Table Of ContentDados de Catalogacao na Publicacao (CIP) Internacional
(Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Yamamoto, Oswaldo Hajime, 1950—
Y18c A crise e as alternativas da psicologia / Oswald() Hajime
Yamamoto. — — Sao Paulo : EDICON, 1987.
1. Psicologia 2. Psicologia — Aspectos sociais 3. Psicologia
como profissao I. Titu10.
CDD-150
-150.23
87-0892 -303.4
Indices para catalog° sistematico:
1. Psicologia 150
2. Psicologia e mudanca social 303.4
3. Psicologia como profissao 150.23
Todos os direitos reservados de acordo
corn a legislacao em vigor
Impress° no Brasil — Printed in Brazil
Editoria
AntOnio Jayro da Fonseca Motta Fagundes
Valentina Ljubtschenko
Producao
Glaucia Cristina Stringhetta Astorfi
Rosane Frigo
Composicao
Maria Angela P. Pirath
Arte-final
Luiz Gomes dos Santos
Capa
Vande Rotta Gomide
EDICOW
Editora e Consultoria Ltda
Rua ltapeva, 85 Fone 289-7477
Cep 01332 Sao Paulo SP
Ref.: 8.764 1987
ND ICE
Agradeci mentos 9
Prefacio — Profa. Dra. Sylvia Leser de Mello 11
Introducao 13
Capitulo I — Psicologia e/na HistOria 16
1. Algumas notas sobre as condicOes para o advento da Psicologia 17
2. E surge a Psicologia cientifica 21
3. A Psicologia como ciencia burguesa e o marxismo: urn pequeno
esclarecimento 27
Notas 30
Capitulo II — Acerca da "Crise da Psicologia" 34
1. 0 que os psicalogos tern feito? 34
2. As criticas a atuacao dos psicalogos 42
Notas 49
Cal:dui° III — Rumo as alternativas 55
1. "Psicologia Alternativa" 55
1.1. Trabalho em instituicOes: urn exemplo 57
1.2. Trabalho na comunidade (ou a "Psicologia comunitaria") 59
2. A "Contra-Psicologia" 63
Notas 66
Capitulo IV — As altemativas que ndo altemam... ou, vale a pena salvar a
Psicologia? 69
1. Das alternativas que nao alternam 69
2. Reformas sociais, gradualismo ou Psicologia critica 72
3. Redefinir ou negar a Psicologia, ou colocando os pingos nos ii 74
Notas
Condusao — A "Furled° social do PsicOlogo" revisitada 78
Notas 80
Referencias Bibliograficas 82
Sobre 0 autor 88
AGRADECIMENTOS
Este trabalho foi apresentado originalmente, como Dissertacao de Mestrado
ern Educagao, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em meados de
1986. A arguicao dos componentes da banca examinadora, a Profa. Maria Doni-
nha de Almeida, o prof. Jose VVillington Germano, e a profa. Dra. Sylvia Leser de
Mello, minha orientadora, propiciaram a oportunidade de rever alguns pontos do
trabal ho.
Gostaria de deixar meu sincero agradecimento a algumas pessoas, inician-
do pela Profa. Sylvia Leser de Mello, pela paciente e dedicada orientagao deste
trabalho. Muito mais que uma orientadora, foi uma grande amiga, corn quem mui-
to aprendi em nosso convivio.
Ao Prof. Jose VVillington Germano e a Profa. Maria Doninha de Almeida, o
reconhecimento pela valiosa colaboracao nas suas arguicaes cuidadosas, obser-
vacoes crfticas e sugestOes apresentadas.
Tambern gostaria de agradecer aos colegas e professores do mestrado em
Educacao da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, especialmente ao
Prof. Dr. Arden Zylbersztajn, pela orientacao do projeto inicial, ao Prof. Dr. Joao
Baptista Campanholi pelo exame de qualificacao, e muito especialmente a Dra.
Neyde Varela Santiago, pela amizade e apoio durante todo o curso.
Nao poderia tambem deixar de registrar meu agradecimento aos alunos e
ex-alunos, principalmente aqueles do curso de Psicologia da Universidade Fede-
ral do Rio Grande do Norte, que sempre se constitufram em incentivo e razao de
ser do nosso trabalho.
Por fim, e corn muito carinho, o meu agradecimento a Maria Emilia., minha
companheira e amiga, pelo estfmulo e compreensao, e aos meus filhos Fernando
e Mattel°, pela tolerancia, sem os quais teria sido impossfvel o desenvolvimento
do trabalho.
A todas estas pessoas, e a todos aqueles que, de uma forma ou de outra,
contribufram para a realizacao deste trabalho, meu sincero reconhecimento.
O.H.Y.
9
PREFACIO
Ha livros que resumem a experiencia de seus autores mas este é mais do
que a historia do trajeto intelectual de seu autor: representa o caminho aproxima-
do que foi percorrido por toda uma geracao de estudantes, professores e profis-
sionais que, sabendo ou nao, faziam a histOria da Psicologia no Brasil. 0 que es-
tá em debate, neste livro, 6 a Psicologia. No entanto, aqui, as perguntas nao sao
aquelas, tantas vezes formuladas, sobre o valor social das praticas psicologicas.
As questdes sao mais centrais. Trata-se de examinar as "alternativas criticas" que
vern sendo propostas ao exercicio da Psicologia ou, ate mesmo, o signiricado da
palavra "altemativa", largamente usada nesta sociedade em que tudo parece es-
trangular a vida dos homens.
Corn esse fim alguns pontos de referencia sao escolhidos e constituem o
arcabougo para organizar a critica as alternativas. Mas o livro nao quer fazer ape-
nas a critica de trabalhos escritos por outros e que Oswaldo tanto valoriza. Sua
ambicao é maior: ele quer examinar o futuro da Psicologia num mundo futuro e
diverso. E a conclusao de Oswaldo é surpreendente. Ao final do trabalho, apos o
exame de "psicologias alternativas" ele pergunta:
"Afinal, o que é entao 'alternativo'?
Fazer urn trabalho assistencialista corn inspiracao funcionalista?
Trabalhar corn a mesma metodologia, e mesmo instrumental e ate a mesma
fundamentacao tedrica, mas de maneira mais competente e abrangente?
Deixar de lado as questrjes estruturais e se preocupar corn reformas so-
ciais?"
A resposta de Oswaldo sugere que seu livro 6, como todo caminho intelec-
tual, tambern um pouco o caminho afetivo do seu autor — crencas, emocoes, valo-
res nao so apregoados mas vividos, estao em causa. A Psicologia 6, talvez, urn
pretexto para aproximar-se da politica, a acao por excelencia e, na verdade, a re-
flexao de Oswaldo a tern coma ponto de partida e como ponto de chegada. Ha
uma filosofia politica subjacente as suas apreciacties sobre a Psicologia e a sua
1 1
coerOncia e esta filosofia 6 total mesmo que ela o remeta a conclusOes incomuns.
A conclusao radical é a marca de sua fidelidade a opcao filosofico-politica
inicial e nao ha equivocos quanto a coragem de Oswaldo que pOe em duvida
aquelas solucdes que, por vezes, se apresentam como redentoras da Psicologia.
0 trabalho tern o merit° da coerencia, menos em nome de uma pureza ideologica
de que da necessidade teorica de nao transigir corn solucoes Weis. E born lem-
brar, sobretudo, que ele nao esta examinando uma certa gama de propostas al-
ternativas para a Psicologia esperando o momento de propor a "sua" alternativa.
A marca pessoal do seu trabalho 6 o reconhecimento permanente do peso da
realidade, sem fugas alternantes.
0 livro é urn apelo a razao — procuramos saber a dimensao exata do que es-
tamos fazendo — e, talvez, uma advertencia aos que se acomodam pensando pra-
ticar a unica Psicologia justa.
Profa. Dra. Sylvia Leser de Mello
Instituto de Psicologia da USP
12
INTRODUcA0
A situacao atual da Psicologia tern sido caracterizada como sendo de "cri-
se". Alguns, como Ades(1978, p. 1055-1056), discutindo o assunto, preferem en-
carar a presente situacao como de "efervescencia", como "sintoma de (...) tensao
constante (...) entre tendencias epistemolOgicas opostas e, ao mesmo tempo,
basicas". A crise, para outros como Deese, é resultante da descrenca cada vez
major corn a qual se encara o metodo cientifico em geral e o metodo experimen-
tal em particular" (ap. ADES, 1978, P. 1055). JA Campos nega que a Psicologia
esteja atravessando uma crise tearica ou metodologica, mas que as "contingen-
cias do mercado estao levando os psicologos a se haverem corn a insuficiencia
de seus modelos de interpretacao do real" (CAMPOS, 1983, p. 83).
Controversias a parte, é inegavel contudo que a reflexao acerca da Psicolo-
gia, envolvendo duas dimensOes, uma "pratica", ou seja, como profissao corn
questionamentos que orbitam em tomb da chamada "funcao social do psicologo",
e outra "tearica", corn questOes como a apontada por Campos sobre a inadequa-
cao dos modelos de interpretacao a intervencao na realidade brasileira, é hoje
uma tarefa urgente.
Associada a essa discussao, e consequencia dela, surgiram ao longo dos
anos 70, estendendo-se ate hoje, experiencias diversas que pretendem ser alter-
nativas para esta situagao "critica" da Psicologia. E tais alternativas estao rela-
cionadas ao significado social da profissao e a urn possivel papel "transformador"
que a Psicologia poderia ter.
o
objetivo deste estudo é discutir a "crise" da Psicologia, e avaliar as "alter-
nativas" que vern sendo apresentadas.
o
Capftulo I apresenta o referencial a partir do qual fazemos a analise. Ini-
ciamos situando historicamente o surgimento desse conjunto aparentemente des-
conexo de "conhecimentos" e "praticas" que chamamos de Psicologia.
13
De acordo corn Lukacs(1968), a separacao da cidade e do campo é a base
da subsuncao do indivfduo a divisao do trabalho, a uma atividade pre-fixada e im-
posta. Este contraste é aprofundado corn o desenvolvimento do capitalismo, corn
a separacao entre trabalho ffsico e espiritual. Posteriormente, o trabalho espi ritual
é diferenciado em diversos campos separados, corn interesses particulares, aca-
band° par criar os especialistas enquanto subespecie.
A divisao capitalista do trabalho, entretanto, nao se restringe a submeter to-
dos os campos de atividade material e espiritual, mas tambern se insinua em Ca-
da urn provocando "profundas deformacoes, que se ,revelam (...) sob variadas
formas nas diversas manifestacoes ideol6gicas" (LUKACS, 1968, p. 63).
A fragmentagao do conhecimento e o isolamento das especialidades sac,
caracterfsticas da ciencia social burguesa. Em nome de uma "objetividade cientf-
fica", expressao da decadencia ideologica, os campos do conhecimento transfor-
mados em "ciencias autonomas", acabam por substituir a investigacao das "reais
conexOes causais na vida social (par) analises forrnalistas e vazios raciocinios
anal69icos" (id. ibid., p. 65)
A ciencia burguesa, contrapoe-se o marxismo enquanto ciencia da totalida-
de; como ciencia do movimento do pensamento e do mundo exterior, tornados
historicamente, que, enquanto visa° social do mundo, tern a transformacao da
realidade como questa° central.
Situar historicamente a Psicologia tornada "aut6noma", significa precisar as
condicoes materials que propiciaram o seu advento, dentro do movimento rnais
geral que subordina a ciencia ao Capital. Significa, ao mesmo tempo, caracteri-
zá-la enquanto uma concepcao do real conectada a esta formacao social — ou di-
to de outra forma, enquanto ideologia.
Para delinear esta trajetoria da Psicologia, utilizamos analises de alguns dos
estudiosos do assunto, como Braverman (1981); Gorz (1980); Foucault (1968,
1977); Figueiredo (1980) e Patto (1984); entre outros, alem de classicos, como
Marx, Engels e Lukacs.
A seguir, na pnmeira parte do Capftulo II, esbocamos uma breve caracteri-
zacao da profissao de psic6logo, a partir das avaliagoes dos proprios psicologos e
daqueles que estudaram o assunto — o suficiente apenas para o entendimento
das crfticas que a ela se fazem. Fundamentalmente, utilizamos os textos de Mel-
lo(1980) e do Sindicato/Conselho de Psicologia de Sao Paulo(1984). Complernen-
tamos a caracterizacao corn urn estudo de Carvalho(1984), sobre as modalidades
altemativas de atuacao dos psicalogos.
Na segunda parte do capftulo, delineamos as crfticas a Psicologia, que se
assentam basicamente no material apresentado no item anterior, e que consti-
tuem o ponto de partida da proposicao das "alternativas". Selecionamos, entre os
textos disponfveis, o de Holland (1973), de Mello (1980), de Botorne (1979), de
Botome e colaboradores (1981), de Duran (1975) e Duran e Pinto (1976).
Delineadas as criticas, passamos a apresentagao e analise das experiencias
que se propoem alternativas para a Psicologia superar o quadro em que se en-
14
contra. Para efeito de analise, subdividimos as chamadas praticas "alternativas"
em duas categorias: a que denominamos "Psicologia alternativa" propriamente di-
ta, incluindo al os trabalhos institucionais e os em "comunidade", e a que deno-
minamos "Contra-Psicologia" ou "Psicologia crftica", ou seja, aquelas tentativas
de "redefinicao" da Psicologia. No primeiro grupo analisamos os trabalhos de Bo-
tome (1981a e 1981b) e os de Andery (1984a e 1984b). No segundo, as proposi-
goes de Campos (1983) e Patto (1984).
No Capftulo IV, discutimos as "alternativas" e suas implicacoes, analisando
os pressupostos sobre os quais se fundamentam.
Nesse capftulo, e na conclusao, procuramos demonstrar, a partir do referen-
cial esbogado no infcio do trabalho, o que consideramos equivocos dessa concep-
gao de pratica "alternative". Subjacente as crfticas, e alicergando tal pratica, esta
a crence de que a Psicologia, assim como as demais profissOes, competencies e
capacidades de trabalho sao entidades "contarninadas", mas recuperaveis na
transigao ao socialismo, sem necessidade de rupturas ideologicas. Dessa visao,
resulta a tentative de atribuir a Psicologia — e ao psicologo — urn papel de trans-
formagao social que, historicamente, ela nao tern condigoes de assumir.
Algumas consideracaes sobre a selecao do material analisado:
a. 0 levantamento aqui empreendido nao é, nem pretende ser exaustivo. 0
material foi selecionado em funcao da seriedade no trato dos assuntos, o que,
contudo, nao implica em assumir que sejam os unicos, ou mesmo os melhores no
julgamento de outros.
b. Face-se a ressalva de que a presente analise nab se baseia necessaria-
mente nas publicagoes mais recentes dos autores, o que faz corn que corramos o
risco de injustice frente a propria evolucao do pensamento desses autores. Outro
risco que corremos é o de lidarmos corn alguns textos que possam ser particu-
larrnente datados, o que pode implicar em determinadas caracteristicas dos
mesmos. Entretanto, o sentido de trabalhos publicados é, entre outros, o de esti-
mular o debate, e é esse o papel que assumimos.
Alern disso, os anos de convivio corn estudantes e profissionais proporcio-
nados pelo magisterio de Psicologia, em diferentes escolas e locals, me permitem
afirrnar que os textos escolhidos sao freqUentemente lidos, sendo presence cons-
tante e fonte de influencia nas discussoes onde mais seriamente se buscam res-
postas para a profissao.
c. Urn des cnterios basicos para a selecao dos autores foi o respeito que
eu, particularmente, tenho por aqueles que se empenham nessas buscas, mal-
grado as divergencies de opinides. As praticas derivadas de outras concepgaes
em yoga na Psicologia hoje, e que tanta influencia exercem sobre estudantes e
profissionais, nem ao menos foram consideradas aqui, tao infinitarnente longe
que estao de qualquer pratica consequente.
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CANTULO I
PSICOLOGIA E/NA HISTORIA
Os "historiadores" da Psicologia costumam considerar como o marco inau-
gural da "moderna ciencia psicologica", o estabelecimento do laboratorio experi-
mental de Leipzig, por Wilhelm Wundt, no ano de 1879. Antes do final do seculo
XIX, portant°, a Psicologia era considerada urn ramo da Filosofia(1).
As explicacoes sobre a "libertagao" da P.sicologia geralmente se relacionarn
ao chamado "curso natural do conhecimento": na Antiguidade, todo o conheci-
mento era abarcado pela Filosofia; nos seculos XVI e XVII, a Astronomia, a Ffsica
e a Qufmica romperam o cordao umbilical para se tornarem disciplinas autono-
mas, o mesmo acontecendo corn a Biologia no seculo XIX. No final do semi°
passado, "soou a hora da Psicologia"(2).
A evolugao do conhecimento, dentro dessa perspectiva, é explicada dentro
dos marcos proprios da area de estudo ou dos marcos do conhecimento cientffico
tornado em conjunto — como propoe Kuhn (1975), como se tivesse propulsao pro-
pria.
Contudo, embora reconhecendo os "problemas relativos ao ethos da ciencia,
da logica interna de cada ciencia e das suas controversias tearicas", nao é possi-
vel compreendo-la sem coloca-la dentro de uma perspectiva historica mais am-
pla — e de considerar sua outra e fundamental natureza: a de "uma tecnica de
poder e/ou uma forca produtiva" (IANNI , 1975, p. 1106).
A Psicologia, concebida como uma "ciOncia autOnoma", compreende uma
forma de saber e uma tecnica — ou dito de outra forma, ideologia e pratica.
Caracterizar pois, a genese da Psicologia — e a instituicao do profissional
psicOlogo, implica em determinar, conforme assinala Campos (1983, p. 75), o
"movimento engendrado pelas demandas que emergem da formacao social onde
sua pratica passa a ser requerida — mediadas pelo quadro ideolOgico de represen-
tacao do real forrnulado a partir daquela organizacao histOrico-social — conjuga-
das corn o esforco em atencle-las representada pelo progresso da tecnica".
E nas sociedades capitalistas europeias do final do seculo passado que de-
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