do que se tem com o crescimento da atividade.
estão compostos por ações que decorrem da efe- Neste sentido e de forma geral, turismo e turista
tividade do planejamento, como: Crescimento, são a mesma coisa: representações do dinheiro!
Vendas, Trabalho. Ou seja, apesar de ser neces‑ Para atestar esta afirmação, o quadro 4 apre-
sário, pois proporciona o crescimento, o aumento senta a composição do possível núcleo central do
das vendas e, consequentemente, do trabalho, o termo indutor em estudo.
planejamento é pouco utilizado, principalmente Esta categoria enquadra as citações relativas
pela falta de conhecimento de sua importância às crenças, os valores, as visões socialmente par-
e de técnicas que auxiliem na elaboração, bem tilhadas. Percebe -se a presença de termos que
como de participação quando do planejamento revelam um tom de senso comum nas evocações.
de estratégias como um caminho para o alcance É exatamente a partir dessa visão que devem se
de objetivos comuns. constituir as relações sociais visando criar condi-
ções para a transformação do discurso e das prá-
ticas. As categorias demonstram levar em conta
Quadro 4. Possíveis elementos do núcleo central das representações
acerca do estímulo indutor Turista.
Frequência ≥ 13 Média < 2 Frequência ≥ 13 Média ≥ 2
17 1,471 Viagem 16 2,313
Cliente 14 1,875
Comprador 24 1,833
Dinheiro 17 1,882
Praia
Frequência < 13 Média < 2 Frequência < 13 Média ≥ 2
Amigo 11 1,727 Bom 12 2,417
Conhecer 11 1,727 Melhorias 8 2,625
Diversão 10 1,400 Passeio 10 2,100
Renda 8 1,875 Pessoas 10 2,400
Trabalho 10 1,900
Fonte: dados do estudo, 2011
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132 Análise das Representações Sociais …
que durante a pesquisa emergem sentimentos duto por dinheiro, mas de símbolos, de culturas
raramente aflorados com tamanha nitidez e e de valores.
reforçam que deva existir um sistema organiza- Conforme explicitado por alguns dos entre-
dor de práticas que valorize o cliente enquanto vistados, muitos turistas no momento da com-
produtor de uma singularidade expressa pela pra procuram informações sobre a localidade
linguagem, dando importância ao seu diálogo e com os trabalhadores, fato que justifica a visão
as suas crenças. de turista como amigo, pois este dá atenção ao
O turista é o principal agente de desen- trabalhador, o utiliza como referência e se rela-
volvimento das atividades que acontecem em ciona, mesmo que por pouco tempo.
praias. É visando o seu bem estar que se cons- Esse fato nos faz refletir sobre a necessidade
troem hotéis, pousadas, restaurantes e outros de capacitar os comerciantes ambulantes para
serviços que impulsionam o crescimento dos estabelecer um melhor convívio com o cliente/
destinos turísticos e sua melhoria. O comércio turista. Fazer com que esses trabalhadores
ambulante, por sua vez, encontra no turismo tenham conhecimento do destino, dos atrativos
uma oportunidade para o seu desenvolvimento e dos recursos turísticos é obrigação dos pla-
e para garantia do sustento das famílias que o nejadores, como forma de garantir ao turista
utilizam como fonte de renda. Não obstante, o uma melhor impressão do lugar visitado e
turista é o público alvo desta classe de trabalha- assim desenvolver o lugar. Esse investimento
dores e por isso, não pode ser visto apenas como no comerciante ambulante como “divulgador” do
o comprador, mais sim como o responsável pela destino também se constitui como ferramenta
sobrevivência, pelo dinheiro. É neste ponto que para minimizar a visão do turismo e dos turis-
ele deixa de ser apenas o cliente e passa a ser o tas como meros fornecedores de recursos para
amigo. Sem embargo, turistas são pessoas que o destino e maximizar o eixo emocional e suas
viajam para conhecer novos lugares e se divertir, relações com o visitante.
por isso necessitam ser bem tratados pelos que É nesse sentido que se busca a participação
fazem a atividade acontecer. dos comerciantes ambulantes no planejamento,
Contudo acredita -se que a presença de res- para que estes se sintam parte da dinâmica do
postas como amigo, pessoas e bom, humaniza a turismo e contribuam para a atividade. Toda-
representação social do turista pelo comerciante via, será verificado que na estrutura do plane-
ambulante e desmistifica a visão meramente jamento turístico, seja ele em âmbito federal,
econômica que se evidencia em todos os termos estadual e/ou municipal, estes atores não estão
indutores estudados. Apesar da a centralidade inseridos, sendo o planejamento, na sua essência,
ser de essência puramente econômica, as inter- de responsabilidade das organizações formais,
mediações estão repletas de elementos afetivos o excluindo -se principalmente em nível municipal,
que contrapõe -se ao economicismo exacerbado do a comunidade e os comerciantes ambulantes.
núcleo central. É importante destacar que neste
diagrama de quatro casas deve -se refletir mais
sobre os elementos intermediários do que sobre 4.4. Uso das Representações Sociais dos
o núcleo central, uma vez que esperava -se que o Comerciantes Ambulantes como elemento
dinheiro fosse realmente mais importante para do processo de Planejamento Turístico.
os sujeitos pesquisados que as pessoas. Contudo, A análise da estrutura e funcionamento do pla-
a presença do amigo muda a visão preestabele- nejamento turístico nos três âmbitos do governo
cida do pesquisador, que passa a identificar uma evidencia a ausência de representatividade de
certa ligação emocional entre público alvo desta algumas partes que, fazendo parte da dinâmica
pesquisa e os seus clientes -turistas. da atividade turística, deveriam ser incluídas
É importante frisar que a visão do turista no processo de elaboração de ações e tomadas
como consumidor não é errônea já que, a própria de decisões. A não participação constitui -se
OMT (2011: n/p), quando em sua definição de como erro grave para o planejamento, uma vez
turista coloca este como sendo “usually a visitor que, para o pleno funcionamento de um destino
whose stay includes at least one overnight stop turístico, é necessário que haja interação entre
in a hotel or other tourist accommodation and, o turista e os atores locais, acarretando assim
or, a consumer of tourism services”. Contudo, na no desenvolvimento sustentável da atividade.
pesquisa ora analisada este conceito se amplia e Autores como Beni, Ruschmamm, Hall, Souza
o turista passa a ser além de um consumidor dos e Walkowski, já referidos nesta pesquisa, corro-
serviços turísticos, uma pessoa amiga que viaja boram com a afirmativa de que a comunidade
para conhecer o novo, tendo este conhecer um necessita participar do planejamento já que seus
significado de troca. Troca não apenas de pro- “saberes locais”, sua vivências cotidianas, seus
PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural, 12(1). 2014 ISSN 1695-7121
Description:Resumo: Objetivamos analisar de que maneira as representações sociais dos comerciantes ambulantes da praia de Ponta Negra/RN podem ser