Table Of ContentSymbolon I
Amor e AmizAde
em…
Homero
Sófocles
Eurípides
Platão
Ovídio
Petrónio
Jean Jouffroy
editado por
BELMIRO FERNANDES PEREIRA
JORGE DESERTO
PorTo 2009
FICHA TÉCNICA
TíTulo: SYMBOLON I – AMOR E AMIZADE
orGANizAÇÃo: BELMIRO FERNANDES PEREIRA E JORGE DESERTO
ediÇÃo: FACULDADE DE LETRAS DA UNIVERSIDADE DO PORTO
ANo de ediÇÃo: 2009
ColeCÇÃo: SYMBOLON
CoNCePÇÃo GráfiCA: Sereer, Soluções Editoriais
TirAGem: 150 exemplares
dePósiTo leGAl: 304847/10
isBN: 978-972-8932-55-8
ÍNDICE
IN LIMINE
Belmiro Fernandes Pereira .................................................................... 5
ULISSES E NAUSÍCAA OU O DESENCONTRO DO AMOR
Frederico Lourenço ................................................................................. 9
AMOR E AMIZADE EM SÓFOCLES
Marta Várzeas ........................................................................................ 19
AMOR E AMIZADE EM EURÍPIDES.
OS CASOS DE PÍLADES E DE ELECTRA
Jorge Deserto .......................................................................................... 31
AMOR, AMIZADE E FILOSOFIA EM PLATÃO
Maria Teresa Schiappa de Azevedo ................................................... 43
AMOR E AMIZADE EM OVÍDIO
Carlos Ascenso André ........................................................................... 57
AMOR E AMIZADE NO SATYRICON DE PETRÓNIO
Delfim Leão ............................................................................................. 73
OS MEMBROS DA GERAÇÃO DE AVIS:
AMIZADES, INIMIZADES E FALTA DE EXEMPLARIDADE
Manuel Ramos ....................................................................................... 91
BIBLIOGRAFIA ..................................................................................... 115
BELMIRO FERNANDES PEREIRA
In Limine
«(…) nos vices et nos vertus ont des modèles grecs»,
Marguerite Yourcenar, Mémoires d’ Hadrien
Uma breve explicação é devida ao inaugurarmos os colóquios Sym-
bolon. Para pensar fórmulas e conceitos que ainda hoje modelam, de
modo mais ou menos reconhecível, a civilização europeia, a área de
estudos clássicos do Departamento de Estudos Portugueses e Estu-
dos Românicos quis criar, em sinal de reconhecimento, uma ocasião de
encontro com tradutores e investigadores que nos podem conduzir
até aos símbolos do mundo moral, político e religioso da antiguidade
greco-latina. Nesta primeira série de colóquios, reflectiremos sobre
algumas ideias ético-retóricas que vieram a configurar, implícita ou
explicitamente, uma teoria das emoções. Difundidas em muitos catá-
logos de virtudes e vícios, essas representações marcaram indelevel-
mente a vida intelectual do Ocidente; a título meramente ilustrativo,
recordem-se a tractatio que oferece a primeira retórica latina sobre a | 5
tópica do discurso epidíctico, a leitura alegórica da Eneida praticada Pereira
da Antiguidade até ao fim do período do Renascimento ou o modo des
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dará aos frades mendicantes que preguem annuntiando vitia et virtutes,
poenam et gloriam cum brevitate sermonis1.
Neste primeiro colóquio revisitaremos a madre antiga para obser-
var como eros e philia, com a sua riqueza de sentidos e acepções, se
reconfiguraram no amor e na amicitia dos latinos e deste modo procu-
raremos entender também como a filosofia moral e a teoria política,
a literatura didáctica ou as artes da palavra recolheram as concepções
de amor e amizade e as transmitiram sob variadas formas ao homem
moderno.
Parecerá este um caminho batido, trilhado por muitos, lugar gasto
no repisar de peugadas antigas – lembrem-se, por exemplo, os estudos
de David Konstan e o seu último livro, The Emotions of the Ancient Greeks
(2006). Mas, se a tópica, matéria de pedagogos, não corre riscos nem
se afasta de paisagens familiares, também é verdade que provê, qual
clauis uniuersalis, quem queira aventurar-se na arte de compreender e
reconhecer: por isso, para cartografar a floresta, importa remontar às
fontes.
Quando se contentou com a eficácia dos repositórios de exemplos
e sentenças, ainda que potenciada em enigmas, emblemas e empresas,
a pedagogia das belas letras reduziu o horizonte ao espaço abafado
dos armazéns de Minerva. Mas nem nesses momentos se perdeu de
todo a noção da natureza ancilar de tais recursos. Outras eram as
sedes da invenção e entre essas avultavam com certeza as construções
ético-retóricas que nos propomos tratar. Por isso, à noção de topos
não convêm as metáforas modernas do cliché ou da chapa tipográ-
fica, pois, como bem notou Goyet, na literatura clássica o uso pessoal
dos loci permitia revolver, reelaborar e até reanimar o objecto de imi-
tação (Goyet 1996).
Regressaremos, portanto, à madre antiga, mas em visita breve
e parcelar. Faltam mestres que por força das circunstâncias não
pudemos escolher. Sentiremos a ausência do De amicitia ciceroniano
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| ou de um tratamento ex professo da teoria das emoções exposta no
Pereira livro II da Retórica aristotélica. Luís Vives, por exemplo, recordando ao
des preceptor do príncipe quanto deve considerar as inclinações da pes-
miro Fernan sroefla iqctuae o a cqounes seelh caa,p rteocuo dmoe cnadraá cntoe rD de oc odnesustltiantaiotnáer i(o1 5p2o3r) fqourme oa dai vscinucrasor
Bel a estima do aio ou mestre, pois a fides do discípulo ex amore nascitur.
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N 1 Vd. Rhetorica ad Herennium, 3. 6; Kallendorf (1989); Migne, PL 210, 111-198.
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Aristóteles e Cícero comparecerão em próximas edições. Sirva então
este nosso primeiro encontro de symbolon, de sinal de convívio que
crie vínculos para outros momentos de partilha do saber que gera a
amicitia.
Ao Conselho Directivo da Faculdade de Letras da Universidade
do Porto, ao Departamento de Estudos Portugueses e Estudos Româ-
nicos testemunhamos o nosso reconhecimento pelos apoios presta-
dos; aos Professores Carlos André, Delfim Leão, Frederico Lourenço
e Maria Teresa Schiappa, que generosamente aceitaram vir falar de
autores que tão bem conhecem, o nosso muito obrigado.
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FREDERICO LOURENçO
Ulisses e Nausícaa ou o
Desencontro do Amor
Para muitos leitores da poesia homérica, o episódio em que a jovem
princesa Nausícaa depara com Ulisses nu e empastado de sal numa
praia da paradisíaca ilha de Esquéria é dos mais impressivos de toda
a Odisseia; e belíssimo testemunho temos nós, na poesia portuguesa,
do encanto provocado por este encontro em poetas tão importan-
tes como Eugénio de Andrade, Sophia de Mello Breyner Andresen, 9
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FÉi aumma mHoamsseen tPoa iús nBicroa nddeã aom, Voar sec oa mGirzaaçdae ,M deo usrima pea Mtiaa ne udeel cAoulepg-dree-. ourenço
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desencontro amoroso para vos dar conta de alguns desses problemas. M
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À partida, um motivo óbvio de estranheza decorre da circuns- D
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tância de, nos Cantos VI-VIII da Odisseia (aqueles que nos descre- TR
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vem a sociedade dos Feaces), nos surgirem em paralelo dois tempos CO
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históricos: por um lado, temos um herói que participou no saque SE
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de Tróia, um acontecimento histórico que terá ocorrido por volta O
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de 1200 a.C.; por outro, esse mesmo herói chega dez anos depois a O
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uma sociedade grega cujos contornos delineados pelo poeta a situam CA
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por volta de 750 a.C. É que, na Esquéria descrita pelo poeta da Odisseia, AU
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estamos em plena época das colonizações gregas; e os versos sobre a S E
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fundação da cidade por Nausítoo “descrevem precisamente as incum- SS
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bências que cabiam ao fundador de uma colónia grega no séc. VIII”
(Garvie 1994: 83):
Em torno da cidade construíra um muro; edificara casas,
templos dos deuses e procedera à divisão das terras. [VI, 9-10]
Aliás, 734 a.C. é a data apresentada por Estrabão (6.2.4) para a
fundação grega da ilha mais frequentemente apontada como modelo
da Esquéria, ilha essa cujo nome moderno é Corfu. Dado que a iden-
tificação remonta a Tucícides (1.24.4), poder-se-á perguntar se esta
identificação terá alguma base de verosimilhança. O problema é que,
na Odisseia, raramente os locais míticos referidos na narrativa são
passíveis de serem indicados num mapa moderno, mesmo quando
os topónimos homéricos correspondem aos topónimos actuais (basta
dizer que, até em relação à própria Ítaca, não foi ainda possível pro-
var com toda a certeza que a ilha apelidada de “Ítaca” por Homero
é a Ítaca que podemos visitar hoje em qualquer cruzeiro às ilhas do
Mar Jónico). Corfu apresenta, antes de mais, a desvantagem de não
corresponder à descrição que Homero faz de Esquéria: quando Nau-
sícaa afirma “longe habitamos, remotos, no mar repleto de ondas; /
não há outros povos que connosco tenham associação” (VI, 204-5), é
óbvio que estas palavras não se aplicam a Corfu. Que a identificação
10 de Tucícides não convenceu os estudiosos modernos vê-se logo pela
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ourenço cpiarfcúurndsitoâ,n icdiean dteifi Ecasqduaé crioam te rI sscidhoia m, Caiásd riezc,e Snitceímliae,n Ptea, lee sdtien ma, oTduon eísstiaa-,
R Frederico L aoC sir lehbtaeal ,do Cse aEvnesráqsruoiéasr si saeo bnCrahe i impor aepg1o.i nmPaeaçlrãa o dm dei onA hplacoí enptoaao,r tc e(o,V mloIoIc, a m1li1ezo 2p -ad1re2e 1cp)er me–f e pproêronmvcaaiarr
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M utópico cuja existência empírica é negada tanto pela Geografia como
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D pela Botânica:
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O Fora do pátio, começando junto às portas, estendia-se
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EN o enorme pomar, com uma sebe de cada um dos lados.
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DE Nele crescem altas árvores, muito frondosas,
U O pereiras, romãzeiras e macieiras de frutos brilhantes;
A O figueiras que davam figos doces e viçosas oliveiras.
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S 1 Cf. R. D. Dawe (1993: 251). Aproveito para registar mais uma vez a enorme gratidão
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SS que sinto em relação ao Dr. Roger Dawe (Trinity College, Cambridge) no estudo da poesia
ULI homérica.
Description:ColeCÇÃo: SYMBOLON. CoNCePÇÃo Marguerite Yourcenar, Mémoires d' Hadrien Quando, a abrir o seu manual da ciência amo- rosa, ele