Table Of ContentHELDER MIGUEL GRAÇA FERNANDES
O Bem‐Estar Psicológico em Adolescentes
Uma abordagem centrada no florescimento humano
Este trabalho foi expressamente elaborado com vista à
obtenção do grau de Doutor em Psicologia, de acordo
com o disposto no Decreto‐Lei 216/92 de 13 de Outubro,
sob orientação do Prof. Dr. José J. B. Vasconcelos Raposo
Universidade de Trás‐os‐Montes e Alto Douro
Vila Real, 2007
“Não é o que não sabemos que nos
cria problemas, é aquilo de que temos
a certeza e que afinal não é assim.”
Mark Twain
Em memória eterna da minha avó materna,
Lídia Cardosa Costa
AGRADECIMENTOS
O presente trabalho constitui mais uma etapa do nosso percurso académico como docente e
investigador, e acima de tudo, como ser humano. Passados quatros anos da nossa formação inicial,
procurámos com esta dissertação desenvolver e aprofundar os saberes de muitos sabores
necessários à nossa prática profissional e curiosidade intelectual. Olhando agora ao tema deste
trabalho, deparamo‐nos com uma interessante peculiaridade algo controversa, mas por outro lado,
também esclarecedora. Também o nosso bem‐estar nas suas demais facetas esteve em jogo na
feitura deste texto académico e como em todos os jogos, houve importantes ilações a retirar das
derrotas e vitórias alcançadas. Esta experiência ofereceu‐nos, convictamente, uma miríade de
desafios, exigências e oportunidades unicamente superadas através de uma intensa implicação
pessoal, profissional e algumas das vezes, familiar. Como em quase todos os objectivos que
subsistiram na nossa existência até ao momento, procurámos retirar o melhor de cada experiência,
para, conciliadoramente, incitarmos ao nosso crescimento e desenvolvimento imerso na busca de
uma felicidade e bem‐estar pessoal. Todavia, esta tese que agora concluímos e apresentamos, não
poderia existir sem o contributo inegável e decisivo de muitas pessoas, que mesmo com a sua
merecida referência neste espaço, saberemos que tal gratidão não será suficiente para reconhecer e
enaltecer a importância destas ao longo do nosso curso de vida.
Antes de mais, gostaríamos de agradecer à Universidade de Trás‐os‐Montes e Alto Douro, na
pessoa do seu Magnífico Reitor Prof. Doutor Armando Mascarenhas Ferreira, a possibilidade e as
condições proporcionadas para a elaboração e concretização do presente projecto de investigação.
Ao Prof. Doutor José J. B. Vasconcelos Raposo, orientador científico desta tese, expressamos
o nosso imenso e profundo reconhecimento por todo o apoio, rigor e exigência demonstrada ao
longo da nossa formação académica, como também, todas as oportunidades e dificuldades
proporcionadas em cada momento da presente dissertação. Por todos os encorajamentos,
disponibilidade e ensinamentos derivados da sua sólida experiência e formação científica, com que
sempre nos presenteou, o nosso muito bem‐haja!
Aos amigos Dr.os João Paulo Lázaro e Carlos Almeida, parceiros de viagem neste percurso
académico, gostaríamos de destacar o privilégio que foi para nós, partilhar os anseios, dificuldades e
oportunidades vivenciadas ao longo dos últimos três anos. Esta experiência interpessoal, em muito
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nos encorajou e auxiliou na preparação do presente trabalho, pelo que gostaríamos de manifestar a
nossa maior gratidão pela frutuosa colaboração.
Aos colegas Dr.os Henrique Costa, Miguel Moreira, Marco Monteiro, Carla Seiceira, Victor
Pinto, Rui Costa, Ricardo Matos, Marco Novo, Ricardo Inácio, Célia Teixeira, Cristina Jorge, Leonor
Quintal, Márcia Monteiro e Susana Silva, agradecemos a preciosa colaboração e auxílio prestados
nos múltiplos processos de recolha de dados que ocorreram em distintas fases da pesquisa, bem
como, todos os inestimáveis encorajamentos e incentivos que em muito nos ajudaram a ultrapassar
as adversidades inerentes à simultaneidade da nossa prática docente profissional e preparação da
presente investigação.
À nossa família e em especial aos pais António Fernandes e Maria Benilde e à mana Joana
Mafalda gostaríamos de agradecer os constantes carinhos, ternuras e afectos com que nos
presentearam, principalmente nos momentos mais difíceis deste projecto. Quer seja pela felicidade e
bem‐estar com que nos congratulam, quer seja pelo auxílio em todos as dimensões da nossa vida,
todos os reconhecimentos e agradecimentos são poucos para expressar a nossa estima por vocês.
À mana Cristina Fernandes, ao cunhado António Torres e à sobrinha Marta Alexandra
expressamos a nossa maior gratidão pelo constante entusiasmo e apoio com que generosamente nos
consagraram e que constituiu uma inestimável fonte de energia e de bem‐estar, para levar a bom
rumo esta expedição.
À Si, porque tal como a eudaimonia se alcança através de uma conquista pessoal situada
numa esfera interpessoal, também esperamos que a nossa afinidade se alicerce numa conquista
infinita do bem‐estar comum, ancorado no espírito de partilha, compreensão, amizade e afeição.
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RESUMO
O domínio de investigação da dinâmica psicológica do bem‐estar constitui‐se, actualmente, por duas
perspectivas que se organizam em torno de dois modelos, que apesar de comungarem do mesmo objecto de
estudo, possuem distintas géneses, percursos e orientações teórico‐empíricas. O primeiro, denominado de
Bem‐Estar Subjectivo, possui em Ed Diener o seu principal investigador e sistematizador, pelo que esta área
visa, primordialmente, a compreensão da dimensão afectiva (felicidade) e cognitiva (satisfação com a vida) da
avaliação subjectiva que cada indivíduo faz das suas experiências de vida. Por sua vez, o segundo modelo
intitulado de Bem‐Estar Psicológico, foi concebido por Carol Ryff com base em diversas concepções da auto‐
realização e crescimento pessoal, propondo um modelo multidimensional de funcionamento psicológico
positivo constituído por seis dimensões: autonomia, domínio do meio, crescimento pessoal, relações positivas
com os outros, objectivos na vida e aceitação de si.
Tendo em consideração simultânea a idiossincrasia própria do bem‐estar durante a adolescência e a
prevalência da abordagem psicopatológica deste construto durante este período de vida, o presente estudo
pretendeu compreender a dinâmica desenvolvimentista da personalidade, felicidade e saúde mental dos
adolescentes, tendo por base de argumentação e entendimento do quadro empírico obtido, o
desenvolvimento do seu funcionamento psicológico – florescimento humano.
Num primeiro momento e dada a ausência de instrumentos especificamente desenvolvidos e validados para o
efeito, efectuámos quatro estudos de adaptação e análise das características psicométricas das escalas de Ryff
(1989b) em amostras adolescentes, o que possibilitou o desenvolvimento de uma versão adequada ao nível
psicométrico e semântico. Num segundo momento, estas escalas de bem‐estar psicológico conjuntamente com
outras medidas de avaliação biológica, psicológica e sociocultural (sexo, idade, local de residência, estatuto
socioeconómico, número de irmãos, posição ordinal na fratria, estrutura familiar, relação com os pais, prática
religiosa, religiosidade, satisfação corporal, ansiedade social, satisfação escolar e auto‐estima), foram
respondidas por uma amostra de 698 adolescentes (381 raparigas e 317 rapazes) com idades compreendidas
entre os 12 e os 18 anos (M=15.02; DP=1.83).
Uma primeira análise descritiva do valor do bem‐estar global ao longo da adolescência indiciou uma evolução
não uniforme desta dimensão à medida que a idade dos adolescentes avança, apresentando‐se períodos
alternados de menor e maior bem‐estar. Não obstante, somente 3 em cada 10 (30.5%) adolescentes cumpriu o
critério de florescimento psicológico, traduzido por elevados níveis de funcionamento psicológico positivo. Ao
nível da análise inferencial, diferentes variáveis apresentaram‐se como importantes correlatos e predictores,
pelo que a análise de regressão múltipla hierárquica permitiu explicar cerca de 37% da variância do bem‐estar
psicológico (R2 =0.357), destacando‐se os seguintes factores significativos de influência: biológico – idade
ajustado
(β=0.114) e sexo (β=0.077); psicológico – auto‐estima (β=0.514), satisfação escolar (β=0.132) e ansiedade social
(β= ‐0.120); e, sociocultural – relação com os pais (β=0.142), estrutura familiar (β= ‐0.075) e local de residência
(β=0.058).
No global, esta miríade de resultados interpretados à luz do modelo ecológico de Vasconcelos‐Raposo (1993) e
sustentados nos princípios da psicologia cultural, permitiu a identificação e caracterização das configurações
específicas das dimensões do bem‐estar psicológico durante a adolescência, devidamente alicerçadas numa
perspectiva de florescimento humano.
Palavras‐chave: bem‐estar psicológico, adolescentes, modelo ecológico, florescimento humano
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ABSTRACT
The research field centred in the psychological dynamics of well‐being is actually formed by two traditions that
revolve around two models. Nevertheless they share the same object of study, they possess distinct origins,
roots and theoretical and empirical formulations. The first approach, labelled Subjective Well‐Being has in Ed
Diener its main researcher and tends to manly focus in the understanding of the affective (happiness) and
cognitive (life satisfaction) dimensions of evaluations each person makes about their life experiences.
Consequently, the second approach entitled Psychological Well‐Being was developed by Carol Ryff recurring to
an extensive theoretical grounding on the contours of self‐realization and personal growth, suggesting an
alternative multidimensional model of positive psychological functioning comprised by six dimensions:
autonomy, environmental mastery, personal growth, positive relations with others, purpose in life and self‐
acceptance.
Considering at the same time the specific idiosyncrasy of well‐being during adolescence and the predominance
of this indicator’s psychopathological evaluation during this life period, the present study sets to understand the
developmental dynamics of the adolescents’ personality, happiness and mental health, taking into
consideration their psychological functioning development – human flourishing – as a form of examining and
understanding the empirical data.
First of all e since there weren’t any psychological instruments specifically developed and validated for this
purpose, we conducted four researches focused in the adaptation and analysis of the psychometrical properties
of Ryff’s (1989b) scales in adolescent samples, which allowed the development of and adequate version at the
psychometric and semantic levels. Following this, these scales of psychological well‐being were completed
jointly with other measures of biological, psychological and sociocultural assessment (sex, age, place of
residence, socioeconomic status, number of brothers, ordinal position, family structure, parental relationships,
religious involvement, religiosity, body satisfaction, social anxiety, school satisfaction and self‐esteem) by a
sample of 698 adolescents (381 girls and 317 boys) with ages between 12 and 18 years (M=15.02; SD=1.83).
An initial descriptive examination of the global well‐being through adolescence revealed a non regular evolution
of this dimension as adolescents get older, shaped by alternating periods of lower and higher well‐being.
However, only 3 in each 10 (30.5%) adolescents met the criteria for the presence of mental health (i.e.
flourishing), established by high levels of positive psychological functioning. At the stage of inferential analysis,
distinct variables assumed important roles as correlates and predictores, whilst the hierarchical multiple
regression accounted to 37% of the psychological well‐being total variance (R2 =0.357) and revealed the
adjusted
following major predictors: biological – age (β=0.114) and sex (β=0.077); psychological – self‐esteem (β=0.514),
school satisfaction (β=0.132) and social anxiety (β= ‐0.120); and, sociocultural – parental relationships (β=0.142),
family structure (β= ‐0.075) and place of residence (β=0.058).
Overall, these results interpreted with reference to the ecological model proposed by Vasconcelos‐Raposo (1993)
and sustained with the cultural psychology principles, allowed to identify and characterize the specific variation
of the psychological well‐being dimensions during adolescence, pertaining to a human flourishing perspective.
Key‐words: psychological well‐being, adolescents, ecological model, human flourishing
Página IV
ÍNDICE GERAL
AGRADECIMENTOS............................................................................................................................................. I
RESUMO........................................................................................................................................................ III
ABSTRACT...................................................................................................................................................... IV
ÍNDICE GERAL.................................................................................................................................................. V
ÍNDICE DE QUADROS......................................................................................................................................... IX
ÍNDICE DE FIGURAS........................................................................................................................................... XI
LISTA DE ABREVIATURAS................................................................................................................................... XII
INTRODUÇÃO................................................................................................................................................... 1
1.1 Delimitação do tema........................................................................................................................... 6
1.2 Organização da investigação............................................................................................................. 10
REVISÃO DA LITERATURA.................................................................................................................................. 13
2.1 Saúde mental e personalidade.......................................................................................................... 14
2.1.1 Génese e âmbitos de intervenção da psicologia positiva................................................................... 22
2.1.2 A abordagem hedónica: O bem‐estar subjectivo............................................................................... 30
2.1.2.1 Fundamentos históricos............................................................................................................. 31
2.1.2.2 Delimitação conceptual.............................................................................................................. 33
2.1.2.3 Medidas de avaliação................................................................................................................ 36
2.1.2.4 Perspectivas de investigação e principais resultados empíricos................................................ 43
2.1.2.4.1 Variáveis demográficas – idade e sexo............................................................................ 44
2.1.2.4.2 Religião............................................................................................................................ 46
2.1.2.4.3 Recursos económicos....................................................................................................... 48
2.1.2.4.4 Dinâmica psicológica e experiências emocionais............................................................. 50
2.1.2.4.5 Traços de personalidade.................................................................................................. 55
2.1.2.4.6 Discrepância entre domínios de satisfação...................................................................... 61
2.1.2.4.7 A interacção indivíduo‐ambiente..................................................................................... 62
2.1.2.4.8 Estudos transculturais...................................................................................................... 63
2.1.2.4.9 O bem‐estar subjectivo em Portugal: Níveis de análise internacional............................. 67
2.1.2.5 O bem‐estar subjectivo em adolescentes................................................................................... 71
2.1.2.5.1 Medidas de avaliação...................................................................................................... 73
2.1.2.5.2 Perspectivas de investigação e principais resultados empíricos...................................... 76
2.1.2.6 Qualidade de vida e bem‐estar subjectivo................................................................................. 86
2.1.3 A abordagem eudaimónica: O bem‐estar psicológico........................................................................ 93
2.1.3.1 Fundamentos históricos............................................................................................................. 95
2.1.3.2 Delimitação conceptual............................................................................................................ 101
2.1.3.3 Medidas de avaliação.............................................................................................................. 109
Página V
2.1.3.4 Perspectivas de investigação e principais resultados empíricos............................................... 110
2.1.3.4.1 Variáveis demográficas – idade e sexo........................................................................... 110
2.1.3.4.2 Religião........................................................................................................................... 112
2.1.3.4.3 Recursos económicos...................................................................................................... 114
2.1.3.4.4 Dinâmica psicológica e traços de personalidade............................................................ 115
2.1.3.4.5 Discrepância entre domínios de satisfação.................................................................... 120
2.1.3.4.6 Estudos transculturais.................................................................................................... 122
2.1.3.4.7 Perspectiva psicossomática do bem‐estar..................................................................... 123
2.1.3.4.8 A terapia do bem‐estar.................................................................................................. 126
2.1.3.5 O bem‐estar psicológico em adolescentes/jovens.................................................................... 127
2.1.4 Outras abordagens análogas do bem‐estar...................................................................................... 133
2.2 Adolescência e bem‐estar................................................................................................................ 139
2.2.1 Limites etários: haverá um consenso?.............................................................................................. 142
2.2.2 Estatuto socioeconómico.................................................................................................................. 145
2.2.3 Ordem de nascimento/Posição ordinal na fratria..............................................................................147
2.2.4 Estrutura familiar.............................................................................................................................. 154
2.2.5 Prática religiosa................................................................................................................................. 160
2.2.6 Satisfação com a escola.................................................................................................................... 164
2.2.7 Satisfação corporal............................................................................................................................ 167
2.2.8 Ansiedade social................................................................................................................................ 170
2.2.9 Auto‐estima...................................................................................................................................... 173
2.2.10 O bem‐estar psicológico em adolescentes: Um novo modelo?...................................................... 179
ESTUDOS PRÉVIOS......................................................................................................................................... 187
3.1 Escalas de Bem‐Estar Psicológico de Carol Ryff................................................................................. 187
3.2 Estudos de adaptação das EBEP a adolescentes................................................................................ 197
3.2.1 Estudo 1............................................................................................................................................ 197
3.2.1.1 Amostra.................................................................................................................................... 199
3.2.1.2 Procedimentos.......................................................................................................................... 199
3.2.1.3 Resultados................................................................................................................................ 200
3.2.2 Estudo 2............................................................................................................................................ 204
3.2.2.1 Amostra.................................................................................................................................... 204
3.2.2.2 Procedimentos.......................................................................................................................... 204
3.2.2.3 Resultados................................................................................................................................ 204
3.2.3 Estudo 3............................................................................................................................................ 208
3.2.3.1 Amostra.................................................................................................................................... 208
3.2.3.2 Procedimentos.......................................................................................................................... 209
3.2.3.3 Resultados................................................................................................................................ 209
3.2.4 Estudo 4............................................................................................................................................ 215
3.2.4.1 Amostra.................................................................................................................................... 216
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Description:disponibilidade e ensinamentos derivados da sua sólida experiência e formação científica, com que sempre nos felicidade como sinónimo do conceito aristotélico de eudaimonia e invocar os ensinamentos de. Tomás de aparência exterior (McArthur, Holbert & Peña, 2005; Tiggemann, 2001a).