Table Of ContentMeus sinceros agradecimentos a Steven L.L. Aronson, que me ajudou a editar os
Diários e que provou mais uma vez – como tinha feito no passado em livros com
Andy e comigo – ser diligente, vigilante e brilhante.
P.H.
A
GRADECIMENTOS
Jamie Raab, na Warner Books, foi uma editora solidária e astuta. Ela
vasculhou o livro tão cuidadosamente e deu conselhos tão bons e infalíveis para
tantas decisões que tinham de ser tomadas num trabalho deste tamanho e
dimensão, que é difícil imaginar como tudo poderia ter sido feito sem ela.
Agradecimentos também a: Vincent Fremont, Ed Hayes; Helen B. Childs,
Rob Wesseley; Bob Miller, que deu início ao projeto junto à Warner Books; Lee
Seifman, que trabalhou tão rápido e com inteligência e bom humor; Tony
Bugarin, Allen Goldman, Heloise Goodman, Suzanne Gluck, Lew Grimes,
Margery King, Harvey-Jane Kowal, Jesse Kornbluth, Gary Krampf, Jane Krupp,
Alex Neratoff, Barbara O’Connell, Jay Shriver, David Stenn, Allison Weiser.
Profunda gratidão aos meus pais.
E, por último, agradecimentos a Frederick W. Hughes, o executor do
Espólio Warhol e de longa data empresário de negócios e amigo de Andy, que
compreendeu que a franqueza-do-momento é a essência do diário como forma
literária, e que foi o primeiro a defender o espírito franco deste diário – mesmo
quando a franqueza de Andy incluía Frederick W. Hughes.
P.H.
I
NTRODUÇÃO
Pat Hackett
Conheci Andy Warhol no outono de 1968 – oito anos depois de ele ter
pintado seus primeiros quadros pop e apenas três meses depois de ter sido
baleado e quase morto por uma mulher que tinha atuado como figurante num dos
seus filmes underground. Durante a primavera anterior, o espaço de
ateliê/estúdio de cinema/ponto de encontro conhecido nas lendas dos anos 60
como “Factory” tinha se mudado do seu primeiro endereço, um estúdio prateado
na Rua 47 Leste, para um estúdio branco e cheio de espelhos que ocupou todo o
sexto andar do número 33 da Union Square Oeste.
Andy adorava a Union Square – as árvores no parque e o estúdio com vista
para o imponente edifício da Con Edison, com seu relógio brilhando como uma
lua de bairro, dando as horas dia e noite. Considerada sempre como a fronteira
não oficial entre uptown e downtown, Union Square fica perto da área de
comércio barato da Rua 14. Para o sul, pode-se facilmente ir a pé até o Village
Leste e Oeste e até o Soho.
E, é claro, a um quarteirão de distância na Park Avenue South ficava o
Max’s Kansas City, a incubadora de tantos personagens que apareceram nos
filmes da Factory. Toda noite, celebridades da arte, da moda, da música e do
cinema underground se acotovelavam nos seus cantos favoritos na sala dos
fundos do Max’s e controlavam as roupas, a maquiagem, o humor e os interesses
amorosos uns dos outros, enquanto celebridades de “intercâmbio” de fora da
cidade eram recepcionadas – diretores e produtores da Europa ou Hollywood – e
aguardavam serem arrancadas de “tudo isso” (a notoriedade nova-iorquina) e
serem levadas para “tudo aquilo” (a fama internacional). A arte de Andy
decorava as paredes.
Naquela época, eu era uma estudante universitária no Barnard e me pareceu
que procurar Andy para descobrir se ele precisava de uma datilógrafa ocasional
seria uma boa maneira de colocar algum glamour nos meus anos de estudo. Eu
me apresentei a Andy, explicando que era estudante, e ele sugeriu que eu
trabalhasse para ele sempre que eu pudesse. Então comecei a ir à Factory alguns
dias por semana depois das aulas. Ele e eu repartíamos um escritório de 1,5 x
3,5m cheio – depois eu vim a descobrir que todos os escritórios dele, fossem de
que tamanho fossem, estavam sempre cheios – de quinquilharias. Ele lia os
jornais e bebia suco de cenoura do Brownies, o bar de comida natural na esquina
da Rua 16, enquanto eu transcrevia as fitas que ele me passava de conversas
telefônicas do tempo em que ele estivera em recuperação, primeiro no hospital e
depois na estreita casa vitoriana da Lexington com a 89, na qual ele morava com
a mãe.
Andy chegou em Nova York em 1949 vindo de Pittsburgh e de início
dividiu um apartamento com outras pessoas. Depois ele conseguiu manter um
lugar que fosse só seu. Então sua mãe chegou subitamente à cidade e se mudou
para o apartamento dele, o filho mais moço, dizendo que queria cuidar dele.
Talvez tenha decidido – ou, o que também é provável, ele talvez tenha dito a ela
– que estava trabalhando tanto que não tinha tempo para encontrar uma esposa
que cuidasse dele, porque quando eu conheci Julia Warhola numa tarde de 1969
ela disse olá, pensou um segundo e então concluiu “Você seria boa para meu
Andy – mas ele está muito ocupado”. (A mãe de Andy morou com ele na casa da
89 com a Lexington Avenue até 1971. Por essa época, aparentemente senil, ela
requeria atenção constante e Andy a mandou de volta para Pittsburgh para ser
cuidada por John e Paul, os irmãos dele. Depois de sofrer um colapso, ela
morreu num asilo de Pittsburgh em 1972, mas mesmo para seus amigos mais
chegados, que frequentemente perguntavam “Como está sua mãe?”, Andy
continuou a dizer por vários anos “Ah, está bem”.) Nas minhas primeiras
semanas na Factory, amigos que Andy não via desde antes do atentado –
superstars como Viva e Ondine e Nico, ou Lou Reed ou os outros integrantes do
Velvet Underground – iam ao estúdio da Union Square para perguntar como ele
estava. Normalmente ele assegurava que estava “Ah, bem” ou ocasionalmente
fazia piadas dizendo “Com minhas mãos”. Brigid Berlin, também conhecida
como Brigid Polk, a filha mais velha do veterano diretor da Hearst Corporation,
Richard E. Berlin, estrelara Chelsea Girls, o filme de Andy, e agora vinha
ganhar um pouco de dinheiro permitindo que Andy gravasse a conversa dela
sobre, digamos, o que tinha acontecido na noite anterior na sala dos fundos do
Max’s ou com quem ela tinha conversado ao telefone naquela manhã no seu
quartinho do George Washington Hotel, ali perto; quando ela terminava ele
tirava o talão de cheques e a recompensava pela performance com $25 (algumas
vezes aumentados até $50). Em cada uma dessas reuniões pós-atentado com seus
amigos, algo no rosto de Andy dizia que ele estava deslumbrado por ainda estar
vivo para vê-los. Num determinado momento no hospital, um pouco antes de
conseguirem revivê-lo, os médicos pensaram que ele estava morto e Andy, num
estado de semiconsciência, ouviu quando eles disseram isso; a partir de junho de
1968, ele passou a se considerar um homem que tinha oficialmente “voltado da
morte”.
De início Andy e eu não conversávamos muito. Por muitas semanas eu só
transcrevia e ele ficava só sentado ali, a uns poucos metros de distância da minha
máquina de escrever, lendo e atendendo telefonemas. Na maior parte do tempo o
rosto dele ficava impassível. Havia definitivamente uma sensação esquisita em
relação a ele – ele se movia de um jeito estranho. Finalmente me dei conta que
era porque o seu peito ainda estava enrolado em gaze cirúrgica – algumas vezes
o sangue dos ferimentos em cicatrização passava para a camisa. Mas quando
Andy ria o que era esquisito desaparecia e todo o seu rosto se transformava – aí
eu o achava encantador.
Andy era polido e humilde. Raramente dizia a alguém o que fazer – ele
apenas perguntava num tom esperançoso: “Você acha que você poderia...?”.
Tratava a todos com respeito, nunca criticava ninguém. E fazia todos se sentirem
importantes, pedindo opiniões e perguntando sobre a vida de cada um. Esperava
que cada um que trabalhasse para ele cumprisse sua tarefa, mas mesmo assim
ficava agradecido quando isso acontecia – sabia que qualquer grau de
competência é difícil de encontrar, mesmo quando você se dispõe a pagar. E
ficava especialmente grato por qualquer coisa extra que alguém fizesse por ele.
Eu nunca ouvi ninguém dizer “Obrigado” mais do que Andy e, da maneira como
dizia, se sabia que estava falando sério. “Obrigado” foi a última coisa que ele
disse para mim.
Dependendo do seu humor, Andy tinha três maneiras de tratar a
incompetência dos empregados. Algumas vezes os observava por vários minutos
e aí, levantando as sobrancelhas e fechando os olhos filosoficamente, dava meia-
volta e saía sem dizer nada; às vezes reclamava e resmungava por meia hora a
respeito do transgressor, embora ninguém jamais fosse despedido; e algumas
vezes ele subitamente começava a improvisar uma imitação da pessoa, nunca
uma imitação literal, mas mais a sua interpretação da visão que eles tinham de si
próprios – e era sempre divertido.
As piores coisas que Andy podia pensar em dizer de alguém era “Ele é o
tipo de pessoa que pensa que é melhor que a gente” ou, simplesmente, “Ele
pensa que é um intelectual”. Andy sabia que uma boa ideia pode surgir de
qualquer lugar; nunca se impressionava com currículos.
Com o que ele se impressionava, então? Fama – velha, nova ou desbotada.
Beleza. Talento clássico. Talento inovador. Toda pessoa que fizesse algo
primeiro. Um certo tipo de insolência escandalosa. Gente de bom papo. Dinheiro
– especialmente muito dinheiro, sólido, totalmente americano. Ao contrário do
que muitos leitores de colunas sociais possam pensar depois de terem visto o
nome de Andy na imprensa tantas vezes nesses anos todos em tantos
acontecimentos envolvendo a realeza europeia, títulos de nobreza estrangeira
não o impressionavam – ele sempre os entendia completamente mal ou, no
mínimo, os pronunciava absolutamente mal.
Nunca considerou que o seu sucesso fosse natural: ficava excitado por tê-lo.
A sua humildade constante e a sua polidez eram as duas coisas de que eu mais
gostava nele e, tanto quanto tenha mudado e evoluído através dos anos em que o
conheci, essas qualidades nunca diminuíram.
Depois de poucas semanas de datilografia voluntária, tive de estudar para
exames de meio de semestre e deixei de ir até downtown. Eu supus que Andy
provavelmente nem notaria a minha ausência (eu ainda não tinha compreendido
que a sua expressão passiva não queria dizer que não estivesse observando até os
mínimos detalhes) e fiquei surpresa quando alguém bateu na porta do meu
quarto no dormitório dizendo que um “Andy” estava no telefone. Eu não podia
acreditar que sequer se lembrasse em que escola eu estudava, muito menos em
qual dormitório eu morava. Onde eu estava, ele queria saber. E, para se certificar
que eu voltaria, “adoçou a dose” oferecendo-se para pagar minha passagem de
metrô até o “trabalho”. Uma passagem custava então vinte centavos.
A maior atividade da Factory nos anos 1968-72 era a filmagem de longas-
metragens em l6mm (ampliados para 35mm para o lançamento comercial) com o
pessoal desconhecido que vivia no Max’s ou que vinha à Factory para ser
“descoberto”. Durante o verão de 1968, quando Andy estava em casa, acamado,
recuperando-se dos ferimentos, Paul Morrissey, um diplomado da Fordham que
havia trabalhado numa companhia de seguros e que até o atentado tinha
auxiliado Andy nos filmes da Factory, fez um filme por conta própria: Flesh. O
ator principal era o lindo recepcionista/faz-tudo da Factory, Joe Dallesandro, um
irresistível garoto de programa que estava tentando conseguir dinheiro para o
aborto da namorada, e no outono de 1968 Flesh começou a ser exibido
comercialmente no Garrick Theater da Bleecker Street.
O auxiliar de Paul em Flesh era Jed Johnson, que tinha começado a
trabalhar na Factory na primavera, logo depois que ele e Jay, seu irmão gêmeo,
chegaram de Sacramento. As primeiras tarefas de Jed na Factory foram raspar a
pintura das esquadrias das janelas que davam para o Union Square Park e
construir estantes nos fundos do estúdio para acomodar as latas de filme. No
tempo livre ele aprendeu por si mesmo a montar filmes na moviola da Factory,
brincando com rolos de San Diego Surf e Lonesome Cowboys, dois filmes que
tinham sido feitos por Andy numa viagem de filmagens da Factory ao Arizona e
à California um pouco antes do atentado.
Quando a Factory se mudou para Union Square, Billy Name, o fotógrafo
que tinha sido responsável pela atmosfera prateada da Factory da Rua 47 e pela
sua vida social centrada nas anfetaminas, passou a morar no pequeno quarto
escuro que montou nos fundos do estúdio. No espaço de uns poucos meses em
1968 e no começo de 1969, começou a evitar as atividades diurnas da Factory e
passou a emergir do quarto escuro somente à noite e quando todo mundo já tinha
ido embora. Pratos vazios de comida comprada jogados no cesto de lixo eram os
únicos indícios, no dia seguinte, de que estava vivo e se alimentando. Depois de
mais de um ano dessa vida eremita e noturna, uma manhã Jed chegou como
sempre para abrir o estúdio e encontrou a porta do quarto escuro aberta.
– Billy tinha ido embora.
Gerard Malanga, um dos assistentes de pintura de Andy nos anos 60 e ator
dos primeiros filmes como Vinyl e Kiss, compartilhava uma das duas grandes
mesas da parte da frente do estúdio com Fred Hughes, que estava recém
chegando à sua posição de empresário da carreira artística de Andy. Fred tinha
entrado no mundo dos marchands através do seu trabalho com a família De
Menil, mecenas e filantropos de Houston, sua cidade natal. Andy ficou muito
impressionado com Fred por duas coisas: primeiro, a curto prazo, Fred o tinha
apresentado para uma família rica e generosa e depois, a longo prazo, teve uma
rara compreensão e respeito pela arte de Andy e um sexto sentido para como,
quando e onde mostrá-la. Da sua metade da mesa, Gerard atendia telefones
enquanto escrevia poesia, e em 1969 Andy decidiu criar uma revista chamada
inter/VIEW. Durante pouco tempo Gerard foi o editor da revista, antes de trocar
Nova York pela Europa.
A outra grande mesa pertencia a Paul, que fez ampliações coloridas das
superstars atrás de si, incluindo duas “Garotas do ano”, Viva e International
Velvet (Susan Bottomly). Paul fez Trash (1970) e Heat (1971). Women in Revolt
e L’Amour, filmados durante esse mesmo período, foram projetos conjuntos da
Factory com Andy, Paul, Fred e Jed, todos envolvidos na escolha do elenco, na
filmagem e na montagem. Então em 1972 Paul foi para Itália dirigir dois filmes
para a produtora de Carlo Ponti que foram finalmente “apresentados” por Andy
– Andy Warhol’s Frankenstein e Andy Warhol’s Dracula. Jed e eu fomos para a
Itália trabalhar nesses filmes e depois de terminados Paul ficou na Europa,
praticamente encerrando sua participação como uma grande influência na
Factory.
Nessa época Fred estava tratando de todos os assuntos de escritório e
auxiliando Andy a tomar decisões de negócios. Vincent Fremont, que viera a
Nova York de carro atravessando o país desde San Diego e tinha começado a
trabalhar na Factory no outono de 1969, era agora o gerente geral do escritório.
No verão de 1974 a Factory se transferiu da 33 Union Square Oeste para o
terceiro andar da 860 Broadway – a apenas meio quarteirão de distância. Por
essa época, Andy orientou as telefonistas para que parassem de atender o
telefone dizendo “Factory” – “Factory” tinha se tornado “muito cafona”, ele
disse – e o lugar se transformou simplesmente no “escritório”. Bob Colaciello,
que tinha se diplomado na School of Foreign Service da Georgetown University
e que viera à Factory para escrever uma resenha de Trash para o Village Voice,
estava agora trabalhando a maior parte do tempo na revista (então chamada, com
uma pequena mudança de nome, Andy Warhol’s Interview), escrevendo artigos e
assinando sua coluna, “OUT”, que era a crônica da sua própria vida social diária
e que todos os meses lançava uma carga enorme de nomes. Em 1974, Bob
Colacello (que já tinha abandonado o “i”) se tornou oficialmente o editor-
executivo da revista, formando a sua imagem política, conservadora e
sexualmente andrógina. (Não era uma revista de família – uma pesquisa no final
dos anos 70 concluiu que “o leitor médio de Interview é criança na proporção de
mais ou menos .001”). A política editorial e de anúncios da revista era elitista a
ponto de ser dedicada – como uma vez Bob explicou, às gargalhadas – à
“restauração das mais glamourosas, e mais esquecidas, ditaduras e monarquias
do mundo”. Era um objetivo, muitos destacaram, que parecia incongruente com
o sotaque do Brooklyn de Bob, mas isso não o impediu de especificar
exatamente de quais monarquias ele mais sentia falta e por quê.
Quando Andy decidiu lançar a revista, em 1969, a ideia era de orientá-la
para o cinema. Ele queria que os astros falassem – nas suas próprias palavras,
sem retoques – e, sempre que possível, que fossem entrevistados por outros
astros. Isso era algo novo no mundo das revistas. E já que a filosofia comercial
de Andy era iniciar as coisas com um orçamento reduzido e ir crescendo aos
poucos – de início financie a si mesmo para que, quando o negócio valer mais,
você, e não um investidor, seja o proprietário majoritário –, a revista foi
publicada com um orçamento minúsculo. Para dar uma ideia de quão minúsculo
era o orçamento: no primeiro número, um entrevistado tinha se referido a um
