Table Of ContentA LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO
Incorporando as noções de social e histórico,
a autora busca distinguir o estabelecido do
não estabelecido e questionar a consciência dessa
distinção no homem quando este produz linguage
O livro analisa os discursos político, pedagógico
religioso, da história e também questões do
Eni Pukinelli Orlandi
discurso feminino e de educação indígena.
Faz também um estudo discursivo de aspectos
relacionados com a leitura.
R>ntE ~
Coleção: Linguagem/Crítica ENI PULCINELLI ORLANDI
Direção: Charlotte Galves
Eni Pulcinelli Orlandi
Conselho Editorial: Charlotte Galves
Eni Pulcinelli Orlandi (presidente)
Marilda Cavalcanti
Paulo Otoni
DOAÇÃO/HE-ctENCIAS HUMANAS E EDUCACAO
Regis--t-r-o- No.434.338 Da.ta.:03-03-2008
Autor:ORLANDI, ENI P.
TllJlo:A LINGUAGEM E SEU FUNCIONAMENTO ... A LINGUAGEM
Preço:,00
Doador:D IVERSOS E SEU FUNCIONAMENTO
As formas do discurso
FICHA CAT ALOGRAFICA
2.ª EDIÇAO REVISTA E AUMENTADA
Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Orlandi, Eni Pulcinelli.
079L A linguagem e seu funcionamento : as formas do
2.ed. discurso / Eni Pulcinelli Orlandi. - 2. ed. rev. e ~um.
- Campinas, SP : Pontes, 1987.
Linguagem/Crítica
Bibliografia.
l. Análise do discurso 2. Sociolingüística: I. Tí
tulo. II. Título: As formas do discurso. III. Série.
CDD-401.41
87-0940 -401 .9
\r\ \
lndices para catálogo sistemático:
\
1 . Análise do discurso : Comunicação : Linguagem 401. 41 >
2. Discurso : Análise : Comunicação : Linguagem 401. 41 \
1987
3. Sociolingüística 401. 9
Copyright © Eni Pulcinelli Orlandi
Capa:
Criação: Geraldo Porto
Fotografia: Paulo Germani
Coordenação Editorial: Ernesto Guimarães
Revisão: Ana Lígia Magnani Para o Edu
e para a Pat,
Carlos César Trausula
duas paixões.
Ernesto Guimarães
PONTES EDITORES
Rua Dr. Quirino, 1230
Telefone: (0192) 33-2939
Campinas - SP
Não adianta querermos ser claros.
A lógica não convence, a explicação nos cansa.
O que é claro não é preciso ser dito.
1987
Noturnidade, de Cassiano Ricardo.
Impresso no Brasil
ÍNDICE
Apresentação 9
Introdução à Segunda Edição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
O discurso pedagógico: a circularidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
Para quem é o discurso pedagógico? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
A lii:guagem em revista: a mulher-fêmea . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
O discurso da história para a escola . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
Algumas considerações discursivas sobre a educação indígena . . 81
A sociolingüística, a teoria da enunciação e a análise do discurso
(convenção e linguagem) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
Funcionamento e discurso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115
O sentido dominante: a literalidade como produto da história 135
Tipologia de discurso e regras conversacionais 149
Uma questão da leitura: a noção de sujeito e a identidade do
leitor ... . ... ........ .. ........... .. ....... ... ... 177
A produção da leitura e suas condições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 193
Leitura: de quem, para quem? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 205
Sobre tipologia de discurso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 217
O discurso religioso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 239
A fala de muitos gumes (as formas do silêncio) 263
APRESENTAÇÃO
Para alguns, o já-dito é fechamento de mundo. Porque estabelece,
delimita, imobiliza. No entanto, também se pode pensar que aquilo
que se diz, uma vez dito, vira coisa no mundo: ganha espessura, faz
história. E a história traz em si a ambigüidade do que muda e do que
permanece.
Não me proponho a resolver esse impasse, que se expressa através
da tensão entre o retorno e o avanço, entre o que restringe e o que
alarga, entre o que já é e o que pode ser, entre o mesmo e o dife
rente. Ao contrário, mantenho a tensão como motivo da minha refle
xão. Embora, na ilusão da onipotência, não deixe de tentar a espe
cificidade, o único, o definido.
Tendo como objeto de estudo a experiência de linguagem, a
prática do dizer, coloco alguns conceitos, alguns princípios teóricos
e metodológicos, algumas técnicas de análise como constantes e pro
curo explorar as conseqüências a que elas podem levar-me em cada
pretexto que tomo para a reflexão, como, por exemplo, a literalidade,
as regras conversacionais, a tipologia do discurso, a convenção, o pro
cesso de leitura.
Nesse percurso, coloco-me no próprio centro do risco que é a
tensão entre o já-dito e o a-se-dizer. Assim, aceito passar pelos mesmos
lugares, procurando o que me leva a conhecer alguma coisa a mais a
respeito dos objetos provisoriamente tomados para a reflexão, como
o discurso pedagógico, o discurso da história, a questão da educação
indígena, a argumentação, o discurso religioso e outros.
Se o objeto de estudo em que me detenho é de caráter múltiplo
e indeterminado, o objetivo, entretanto, é sempre um: incorporar as
9
noções de social e de história, distinguir o estabelecido d não-
0
estabelecido e questionar a consciência (o senti'mento)
dessa distinção
no homem, quando este produz linguagem.
. Como_ a área ~m que se inserem esses estudos é a da análise de
d1sc~rs~, nao podena prescindir do compromisso com o fragmentá .
o multi lo · · , · . . no,
. . p ' ~ ~rov1sono. O que leva ao reconhecimento da falta de INTRODUÇÃO À SEGUNDA EDIÇÃO
hm1tes categoncos, que se poderia pretender,
entre um método de
demonstração científico e outras formas de conhecimento outros De certo modo, rever um livro coloca, de forma radical, a questão
modos de reflexão sobre a produção da linguagem. ' que anunciei na Apresentação, acerca do mesmo e do diferente: pode
se mudar quase tudo e, ao mesmo tempo, se pode manter o texto o
No domínio da linguagem em geral e não só n
, . ' o espaço do mais perto possível da escrita primeira. Preferi manter, tanto quanto
p~eh~o, como pretende um clássico poeta inglês, parece dizer-se uma
possível, a relação com a escrita original, porquer dependendo das
so c01sa, sempre a mesma, usando-se o já usado, vestindo-se de novo mudanças, já seria outro livro.
as velhas palavras, "For as the sun is daily new and old ... "
Nessa revisão, portanto, só fiz as mudanças que considerava
Qual é a extensão dessa ilusão, se é uma ilusão? essenciais, e acrescentei dois textos: um sobre leitura e um sobre
discurso acadêmico e discurso político, por sentir que faziam falta.
Campinas, abril de J 983. Por seu lado, essa Introdução tem a finalidade de acrescentar
uma fala explicativa que permita ao leitor situar-se em relação ao que
é a Análise de Discurso· -(que notaremos AD).
-
Na história da reflexão sobre a linguagem, a AD aparece como
uma forma de conhecimento cisionista. Ela se constrói não como uma
alternativa para a Lingüística .....:_ que é a ciência positiva que descreve
e explica a linguagem verbal humana - mas como proposta crítica
que procura justamente problematizar as formas de reflexão estabe
lecidas.
Assim, ao mesmo tempo e.!!!... ~e pressupõe a Lingüística: a AD
abre um campo de questões no interior da própria Lingüística e que
re ere o conhecimento da linguagem ao conhecimento das formações
sociais.
Daí resulta o que podemos chamar seu "nomadismo". Não há
um acúmulo científico fixo, no que diz respeito à teoria, à definição
de seu objeto e método ( s) : a cada passo a AD redimensiona seu
objeto, revalia aspectos teóricos e se relaciona criticamente com seu(s)
método(s).
§. essa sua condição de existência crítica ~g1e a torna mais fe
cunda. Nem poderia deixar de ser assim, para uma forma de conhe-
10
11
·imcnto que, como diz Foucault (1969), se propõe "fazer uma
hi tória dos objetos discursivos que não os interrasse na profundidade sua relação com a exterioridade. Considera que, se a situação é
constitutiva, ela está atestada no próprio texto, em sua materialidade
comum de um solo originário, mas desenvolvesse o nexo das regula
(que é de natureza histórico-social).
ridades que regem sua dispersão". O frag1!1entário, o disperso, o in
completo, o não-transparente. Eis o domínio da reflexão discursiva.
Tampouco se trata para a AD - como para a Hermenêutica -
de encontrar, ou melhor, extrair um sentido do texto. A AD visa
Crítica ao mesmo tempo ao objetivismo abstrato (que advoga a
onipotência do sistema, o da autonomia da língua) e ao subjetivismo menos a interpretação do que a compreensão do processo discursivo.
idealista (em que domina a onipotência do sujeito e do território-livre Quer dizer: ~ AD problematiza a atribuição de sentido ( s) ao texto,
procurando mostrar tanto a materialidade do sentido como os pro-.·
da fala) ~-assu!!_le a posição de que se deve pensar um objeto ao --
cessos de constituição do sujeito, que instituem o funcionamento
mesmo tempo social e histórico, em que se confrontam sujeito e siste
illã:O discurso. discursivo de qu-alquer texto. , '
-
Desse modo, embora pressuponha a Lingüística, se distingue deÍa Dissemos que a AD é cisionista. A meu ver, i~o se deve a dois ~
motivos.
em pontos cruciais, pois não é nem uma teoria descritiva, nem uma
teoria explicativa. A AD ~retende uma _teoria crítica CJlle trata dª Primeiro, por ue n!!ip.a realidade social ~ histórica como a noss,a,
determinação histórica dos processos de significação. Não estaciona em que se é obngado a reconhecer que sempre se ?cupam determina
nos produtos como tais. Trabalha com os processos e 'as condições de das posições • (e não outras) no _s.Qnflit constituth10 das reJações
produção da linguagem. Condiciona, por isso, a possibilidade de se · sociais, não se pode fazê-lo neutramente, ou seja, sob a ilusão de
J
encontrarem regularidades à remissão da linguagem à sua exterioridade que não se está tomando posição nenhuma~ Des~odo a D
(condições de produção) . procura problematizar continuam.ente-a ericiê.o.clit enqu~nto evi
dênciás) e explicitar o seu caráte ideológico, /
Ao colocar c~Jundamental o fato de que há uma relação n~
Em segundo lugar, porque as críticas que se voltam contra a AD
.cessária da linguagem com o contexto de sua produção, a AD tem de
constituem formas contínuas de anexação e de revisão de sua capaci
~~lar-se sobre o campo das ciências sociais sem deixar de consti-•
dade explicativa. Também quanto à AD, a "Razão Ocidental (razão
tuir sua unidade no interior da teoria lingüística. Nela se juntam, pois',
jurídica, religiosa, moral e política, tanto quanto científica) não con
com alguma especificidade, a(s) teoria(s) das formações sociais e
sentiu ( ... ) em concluir um pacto de coexistência pacífica ( . .. )
a(s) teoria(s) da sintaxe e da enunciação.
senão sob a condição de anexá-la às suas próprias ciências ou a seus
Em rela ãQ.. às ciências humanas, por sua vez, a AD também próprios mitos .. . " (Althusser em: Marx e Freud, Freud e Lacan,
propõe um deslocamento no tratamento do texto: este s~ apresen.ta· Graal, Rio 1984).
~ m?numento e não como documento.
Assim também a AD é objeto de tentativas de anexação por
-
-Este seu deslocamento em relação às Ciências Humanas consiste parte da Lingüística, representada pela Pragmática (integrada), pelas
'
por seu lado, ~a r_~cusa da chamada Análise de Conteúdo clássica": Teorias da Enunciação ou pelas considerações da Argumentação ( des
aquela que to~a o texto apenas como pretexto e o atrave~sa só pã;a politizadas, sob a forma de conversação). Isto é: a AD tem relações
demonstrar o que já está definido a priori pela situação. Na Análise importantes com a Pragmática, a Enunciação e a Argumentação, mas
de Conteúdo ? texto aparece como documento, que se toma só inclui, nessas relações, a consideração necessária do ideológico, ao
como ilustração da situação em que foi produzido, situação esta já / a~ar que 'não há discurso sem..._syjeito nem sujeito sem ideologia/
constituída e caracterizada de antemão. A AD faz justamente o movi
As tentativas de integração da Análise do Discurso tendem a apagar
mento contrário: ao considerar que a exterioridade é constitutiva, ela
essa dimensão ideológica e a anexar o discursivo como um apêndice
parte do texto, da historicidade inscrita nele, . para atingir o modo de
(secundário) ao lingüístico (central).
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Enquanto projeto de conhecimento, enquanto proposta de uma
teoria crítica sobre a linguagem, a AD defende-se dessas "reduções"
(disciplinações) através de seu cisionismo. Podemos mesmo dizer que
o cisionismo é constitutivo da cientificidade da AD.·
Prática grávida de uma teoria em parte silenciosa (Althusser,
id.) a AD não tem outro modo de se constituir senão pela sua dester
O DISCURSO PEDAGÓGICO:
ritorialização ( cf. Courtine, "Chroniques de l'oublie Ordinaire'', Sedi
ments, n.0 1, Montreal, 1986). A CIRCULARIDADE*
Considerando a AD como um modo de apreender "as formas
textuais do político", Courtine ( op. cit.) dirá que ela te~de a eclipsar- ·
INTRODUÇÃO
se, em função de um duplo apagamento: a) o encobrimento da relação
de dominação política e b) o esquecimento do movimento de pensa
mento que analisa a dominação política. Partindo da supos1çao de que se poderiam_ distinguir três tipo~
de discurso, em seu funcionamento - discur~o lúdico, discurso polê-_
Segundo o mesmo autor, essa vontade de esquecimento tem sua mico e discurso autoritáriq - procuraremos caracterizar o discurso
emergência sedimentada ao mesmo tempo no terreno científico e no pedagógico (_DP), tal qual ele se q_presenta atualmente, como um.
domínio político: a eclipse da razão crítica, que toma, na política, a d!Scurto autoritário.
forma do pragmatismo. Nas ciências humanas, de acordo com este
O critério, para a distinção dos três tipos de discurso, podemos_
autor, o "valor operacional, prático, instrumental da razão apaga seu
encontrá-lo tomãlldo cõino base o referente e os participantes do
valor crítico; a observação suplanta os saberes gerais; o fato desqua
discurso, ou seja, o objeto do discurso e os interlocutores. Considera
lifica a interpretação; o especialista se levanta frente ao intelectual".
Os pesquisadores "encontram a terra firme das coisas e os rigores do mos q~ há dois processos - o parafrástico e o polissêmico - que são
constitutivos da tensão que produz o texto ( Orlandi, 197 8). Podemos
cálculo". O desejo de acabar com o político, diz Courtine, se encarna
tomar a polissemia enquanto processo que representa a tensão cons
em uma razão disciplinar e instrumental, na renovação do positivismo.
tante estabelecida pela relação homem/mundo, pela intromissão da
O texto de Courtine, na verdade, coloca-nos em estado de reflexão prática e do referente, enquanto tal, na linguagem. Nesse sentido,
chamando a atenção para o que considero a questão crucial para a . podemos caracterizar os três tipos de discurso da seguinte maneira:
AD: embora, na AD, a prática preceda a teoria (em parte silenciosa),
o discurso lúdicQ. é aquele em· que o seu objeto se mantém presente
se eliminarmos da AD a concepção de trabalho teórico, perdemos a enquanto tal 1 e os interlocutores se expõem a essa presença, resul
sua função crítica e não nos restará senão sua função instrumental. tando disso o que chamaríamos de polissemia aberta (o exagero é o
Esta, por sua vez, reduziria a AD ao academismo disciplinar. Como
non-sense). O discurso polêmico mantém a presença do seu objeto,
não é esta a vocação da AD, podemos dizer que o trabalho teórico é
sendo que os participantes não se expõem, mas ao contrário procuram
tão constitutivo da AD quanto seu cisionismo e a inclusão necessária
dominar o seu referente, dando-lhe uma direção, indicando perspecti
da reflexão sobre o ideológico.
vas particularizantes pelas quais se o olha e se o diz, o que resulta na
polissemia controlada (o exagero é a injúria). No discurso autoritário,
Eis, enfim, três fundamen~ para a AD~ a teoria, a crítica e a
o referente está "ausente", oculto pelo dizer; não há realmente inter-
ideolog@.
,..--
* Texto apresentado na mesa-redonda "Linguagem e Educação", no XX Semi·
Campinas, outubro de 1986.
nário do GEL, 1978. Posteriormente, foi publicado na Série Estudos, n.0 6,
Uberaba, 1978.
1 . Isto é, enquanto objeto, enquanto coisa.
14 15
locutores, mas um agente exclusivo, o que resulta na polissemia con no DP, aparece como algo que se deve saber. Entretanto, parece-nos
tida (o exagero é a ordem no sentido em que se diz "isso é uma que, enquanto discurso autoritário, o DP aparece como discurso do
ordem'', em que o sujeito passa a instrumento de comando). Esse poder, isto é, como em R. Barthes, o discurso que cria a noção de
discurso recusa outra forma de ser que não a linguagem. erro e, portanto, o sentimento de culpa, falando, nesse discurso, uma
voz segura e auto-suficiente. A estratégia, a posição final, aparece como
Considerando-se que o DP se insere entre os discursos do tipo
o esmagamento do outro. Nesse sentido, poderíamos dizer que A ensi
autoritário, procuraremos caracterizá-lo enquanto tal.
na B = A influencia B.
A estratégia básica das questões adquire a forma imperativa,
AS FORMAÇÕES IMAGINARIAS: isto é, as questões são questões obrigativas (parentes das perguntas
O QUEM, O O QUb, O PARA QUEM retóricas). Exemplo: exercícios, provas, cuja formulação é: "Respon
da . .. ?". São questões diretas a que se dá o nome de "questões
Analisando-se o esquema que constitui o percurso estrito da co objetivas".
municação pedagógica, temos:
O esquema da imagem dominante - IB(R) - aparece de
clinado segundo uma gradação de autoritarismo, desde IB (IA(R)),
1 Quem j 1 Ensina 1OQuê1 1 Para Quem 1 Londe 1· IB(IA(IB(IA(R)))) até a forma mais autoritária, da hipertrofia da
i i i i i autoridade, isto é, do professor: IA (A), ou seja, a imagem que o
professor tem de si mesmo. O que produz um discurso individuali
Imagem Inculca Imagem do Imagem Escola zado em seu aspecto estilístico e de perguntas diretas e sócio-cêntricas:
do referente do
professor i aluno i "Não é verdade?", "Percebem?'', "Certo?", etc.
(A)
Metalinguagem (B) Aparelho
(Ciência/Fato) Ideológico
(R) (X) ~NSINAR
Que pode ser representado como segue: Mais do que informar, explicar, influenciar ou mesmo persuadir,
ensinar aparece como inculcar.
A ensina R a B em X
Podemos caracterizar a inculcação através de vários fatores
Procuraremos, pois, .analisar essas variáveis (A, R, B, X) tendo
próprios ao discurso e que fazem parte da ordem social em que
em vista a função de ensinar.
vivemos. Vejamos esses fatores:
Se utilizarmos a técnica de imagens (formações imaginárias) de
Pêcheux, tal como ele a define em sua AAD (Pêcheux, 1969), temos
no esquema seguinte o que deveria ser a imagem dominante do DP: 1 - A quebra de leis do discurso, tais como as enunciadas por O.
Ducrot ( 1972): o interesse, a utilidade ou a lei da informatividade
IB(R) *
1 . 1 - A lei da informatividade diz que: se se quer informar é
preciso que o ouvinte desconheça o fato que se lhe aponta. Veremos
A questão que s.e constituiria na estratégia básica 2 do DP deve
aqui mesmo, no item 3.b, como o DP lida com essa lei.
ria ser a pergunta pelo referente (R), isto é, o objeto do discurso, que,
1 . 2 - Lei do interesse: lei geral do discurso segundo a qual
* Imagem que B (o aluno) faz de R (referente).
não se pode falar legitimamente a outrem senão daquilo que possa
2. Trabalharemos aqui com o esquema de pergunta-resposta por considerarmos
interessar-lhe.
que o circuito do ensino passa pelo movimento criado pela questão.
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1. 3 - Lei da utilidade: lei "psicológica" segundo a qual não 2 - O "é porque é"
se fala somente por falar, mas porque há uma utilidade em fazê-lo.
Em virtude dessa concepção utilitarista da linguagem considera-se ra A apresentação de razões em torno do referente reduz-se ao "é
zoável indagar, para cada ato de fala, os motivos que poderiam tê-lo p rque é". E o que se explica é a razão do "é porque é" e não a razão
suscitado. do objeto de estudo. Nesse passo ,temos no DP duas características
bastante evidentes. Ao nível da linguagem sobre o objeto, o uso de
Além dessas leis gerais válidas para o comportamento lingüístico
d iticos, a objetalização ("isso"), a repetição, perífrases. Ao nível da
em geral, há uma regulamentação para cada categoria de atos de fala.
metalinguagem, definições rígidas, cortes polissêmicos, encadeamen,.
Por exemplo, para ordenar exige-se uma certa relação hierárquica entre
quem ordena e quem obedece; para interrogar, há também a exigên los automatizados que levam a conclusões exclusivas e dirigidas. Daí
cia de certas condições, e o direito de interrogar, exercido por uma u estranheza de um discurso que é diluidor e diluído, em relação ao
autoridade, converte-se em poder de ordenar e, logo, não pode ser objeto, ao mesmo tempo em que apresenta definições categóricas e é
atribuído indistintamente. ·xtremamente preciso e coerente, ao nível da metalinguagem.
Para cada uma das leis gerais pode-se fazer corresponder um
- A cientifi cidade
tipo particular de subentendido. No DP, entretanto, o que há é mas
caramento.
A transmissão de informação e fixação são consideradas obje
Mantida a regulamentação para o ato de interrogar e de ordenar tivos do DP. Até o momento falamos do tipo de "informação" (com
- uma vez que o professor é uma autoridade na sala de aula e não portamento) que ele "transmite" (inculca). Gostaríamos, agora, de
só mantém como se serve dessa garantia dada pelo seu lugar na fular sobre a natureza dessa "informação". E sua característica está
hierarquia -, o recurso didático, para mascarar a quebra das leis m que ele se pretende científico. O estabelecimento da cientificidade
de interesse e de utilidade, é a chamada motivação no sentido peda
do DP pode ser observado espeCialmente em dois pontos: a) a me
gógico. Essa motivação aparece no DP como motivação que cria inte
l;ilinguagem e b) a apropriação do cientista_f eita pelo professor.
resse, que cria uma visão de utilidade, fazendo com que o DP apre
sente as razões do sistema como razões de fato. Ex.: no léxico, o uso
Ll) A metalinguagem
das palavras "dever'', "ser preciso'', etc.
Nas formações imaginárias que citamos mais acima - por exem A metalinguagem tem um espaço (institucional) para existir.
Vejamos essa relação da metalinguagem com seu espaço, no DP.
plo, IB(IA(R)) - podemos incluir a mediação do "dever": 1 que B
deve ter da 1 que A deve ter do R, etc. Assim como, pela quebra das O conhecimento do fato fica em segundo plano em relação ao
leis de discurso, o que temos é ainda a mediação: a desrazão cede ·onhecimento da metalinguagem, da forma de procedimento, da via
lugar à mediação da motivação que cria interesse, utilidade, etc. Essa
de acesso ao fato. Na realidade, não há questão sobre o ·objeto do
motivação tem validade na esfera do sistema de ensino e deriva dos
discurso, isto é, seu conteúdo referencial, apresentando-se assim um
valores sociais que se lhe atribui.
H caminho: o do saber institucionalizado, legal (ou legítimo, aquele
Em um e outro caso, temos sempre a anulação do conteúdo refe que se deve ter). O conteúdo aí é a forma (artefato) e se aponta
rencial do ensino e a sua substituição por conteúdos ideológicos mas a forma como réplica do conteúdo. Através da metalinguagem, o que
. carando as razões do sistema com palavras que merecem ser ditas se visa é a construção da via científica do saber que se opõe ao senso
_por si mesmas: isto é o conhecimento legítimo. As mediações são ·ornum, isto é, constrói-se aí o reino da objetividade do sistema. O
sempre preenchidas pela ideologia. objeto aparece refletido nos recortes de uma metalinguagem que se
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