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CAPITÃO RODRIGO
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CIRTO
CAPITÃO ROBRIGO
. 32" EDiÇÃO
Copyright © 1987 by Mafalda Volpe Verissimo,
Clarissa Verissimo Jaffe e Luis Fernando Verissimo
Projeto gráfico: Rui de Oliveira
Ilustrações: Lúcia Brandão
Todos os direitos desta edição reservados a
EDITORA GLOBO S.A.
Rua Domingos Sérgio dos Anjos, 277, CEP 05136, São Paulo.
Te!.: (OH) 836-5000, Fax: (Oll) 864-0271, SI'.
Brasil
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Impressão e acabamento: Paulus Gráfica
CIP-BrasiL Catalogação-na-fonte - Câmara BrasUeira do livro, SP
Verissimo, Erico, 1905-1975.
Um certo capitão Rodrigo / Erico Verissimo. - 32. ed. - São
Paulo: Globo, 1997.
ISBN 85-250-0508-8
1. Romance brasileiro I. TItulo
89-0086 CDD-869.935
Índices para catálogo sistemático:
1. Romances: Século 20 : Lileratura brasileira 869.935
2. Século 20 : Romances: Literatura brasileira H69.935
Pequena Biografia do Autor
ERICO VERISSIMO nasceu em Cruz Alta, RS, a 17-12-1905, filho de Sebastião
Verissimo da Fonseca e Abegahy Lopes Verissimo. Esrudou no Colégio Cruzeiro
do Sul em Porto Alegre e, de volta à cidade natal, trabalhou por algum tempo num
banco, tornando-se depois sócio de uma farmácia. Ali, entre remédios e o namoro
com Mafalda Halfen Volpe, que iria desposar em 1931, dedicava as horas vagas
à leirura, principalI?ente de Ib~n,. ShakesIJ.<:are, George Bernard .Sha;",.' Oscar Wilde
e Machado de ASSIS, que muno mfluenClaram sua formação Inerarla.
Em 1930, tendo seus primeiros contos divulgados em jornais da capital gaúcha (es
treou com Ladrão de Gado, na Revista do Globo, em 1928), transferiu-se pa,ra lá
e ingressou como redator na referida revista. Iria encontrar seu lugar certo, porém,
cOmO secretário do Departamento Editorial da I1vraria do Globo, a convite do edi
tor Henrique Bertaso, com quem colaborou por longos anos.
Em 1932, com a edição de Fantoches, pela I1vraria do Globo, iniciou sua brilhante car
reira literária, que viria a alcançar, a parcit de 1938, repercussão nacional e, mais tarde, in
ternacional. Já em 1934 conquistava, com seu romance Músiúz ao Longe, o Prêmio Ma
chado de Assis, da Cia. Editora Nacional e, no ano seguinte, seu Caminhos Cruzados
era premiado pela Fundação Graça Aranha. Foi com Olhai os Unos do Campo, entre
tanto, que seu nome se fez largamente popular, atingindo a todos os pontos do país.
Desde 1943, quando viajou pela primeira vez aos Estados Unidos, empenhou-se em divul
gar a literarura e ac ulrura brasileira no exterior, em conferências e cursos que se realizaram
nos mais diversos países (México, Equador, Peru, Uruguai, França, Espanha, Portugal,
Alemanha etc.). Seu prestígio internacional cresceu a tal ponto que, em 1953, por indi
cação do Ministério das Rc:laçãc:s Exteriores do Brasil, assumiu a direção do Departamento
de Assuntos Culturais da OEA, cargo que exerceu por três anos em Washington, D.C.
Até 1950 esteve ligado à Editora Globo, na qualidade de conselheiro literário,
função que nunca abandonou de todo, embora mais adiante tivesse preferido voltar
se inteiramente para sua vocação de escritor, a que deu foros de verdadeira profis
são, sustentando-se com os rendimentos de sua obra publicada. Para a Globo,
traduziu também mais de cinqüenta títulos do inglês, francês, italiano e espa
nhol, além de organizar várias coleções literárias célebres, como a Nobc:l e a Bi
blioteca dos Séculos.
Sua obra logo espalhou-se pelo mun,do, em .traduções publicadas nos EUA, In
glaterra, França, Itália, Alemanha, Austria, México, URSS, Noruega, Holanda,
Hungria, Romênia e Argentina. No Brasil, recebeu, entre outroS, os prêmios Ja
buti (1966), Juca Pato (1967), Personalidade I1terária do Ano (PEN Club, 1972)
e o Prêmio I1terário da Fundação Moinhos Sancisú. (1973) para o conjunto da obra.
Viajante apaixonado, esteve ainda na Grécia, Oriente Médio e Israel, e retornou
várias veze~ à Europa e aos EUA. Faleceu subitamente, de infarto, a 28-11-1975,
em POrto Alegre, q1Jando se ocupava com o segundo volume de suas memórias,
S% de Clan·neta. A cronologia de sua obra completa é a seguinte:
1932 - FANTOCHES, contos
1933 - CLARISSA, romance
1935 - MÚSICA AO LONGE, romance
- CAMINHOS CRUZADOS, romance
- A VIDA DE JOANA D'ARC, literatura infanto-juvenil
1936 - AS AV ENTIJRAS DO AVIÃO VERMELHO, literatura infantil
- OS TRÊs PORQUINHOS POBRES, literatura infantil
- ROSA MARIA NO CASlELO ENCANTADO, literatura infantil
- UM LUGAR AO SOL, romance
1937 - AS AVENTURAS DE TIBICUERA, literatura infantil
1938 - O URSO-COM-MÚSICA-NA-BARRIGA, literatura infantil·
. - OlHAI OS ÚRIOS DO CAMPO, romance
1939 - A VIDA DO ELEFANJE BASilio, literatura infantil
- OUTRA V!lZ OS TRÊs PORQUINHOS, literatura infantil
- VIAGEM A AURORA DO MUNDO, literatura infanto-juvenil
- AV ENTIJRAS NO MUNDO DA HIGIENE, literatura infantil
1940 - SAGA, romance ·
1941 - GATO PRETO EM CAMPO DE NEVE, viagens
1942 - AS MÃOS DE MEU FIlHO, contos
1943 - O RESTO É SIIÍNCIO, romance
1945 - BRAZILIAN LIJERATURE, An outline
1946 - A VOLTA DO GATO PRETO, viagens
1949 - O lEMPO E O VENTO, 1 ~ Parte: O Continente, 2 vols.; romance
1951 - O lEMPO E O VENTO, 2~ 'Parte: O Retrato, 2 vols., romance
1954 - NOIlE, novela
1956 - GENJE E BICHOS, literatura infantil (antologia)
1957 - MÉXIco, viagens
1959 - O ATAQUE, contos .
1961/62 - O lEMPO E O VENTO, 3~ Parte: O Arquipélago, 3 vols., romance
1965 - O SENHOR EMBAIXADOR, romance
1966 - FICÇÃO COMPLETA, edição em papel-bíblia 'i
1967 - O PRISIONEIRO, romance
1969 - ISRAEL EM ABRIl, viagens
1970 - UM CERTO CAPITÃO RODRIGO (extrato de O Continente, 1)'
1971 - ANA lERRA (eXtrato de O Continente, 1)
- INCIDENJE EM ANTARES, romance
1972 - UM CERTO HENRIQUE BERTASO, biografia
1973 - SOLO DE ClARINETA, I? vol., memórias
1975 - A PONlE (eXtrato de O Ataque), edição de luxo, ilustrada
1976 - SOLO DE ClARINETA, 2? vol., memórias (edição póstuma)
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Toda gente tinha achado estranha a maneira como o Capo Ro
drigo Cambará entrara na vida de Santa Fé. Um dia chegou a cava
lo, vindo ninguém sabia de onde, com o chapéu de barbicacho pu
xado para a nuca, a bela cabeça de macho altivamente erguida,
e aquele seu olhar de gavião que irritava e ao mesmo tempo fasci
nava as· pessoas. Devia andar lá pelo meio da casa dos trinta, mon
tava um alazão, vestia calças de riscado, botas com chilenas de pra
ta e o busto musculoso apertado num dólmã militar azul, com go
la vermelha e botões de metal. Tinha um violão a tiracolo; sua es
pada, apresilhada aos arreios, rebrilhava ao sol daquela tarde de
outubro de 1828 e o lenço encarnad~ que trazia ao pescoço esvoa
çava no ar como uma bandeira. Apeou na frente da venda do Ni
colau, amarrou o alazão no tronco dum cinamomo, entrou arras
tando as esporas, batendo na coxa direita com o rebenque, e foi
logo gritando, assim com ar de velho conhecido:
- Buenas e me espalho! Nos pequenos dou de prancha e nos
grandes dou de talho!
o
Havia por ali uns dois ou .três homens, que miraram de sos
laio sem dizer palavra. Mas dum canto da sala ergueu-se um moço
moreno, que puxou a faca, olhou para Rodrigo e ·exclamou:
- Pois dê!
Os outros homens afastaram-se como para deixar a arena li
vre, e Nicolau, atrás do baléão, começou a gritar:
- Aqui dentro não! Lá fora! Lá fora!
Rodrigo, porém, sorria, imóvel, de pernas abertas, rebenque
pendente do pulso, mãos na cintura, olhando para o outro com
um ar que era ao mesmo tempo de desafio e simpatia.
- Incomodou-se, amigo? - perguntou, jovial, examinan
do o rapaz de alto a baixo.
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'- Não sou de briga, mas não costumo agüentar desaforo.
- Oôi bicho bom!
Os olhos de Rodrigo tinham uma expressão cômica.
- Essa sai ou não sai? - perguntou alguém do lado de fora,
vendo que Rodrigo não desembainhava a adaga. O recém~chegado
voltou a cabeça e respondeu calmo:
- Não sai. Estou cansado de pelear. Não quero puxar arma
pelo menos por um mês. - Voltou-se para o homem moreno e,
num tom sério e conciliador, disse: - Guarde a arma, amigo.
O outro, entretanto, continuou de cenho fechado e faca em
punho. Era um tipo indiático, de grossas sobrancelhas negras e zi
gomas salientes.
- Vamos, companheiro - insistiu Rodrigo. - Um homem
não briga debalde. Eu não quis ofender ninguém. Foi uma manei
ra de falar ...
Depois de alguma relut.ância o outro guardou a arma, meio
desajeitado, e Rodrigo estendeu-lhe a mão, dizendo:
- Aperte os ossos.
O caboclo teve uma breve hesitação, mas por fIm, sempre sé-
rio, apertou a mão que Rodrigo lhe oferecia.
- Agora vamos tomar um trago - convidou este último.
- Mas eu pago - disse o outro.
Tinha lábios grossos, dum pardo avermelhado e ressequido.
- O convite é meu.
- Mas eu pago - repetiu o caboclo.
- Está bem. Não vamos brigar por isso.
Aproximaram-se do balcão.
- Duas caninhas! - pediu Rodrigo.
Nicolau olhava para os dois homens com um sorriso des
dentado na cara de lua cheia, onde apontava uma barba grossa
e falha.
- É da boa - disSe ele, abrindo uma garrafa de cachaça e
enchendo dois copinhos.
Houve um silêncio durante o qual ambos beberam: o moço
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